Grupo internacional de historiadores contra mercado da Time Out no Porto

“Condenamos veementemente este projecto, até que reúna as condições solicitadas por diversas entidades nacionais e internacionais”, escreveu grupo internacional de historiadores sobre projecto para a ala sul da Estação de São Bento

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Projecto de Souto de Moura para a ala sul da Estação de São Bento DR

Um grupo internacional de especialistas em história condena “veemente” a aprovação do projecto do Mercado Time Out para a Estação de São Bento, no Porto, considerando que, neste caso, o valor económico não deveria sobrepor-se ao valor histórico. Numa carta enviada na passada semana a várias entidades públicas - entre elas a Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) que aprovou o projecto apesar das reservas da UNESCO, que subscreveu as preocupações do ICOMOS, o seu órgão consultivo para o património - o grupo internacional de historiadores IHSHG (International History Students and Historians Group) lamenta a falta de transparência em torno do projecto para a ala sul da estação e exige explicações.

“Como grupo internacional de profissionais, condenamos veementemente este projecto, até que reúna as condições solicitadas por diversas entidades nacionais e internacionais. Os locais históricos fornecem à população um testemunho importante sobre o seu passado e garantem o contínuo desenvolvimento da memória histórica”, lê-se na missiva a que a Agência Lusa teve acesso.

Para o projecto avançar, falta ainda a luz verde da Câmara do Porto, que recebeu o parecer positivo da DGPC no passado dia 5 de Setembro. Na altura, o gabinete de comunicação da câmara disse ao PÚBLICO que o documento seria analisado pelos serviços jurídicos, mas adiantava que a câmara só iria contra o parecer “vinculativo” da DGPC se houvesse “discordância" com o PDM. “Com base nesse parecer final da DGPC e, não havendo nenhuma discordância do projecto com o PDM, poderá a câmara proceder ao licenciamento.”

Recorde-se, no entanto, que um parecer da DGPC não obriga ninguém a avançar com uma obra. Como explicou ao PÚBLICO fonte próxima desta entidade, a DGPC limita-se a emitir um parecer quando é solicitado. Se o mesmo for negativo, a empreitada não pode avançar. Mas sendo positivo, a câmara mantém a sua autonomia e pode, se assim entender, não dar seguimento ao projecto. 

Neste caso, aponta-se no documento do grupo internacional de historiadores, “o valor económico nunca deveria sobrepor-se ao valor histórico e cultural”, pelo que, solicitam “uma explicação do parecer positivo dado ao projecto por parte da Direcção-Geral do Património Cultural e a possível ponderação na utilização apropriada da estação e novas valências”.

Na carta, o grupo que reúne aproximadamente mil membros, entres estudantes, graduados, mestres, doutores, arqueólogos e professores de História de todo o mundo, lembra que “o parecer enviado à Direcção da Cultura pelo ICOMOS subscreve a preocupação com os actuais contornos do projecto”, nomeadamente “a falta de reabilitação da estação como um todo, a torre de 21 metros que é desproporcional em relação ao espaço disponível”, a “demolição excessiva” ou ainda “a não-manutenção primordial da estação”.

O IHSHG salienta também a posição da directora da UNESCO, Mechtild Rossler, “quanto à ausência de princípios de conservação no projecto, bem como todas as recomendações internacionais em matéria de intervenção sobre património construído”.

Em declarações à Lusa, o presidente daquela comunidade, João Veiga, explica que as cartas seguiram ainda para a Direcção-Geral da Cultura do Norte (DRCN), para o Conselho Nacional de Cultura e para a sua Secção do Património Arquitectónico e Arqueológico (SPAA), para o Bloco de Esquerda (BE) e ainda para o Ministério do Negócios Estrangeiros na procura de mais transparência, nomeadamente da parte do Governo a quem solicitaram o parecer da UNESCO sobre este projecto.

Aquele responsável sublinhou que o IHSHG não tem “absolutamente” nada contra a Time Out, que “fez um excelente trabalho” na transformação do Mercado da Ribeira, em Lisboa, “mas sim, para com as entidades nacionais que não ponderam uma solução que vise proteger a integridade do edifício”.

À Lusa, João Viegas disse não ver “nenhuma outra razão plausível” que leve aquelas entidades a aprovarem este projecto após uma “entidade internacional ter enviado um parecer negativo para a empreitada em causa”. E concluiu: “Demonstram uma preocupação menor pelo nosso património do que a própria comunidade internacional.”

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