Escadas dos Judeus demolidas? “Apenas foram desmontadas mas vão ser repostas”

Câmara do Porto e arquitectos da obra garantem que património está salvaguardado. Retirada das históricas escadas em Miragaia será temporária e estava prevista no projecto de execução.

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A obra de ligações mecanizadas de Miragaia tem uma duração prevista de seis meses Paulo Pimenta

O cenário impressiona e tem causado burburinho. Algumas das íngremes escadas do Monte dos Judeus, que ligam a zona de Miragaia à cota mais alta da cidade, desapareceram. No lugar, há um estaleiro de obra montado, estruturas de madeira improvisadas para garantir a ligação de quem passa, uma placa da autarquia sobre o projecto de ligações mecanizadas em Miragaia. As históricas escadas, no entanto, não terão sido demolidas. Apenas retiradas por imposição técnica da obra, estando prevista a sua reposição posteriormente.

A garantia foi dada ao PÚBLICO por João Crisóstomo, um dos arquitectos responsáveis pelo projecto, e sublinhada pelo gabinete de comunicação da Câmara do Porto, que gere esta empreitada, iniciada no fim de Maio, através da empresa municipal Go Porto: “As escadas foram retiradas por causa da obra, mas serão novamente colocadas.”

Obra começou no fim de Maio e tem um prazo de execução de seis meses Paulo Pimenta
Paulo Pimenta
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Obra começou no fim de Maio e tem um prazo de execução de seis meses Paulo Pimenta

Os esboços do que ali se fará foram divulgados há mais de dois anos, em Julho de 2017, quando a autarquia anunciou o vencedor do concurso público lançado meses antes: um trabalho conjunto dos gabinetes portuenses depA e Pablo Pita (Pablo Rebelo e Pedro Pita).

O executivo de Rui Moreira tinha pedido uma solução de ligações mecanizadas que mitigasse as dificuldades de locomoção da envelhecida população de Miragaia e possibilitasse aos turistas uma viagem atractiva e mais segura. E os arquitectos apresentaram uma proposta com dois elevadores e diversas escadas rolantes. Na altura, o arquitecto Luís Sobral explicou ao PÚBLICO a estratégia de intervenção naquele “enquadramento paisagístico muito forte” onde procuravam intervir sem descaracterizar: as escadas rolantes subiriam a encosta de Miragaia lado a lado com as escadas de pedra existentes, “encaixando-se” nessa elevação através de uma composição partida em vários troços.

A “integridade urbanística” do desenho, que adoptou “sistemas construtivos simples e adequados à topografia, sem alterar substancialmente a imagem da cidade” foi, aliás, motivo de valorização do júri, lia-se no relatório final.

Desse momento até agora, garante João Crisóstomo, nada de substancial mudou. “O projecto, em termos de imagem, é muito parecido com aquilo que se mostrou no concurso”, disse. Assim está afixado no local da obra, numa placa onde a Câmara do Porto anuncia uma espécie de cartilha de objectivos: garantir mais mobilidade entre as cotas alta e baixa da cidade, modernizar e requalificar o espaço público e as zonas comuns e preservar a identidade, enquanto zona de interesse histórico.

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Projecto apresentado pelos gabinetes portuenses depA e Pablo Pita (Pablo Rebelo e Pedro Pita). DR

O contexto “muito complicado” daquele território íngreme implicou que “as escadas fossem desmontadas”, explicou João Crisóstomo. “Mas vão ser repostas”, garantiu, não se comprometendo com prazos e acrescentando que o processo estava previsto no projecto de execução. O PÚBLICO pediu acesso a esse documento, mas até agora não obteve resposta. De acordo com o relatório da solução vencedora, “as escadas existentes são conservadas sendo introduzidos canteiros em zonas de transição de cotas que pontuam a longa subida”. Apesar dos meios mecânicos, diz o relatório, o percurso poderá ser “integralmente percorrido através da antiga escadaria mantendo-se a sua vertente de fruição lúdica”.

As “peças” retiradas foram “numeradas e guardadas”, informou o arquitecto. Algumas delas, por estarem em mau estado, terão de ser “requalificadas”, estando mesmo previstos “pequenos lanços novos” nas que forem impossíveis de reabilitar. Tal, no entanto, “não implica perda de património”. 

A acompanhar a obra, afirma João Crisóstomo, está mesmo uma “equipa de arqueologia” contratada pela empresa municipal Go Porto. É uma “imposição legal da Direcção Geral de Património”, diz. Ou não estivéssemos em território classificado pela UNESCO. A ligação entre as cotas baixa e alta da cidade naquela zona é anterior ao século XV e as escadas, já centenárias, eram a garantia de ligação à sinagoga judaica.

A obra de ligações mecanizadas de Miragaia tem uma duração prevista de seis meses e incluiu intervenções também nas escadas das Sereias e na zona à volta das Ruas de Cidral de Cima e de Cidral de Baixo, sendo o custo estimado da obra de 677 mil euros. 

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