Morreu Robert Frank, um dos mais influentes fotógrafos de sempre

Robert Frank, autor de um dos livros de fotografia mais influentes e citados de sempre, The Americans, morreu na segunda-feira em Inverness, Nova Escócia, Canadá, onde vivia há décadas com a sua mulher, June Leaf. Tinha 94 anos.

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Robert Frank fotografado por John Cohen, em 1958 John Cohen
,Estados Unidos
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"The Americans" (1958), um dos fotolivros mais influentes e citados de sempre D.R.
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Robert Frank com a mulher, June Leaf , em Berna, 2012 LUSA/LUKAS LEHMANN
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Em Berna, 2012 LUSA/LUKAS LEHMANN

O suíço-americano Robert Frank, que ajudou a cunhar uma nova abordagem na fotografia documental em meados do século XX e autor de um dos fotolivros mais influentes e citados de sempre, The Americans (1958), morreu esta segunda-feira em Inverness, Nova Escócia, Canadá, onde vivia há décadas com a sua mulher, June Leaf. Tinha 94 anos.

O anúncio da morte de Frank foi feito por Peter MacGill, da Pace-MacGill Gallery, de Manhattan, que representava o artista.

​Quando Robert Frank vem a terreiro, a arte que se lhe cola logo é a fotografia e o livro tornado obra endeusada pelo virtuosismo de articular narrativas visuais pela imagem fotográfica — The Americans, ou a poderosa sequência táctil de uma das road trips pela América profunda que mais influência criativa e ondas de choque provocaram no pós-guerra. Certo é Frank abraçou outras artes, como o cinema, o vídeo ou design gráfico, esta logo no início da sua carreira. 

E o que é que vemos afinal de Robert Frank para lá desse eterno “poema triste” (Jack Kerouac) que se move como uma sombra fatalmente agrilhoada ao seu autor? Frank, hesitava na resposta, mas acabou por admitir a sua felicidade por fazer perdurar esta ligação umbilical com o livro de fotografia que — ninguém tem dúvidas — o eternizará.

The Americans ©Robert Frank from The Americans, courtesy of Delpire Éditeur
The Americans ©Robert Frank from The Americans, courtesy of Delpire Éditeur
The Americans ©Robert Frank from The Americans, courtesy of Delpire Éditeur
The Americans ©Robert Frank from The Americans, courtesy of Delpire Éditeur
The Americans ©Robert Frank from The Americans, courtesy of Delpire Éditeur
The Americans ©Robert Frank from The Americans, courtesy of Delpire Éditeur
Capa do fotolivro The Americans, cortesia de Delpire Éditeur ©Robert Frank from The Americans, courtesy of Delpire Éditeur
New York City, 7 Bleecker Street, September, 1993 ©Robert Frank from The Americans, courtesy Pace/MacGill
View from hotel window - Butte, Montana, 1956 ©Robert Frank from The Americans, courtesy Pace/MacGill
San Francisco, 1956 ©Robert Frank from The Americans, courtesy Pace/MacGill
Wales, Ben James, 1953 ©Robert Frank from The Americans, courtesy Pace/MacGill
Blind, Love, Faith, 1981 ©Robert Frank from The Americans, courtesy Pace/MacGill
Charleston, South Carolina, 1955 ©Robert Frank from The Americans, courtesy Pace/MacGill
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The Americans ©Robert Frank from The Americans, courtesy of Delpire Éditeur

Nascido em Zurique, na Suíça, em 1924, Frank chegou aos Estados Unidos em 1947, onde conheceu o editor gráfico Alexey Brodovitch, que o contratou para fazer fotografia de moda na revista Harper's Bazaar. A sua maneira de fotografar com Leica e filme de 35mm era pouco comum para a época nesta área. Ainda que as suas imagens tenham tido alguma aceitação, Frank achou que a fotografia de moda tinha demasiadas limitações e abandonou aquela revista poucos meses depois. 

Em 1955, na procura por uma fotografia capaz de exprimir “verdades subjectivas”, experimentada primeiro no livro Peru (1949) e depois na maquete de Black White and Things (1952), Frank embarca numa viagem de dois anos pela América, financiado por várias bolsas Guggenheim. Dos mais de 28 mil negativos que resultaram dessa imensa road trip, seleccionou 83 fotografias que mostravam pela primeira vez o lado sombrio e decadente do “sonho americano”, bem como as várias faces de um país pobre, racista, nacionalista e profundamente dividido. Em The Americans, cujo 60.º aniversário foi celebrado no ano passado nos Encontros de Fotografia de Arles na exposição Sidelines, Frank inclui a sua visão sensível (e sensorial) do mundo, que tanto nos mostra o brilho de uma jukebox, como a solidão transmitida por uma cadeira vazia numa barbearia fechada.

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O Reino Unido, por Robert Frank Robert Frank

A mestria da mise en page de Robert Frank neste livro seminal — como noutros da sua autoria — está numa construção ritmada, interligada, por vezes dissonante, outras harmoniosa, e que inclui cortes, reenquadramentos e escalas de imagem variadas. As imagens sobreexpostas, desfocadas, pouco reveladoras passam a fazer parte das suas escolhas habituais.

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Robert Frank

Alvo de muitas críticas (Bruce Downes: “Frank é um mentiroso, perversamente celebrando a miséria que perpetuamente procura e obstinado cria”) e de elogios (menos), The Americans é visto como uma das materializações visuais da geração beat, libertária, anarquista, nómada, hedonista, inconformista e defensora da criatividade espontânea.

Em 1959, Robert Frank volta-se para o cinema, assinando títulos onde há uma aparência de improviso e uma ausência de narratividade que, afinal, não deixam de estar cuidadosamente planeadas. A sua filmografia inclui mais de 25 obras e começou com Pull My Daisy (1959), escrito e narrado pelo compagnon de route Jack Kerouac e protagonizado por Alan Ginsberg e por outros artistas da beat generation, tido como uma das sementes do Novo Cinema Americano​.

Alvo de uma reedição em DVD pela alemã Steidl, em 2008, a obra cinematográfica e videográfica de Frank era até então pouco conhecida, à excepção do polémico documentário Cocksucker Blues (1972), rodado durante uma digressão dos Rolling Stones, provavelmente o seu filme mais conhecido.

Outro dos seus títulos mais importantes no cinema é Conversations in Vermont (1969), documentário entrecortado com muitas fotografias de família, onde o próprio Frank se põe em cena (um dos primeiros cineastas a fazê-lo) para explorar as dificuldades de relacionamento com os filhos Pablo e Andrea. 

Quando regressou às imagens fotográficas e aos livros (embora continuando em paralelo com o cinema e vídeo), o registo autobiográfico e intimista continuaram a povoar a sua obra, que passou a incluir também uma maior intervenção sobre as imagens (escritos, colagens, fotomontagens...) e inclusão de uma estética snapshot.

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