Há territórios onde nunca será possível recuperar população

O princípio da Coesão Territorial na formulação das políticas públicas tem de ser sinónimo de realçar as características de cada território, numa lógica de valorização.

É necessário e urgente abordar o tema da Coesão Territorial com verdade e sem demagogias. O discurso até agora do politicamente correto deverá ser corrigido para o discurso da verdade. É urgente abandonar a visão redistributiva da política de coesão, assumindo-se que não basta colocar recursos nas regiões menos desenvolvidas, mas antes assumir que a diminuição das assimetrias regionais envolve investimento seletivo, qualificador e capaz de valorizar os recursos endógenos dos territórios. Estando o crescimento dos territórios baseado nos seus recursos endógenos e na sua capacidade de atração de novas atividades e pessoas, há que assumir que não é possível ter a tónica no crescimento em todos os territórios, e assumir também que em porções importantes do nosso país coesão territorial significa gerir o declínio, e, portanto, significa assumir que há partes do nosso território onde não vai ser possível recuperar população e atividade económica. Contudo, isto não significa o abandono destes territórios, nem deixar de garantir às populações o acesso aos bens e serviços nas mesmas condições da população dos territórios mais desenvolvidos. Significa, hoje em dia, por exemplo, que em vez de a pessoa ir ao centro de saúde, à loja do cidadão, ao mercado, são os prestadores destes serviços que vão a casa das pessoas. Com as tecnologias de que dispomos, é seguramente possível fazer melhor e com menos recursos, tendo as pessoas no centro das políticas e das decisões.

O princípio da Coesão Territorial na formulação das políticas públicas tem de ser sinónimo de realçar as características de cada território, não ao nível dos problemas, mas numa lógica de valorização, focando-se nas oportunidades destes. Isto implica abandonar a forma tradicional de fazer política, em que temos políticas transversais, que se aplicam a todo o território, sem se ter em conta as especificidades dos territórios, sobretudo dos mais frágeis. É obrigatório uma ação pública diferenciada com os territórios, tratar de forma diferente realidades que são estruturalmente distintas, pelo que a solução “one-size-fits-all” é insuficiente para lidar com a heterogeneidade territorial existente. 

Nos territórios de baixa densidade não podem, por exemplo, ser aplicados os tradicionais critérios que norteiam o investimento público. A valorização da sua atratividade e dos seus recursos exige igualmente tratamento verdadeiramente diferenciador, quer no que respeita às famílias, quer às empresas. E isto não é um custo para o país, é um investimento que deve ser assumido, na maior parte das vezes sem retorno imediato, mas que implica preservar e valorizar os ativos (contribuem para a qualidade do ar e da água do país, entre outros) e as potencialidades destes territórios, cujo abandono tem tido um custo incomensurável.

A coesão territorial exige uma melhor Governação, incorporando a dimensão territorial nas políticas públicas, o que obriga a uma articulação mais eficiente entre os diferentes níveis de administração (da escala europeia à escala local, a que está associado o princípio da subsidiariedade) e entre as diferentes políticas setoriais, que devem ter uma visão/atuação partilhada sobre o mesmo território. Só com uma maior coerência e sinergia entre políticas setoriais com enfoque no mesmo território é que se podem maximizar os impactos territoriais das políticas públicas. Neste domínio muito há a fazer no nosso país, pois sabemos que a divisão do território difere de área para área. Por exemplo, a região centro é um determinado território para o turismo e outro no que toca à saúde e cultura. Quando não temos intervenções setoriais que se sobrepõem e consomem recursos sem acrescentar valor num dado território.

Estas abordagens de base territorial implicam o desenvolvimento de formas de discussão e participação ativa dos cidadãos no processo de tomada de decisão. Isto exige mudança na forma de tomada de decisão política, envolvendo partilha da decisão e de responsabilidade; transparência e prestação de contas. Exige no fundo uma nova forma de fazer política e de tomar decisões, o que demora tempo, tempo esse que tem que começar já!

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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