PAN diz que este não é o momento para estar no Governo e critica Costa sobre Amazónia

Apesar de recusar participar num executivo, o porta-voz do PAN não deixa de lado uma solução governativa como a dos últimos quatro anos. O PAN promete uma “campanha de baixo carbono”, com os candidatos a deslocar-se de transportes públicos e num carro híbrido.

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O deputado único do PAN (Pessoas-Animais-Natureza) pede uma "posição firme relativamente a Bolsonaro" LUSA/MIGUEL A. LOPES

O porta-voz do PAN está convicto de que “vai contribuir para o PS não ter maioria absoluta” nas eleições legislativas e recusa integrar o Governo, considerando que o partido “é ainda uma criança” e este “não é o momento”. Em entrevista à Lusa, André Silva expressa ainda “sérias dúvidas” sobre o empenho do PS na descarbonização da economia e critica a posição do primeiro-ministro sobre a Amazónia, considerando “desolador” que tenha agido ao arrepio dos principais líderes europeus.

“O PAN, enquanto partido político, é ainda uma criança que está em crescimento e, por isso, cometemos alguns erros de vez em quando, e assumimos, e estamos a fazer correcções”, disse o líder do Pessoas-Animais-Natureza, salientando que “este não é o momento” de o PAN estar no Governo. “O futuro dirá, mas este não é o momento”, reforçou, advogando que “o PAN, para influenciar as políticas governativas, não precisa de estar no Governo, não precisa de ter qualquer pasta”.

Mostrando-se convicto de que o partido vai conseguir aumentar a representação actual na Assembleia da República (André Silva é deputado único), e formar um grupo parlamentar, o porta-voz acredita que o PAN vai contribuir para o partido socialista não ter maioria absoluta. “Independentemente de o Partido Socialista e outros partidos terem agora na sua narrativa objectivos muito nobres relativamente a algumas matérias, as pessoas sabem, os portugueses sabem, que elas só avançam com um PAN forte, mais reforçado. Isso eu estou convencido que vai acontecer e que o Partido Socialista não terá maioria absoluta”, assinalou.

O também cabeça de lista pelo círculo de Lisboa alertou que uma maioria absoluta acarta “um afunilamento democrático”, uma vez que “os partidos deixam de ouvir e há uma arrogância governativa” e, por isso, considerou ser “fundamental que o Partido Socialista não tenha maioria absoluta”.

Apesar de não “correr o risco superficial” de transpor o resultado das eleições europeias - nas quais elegeu o primeiro eurodeputado - para as legislativas, o deputado disse que o resultado de Maio dá “o alento de perceber” que o partido pode “não chegar aos dois, mas chegar eventualmente aos três ou aos quatro deputados, ter um grupo parlamentar mais alargado”.

E, apesar de recusar participar num executivo, o porta-voz do PAN não deixa de lado uma negociação com vista a encontrar uma solução governativa como a dos últimos quatro anos. “Se os portugueses entenderem que o Partido Socialista não deve governar sozinho, ou que outro partido não deve governar sozinho, e que poderá depender do apoio, ou não, do PAN, estaremos sempre disponíveis, para já, apenas para nos sentarmos e para falarmos”, adiantou à Lusa.

Ainda assim, e apesar das “cedências e convergências” que possam acontecer, André Silva antevê “difíceis negociações que possam vir a ocorrer” devido à “narrativa de António Costa”.

“Aquilo que posso dizer é que, relativamente ao Partido Socialista, não vejo neste momento, face aquilo que são as suas grandes opções para a economia, grandes cedências ao programa do PAN, naquilo que são as respostas que temos de dar à crise climática e à emergência ambiental”, explicou, ressalvando que “tudo pode mudar em sede de negociação”.

Questionado sobre as condições que o PAN levará para essa eventual negociação, o deputado único afirmou que “há uma série de sectores económicos que têm que, de facto, ser repensados de uma forma adulta e responsável, de uma vez por todas”.

“Eu acho que é fundamental era percebermos em sede de negociação se, sectorialmente, em cada um dos pilares da economia que tem que ser, de facto, bastante intervencionado, com vista, a descarbonização, à neutralidade carbónica, se há ou não há disponibilidade de convergência, de cedência por parte do Partido Socialista em antecipar metas”, indicou.

Ainda assim, o PAN tem “uma visão do mundo e da sociedade” que, “neste momento, não se compagina com nenhum dos outros partidos”.

Da última legislatura, o partido faz um “balanço extremamente positivo” da sua actuação na Assembleia da República e assinala que houve “uma série de questões em termos de matérias ambientais que, até o momento, não tinham sido debatidas”.

“Quando entrei, em 2015, nem eu nem as pessoas sabiam o que é que nos esperava” do ponto de vista “da burocracia, da forma como se trabalhava na Assembleia da República”, recordou.

Posição firme relativamente a Bolsonaro

Um dos temas que divide o PAN do PS e de António Costa, salienta André Silva é, por exemplo, a reacção aos incêndios na Amazónia. O deputado pede uma “posição firme relativamente a Bolsonaro”, considerando o Presidente do Brasil “uma pessoa absolutamente inconsciente e impreparada para estar no lugar onde está” e considerou “extremamente positivos” os sinais dados pela “maior parte dos líderes europeus” a propósito da crise ambiental na Amazónia.

André Silva aponta, em contraste, o “sinal extremamente negativo” do primeiro-ministro e secretário-geral do PS sobre esta matéria: “Um sinal eu diria até, um pouco desolador, por parte de António Costa, que vem, uma vez mais privilegiar a extracção de recursos, o crescimento económico em detrimento daquilo que é um ecossistema absolutamente importantíssimo e fundamental”.

Para o porta-voz do PAN, no momento em que “os principais líderes eleitos democraticamente na Europa” assumem “uma posição mais assertiva relativamente ao Brasil”, o primeiro ministro português assume “o discurso de sempre de que, atenção, é preciso privilegiar e ter atenção à economia, e às relações económicas e não ter uma política de isolamento relativamente ao Brasil”.

“Isto é a continuação da mesma conversa, da mesma narrativa, de colocar os interesses económicos acima dos interesses ambientais de uma região que não é do Brasil, é uma região que é do planeta”, sublinha.

António Costa defendeu na semana passada que o Brasil precisa de solidariedade e não de sanções, argumentando que não deve ser confundido o drama que se vive na Amazónia com o acordo com o Mercosul, que considerou “muito importante para a economia portuguesa e não deve ser utilizado pelos países que sempre se opuseram à sua assinatura”, como a França.

As dúvidas do PAN face ao empenho dos socialistas na defesa do ambiente são mais vastas: “Querem aumentar o tráfego aéreo no nosso país, com a construção de um novo aeroporto para reforçar a Portela, num sítio de reserva natural, onde passam cerca de três milhões de aves por ano. Não há uma única palavra sobre agricultura biológica no programa do Partido Socialista, com a continuidade das políticas agrícolas de expansionistas relativamente à agricultura intensiva. Estamos a transformar e a destruir o nosso o Alentejo, num olival intensivo. Não há regras para estufas na Costa Vicentina. O Partido Socialista quer explorar hidrocarbonetos ao largo da nossa costa, quer fazer mineração profunda nos oceanos. Falando de turismo, quer aumentar o número de navios de cruzeiro nos portos de Lisboa, e nos principais portos, quando os navios de cruzeiros que passam ao largo da costa portuguesa emitem oitenta e seis vezes mais emissões de gases de efeito estufa do que todos os transportes do nosso país”.

“Por isso eu digo que tenho sérias dúvidas relativamente a estas intenções que não passam de intenções. Por um lado, dizem querer descarbonizar a economia, mas, por outro lado, as acções e as opções para a economia são sempre no suposto desenvolvimento económico com base naquele mito, naquela ilusão matemática, em que nos fazem viver do crescimento ilimitado”, sustenta.

Alargando a crítica a todo o espectro político, André Silva considera que desde a entrada do PAN no parlamento há mais atenção dos partidos aos temas ambientais, falando mesmo de uma “revolução de consciências” iniciada por aquele partido, mas volta a desconfiar das consequências práticas das intenções expressas. “Há uma narrativa que está completamente dissonante das práticas e da economia real”, aponta.

“Quando vemos constantemente as imagens de televisão dos partidos em campanha, aquilo que se vê em cima da mesa são copos plásticos, garrafas de plástico e carne dentro do prato”, ilustra.

Em contrapartida, o PAN promete uma “campanha de baixo carbono”, apesar do esforço visitar todos os distritos, com os candidatos a deslocar-se de transportes públicos e num carro híbrido. “Não é possível em Portugal, ainda, conseguirmos fazer a deslocação através de um automóvel eléctrico causa dos postos de carregamento em determinados locais. Fizemos esse estudo, não é possível”, sustenta.

O porta-voz disse também que não será aumentada a rede de cartazes nas ruas, e não serão produzidos “quaisquer tipo de brindes”.

Os candidatos vão distribuir folhetos, mas feitos de papel reciclado e tintas ecológicas, e as refeições não vão incluir “nenhum produto de origem animal” porque “a produção animal tem impactos enormes ao nível ambiental”.

A campanha vai incluir momentos de perguntas que a população queira colocar, e às quais o PAN dará resposta, e os candidatos vão realizar “algumas visitas” que o partido entenda importantes. “Faremos também acções de limpeza em todo o país para compensar a nossa pegada ecológica e a pegada ecológica também dos outros partidos”, adiantou André Silva

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