Não à “autarquia” Portugal: uma agenda para a liberdade e a prosperidade

A estabilidade que o PS oferece não é estabilidade para a liberdade e a prosperidade; é conservação; é estagnação. Não é só o mundo que está perigoso. Portugal também.

1. Quem ler com atenção a entrevista de António Costa neste fim-de-semana fica devidamente elucidado sobre a falta de desígnio, de aspiração e de ambição para o país. Não se vislumbra ali nenhuma ideia mobilizadora, nenhum programa agregador, nenhum projecto envolvente e dinamizador. Não se descortina uma ideia de país, uma ambição para os portugueses e para Portugal, uma agenda para a transformação da sociedade e do Estado. Não há ali rasgo nem inspiração. E muito menos vontade de os sugerir ou promover. Tudo o que Costa quer oferecer é inércia.

Um discurso requentado de continuidade, de irreprimível normalidade, apelando subtilmente a valores tacanhos de segurança, de ordem, de tranquilidade. Uma atitude paternalista e condescendente, aqui e ali apimentada por umas ameaças que exploram o receio e o medo. Procurando tirar proveito e proveitos do apelo à segurança e à continuidade, ameaça, adverte, admoesta, previne.

Por um lado, com os riscos de uma crise económica mais grave que a de 2008, que exigiria o controlo paternal e apaziguador que pretensamente só um governo do PS é capaz de fornecer. Por outro lado, com os riscos de um sobredimensionamento do Bloco de Esquerda, que nos tornaria uma nova Espanha e exporia o todo cauteloso governo do PS a inomináveis chantagens e extorsões. Todo o discurso se estriba num guião de preservação paralisante da hegemonia do PS e do seu líder, ora garante de uma rasteira e ordeira normalidade, ora garante de uma muralha de defesa contra terríveis desmandos e sobressaltos.

2. O grande mote é agora a estabilidade. A estabilidade, como valor em si, como fim em si mesmo, sem que nunca se perceba para o que pretensamente ela servirá. Em democracia, a estabilidade é, sem dúvida um valor político, mas um valor político instrumental. Não vale por si, mas pelo que permite realizar e alcançar. Para que se perceba quão instrumental se afigura, basta pensar que não há regimes mais propensos à estabilidade do que as ditaduras e, no entanto, ninguém – ou quase ninguém – as defenderá. Tudo se organiza agora em torno desse eixo da estabilidade, que, no caso de Costa e do “seu” PS, é mais propriamente uma forma de “inamovibilidade”.

O apelo pomposo e institucional à estabilidade mais não é do que a continuação da estratégia de ocupação do poder: do poder pelo poder, com a sua teia de relações de militância e até familiares. Quando não há um desígnio substantivo por detrás da estabilidade, esta deixa de ser um valor político e passa a ser um parâmetro administrativo. O PS e o seu Governo querem embalar-nos, anestesiar-nos, deixar-nos no mais ordeiro letargo político, ao som da sua música administrativa e administradora. O PS e o seu Governo, com a ocupação molecular e até tentacular, tratam o país, não como um Estado, mas como uma grande autarquia. E Costa, com a sua experiência autárquica – que, aliás, a cada passo (e também nesta entrevista) invoca –, sabe bem do que fala.

O impulso de tudo controlar, conhecendo os vizinhos pelo nome, deixando o menos espaço possível de respiração à sociedade civil, é um tique tipicamente administrativo. Não há nenhum apelo à mudança, à regeneração, à reforma, à reinvenção. Há apenas umas quantas benfeitorias para anunciar, salomonicamente dispersas por bairros e condomínios. A ideia parece ser a de fazer de Portugal uma vila tranquila, uma imensa e pacata autarquia: a autarquia Portugal. Uma circunscrição à procura do seu sábio administrador, de um paternal regedor.

3. Durante quatro anos, o Governo do PS e o Primeiro-Ministro não fizeram outra coisa senão administrar a conjuntura, sempre numa perspectiva maquiavélica de preservação e disseminação do poder. Com efeito, o Governo não passou de um grande e extenso administrador, sem nenhuma visão estratégica, sem nenhum desiderato prospectivo, sem qualquer veio reformista. Depois destes quatro anos, o país está mais desenvolvido e mais sofisticado? A sociedade civil está mais forte e mais dinâmica? Houve algum progresso ou melhoria na saúde, na educação, na justiça? Terá havido alguma medida ou algum programa do governo que tenha mudado a nossa paisagem empresarial? Os cidadãos e as empresas dependem mais ou dependem menos do Estado? A lição destes anos é mesmo essa: não tivemos política, tivemos gestão; não tivemos inovação, tivemos distribuição; não se semeou emancipação, cultivou-se conformação.

4. Os portugueses e Portugal precisam de tudo menos de conformação e conformismo, de resignação, de habituação. Precisamos de uma agenda de e para a liberdade; precisamos de um horizonte de prosperidade. A agenda da liberdade implica reformas fiscais e económicas, que incentivem a iniciativa privada, reforcem a concorrência e a capacidade exportadora, robusteçam as empresas. A agenda da liberdade impõe uma reforma da educação, que aposte na autonomia das escolas, na exigência do ensino, no papel das famílias; que termine com a intromissão sufocante do dirigismo ministerial. A agenda da liberdade requer uma justiça célere e acessível, longe do capricho filo-corporativo que hoje impera.

O horizonte de prosperidade exige, antes do mais, que se cumpra a agenda da liberdade. Mas impõe também a reabilitação dos serviços públicos e, em primeiro lugar, do mais destruído e desmantelado: o serviço nacional de saúde. Sem esquecer a rede de transportes, condição essencial de desenvolvimento e qualidade de vida, com especial ênfase na quase incipiente ferrovia. E tratando da segurança social, da sua equidade e da sustentabilidade. A prosperidade reclama de Portugal uma presença e política europeia activa e realista, sem esta propaganda personalizada e narcisista que abusa e ilude.

A estabilidade que o PS oferece não é estabilidade para a liberdade e a prosperidade; é conservação; é estagnação. Congela a política; aumenta o controlo. Não é só o mundo que está perigoso. Portugal também.

SIM. Emmanuel Macron. Venceu em toda a linha a sua aposta no G7. Reforçou o papel da França, foi capaz de cativar Trump. Apesar de mal no Mercosul, pôs a Amazónia e o Irão na agenda.

NÃO. Situação na Amazónia. Os incêndios que afectam a floresta amazónica são uma responsabilidade global. Mas sempre com respeito pela soberania dos países afectados.

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