Boris Johnson diz que ainda há tempo para uma saída com acordo

Ao lado de Angela Merkel, o primeiro-ministro britânico reconheceu que o governo de Theresa May não fez bem o seu trabalho, ao não apresentar alternativas ao backstop. Mas que ainda há tempo para encontrar outra solução. Em França preparam-se para uma saída do Reino Unido da UE sem acordo.

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Angela Merkel e Boris Johnson assistindo sentados à cerimónia protocolar Reuters/Axel Schmidt

Boris Johnson garante que o Reino Unido não aceitará o acordo do “Brexit” se a União Europeia insistir em manter o backstop na fronteira irlandesa. No entanto, diz que ainda há tempo para negociar, reconhecendo, ao mesmo tempo, que o anterior Governo britânico não fez bem o seu trabalho, não apresentando alternativas para a salvaguarda na fronteira irlandesa.

Na sua primeira visita oficial ao estrangeiro desde que assumiu a liderança dos conservadores e a chefia do Governo britânico, Boris Johnson mediu com cuidado as palavras e os gestos para manter a atmosfera do encontro com a chanceler Angela Merkel num tom optimista.

Começou logo por aceitar abrir mão do protocolo e ouvir o hino britânico sentado ao lado da chefe do Governo alemão que, por sugestão médica, para evitar as tremuras que a têm afectado recentemente, permaneceu na cadeira durante a cerimónia protocolar.

Continuou na conferência de imprensa, em que agradeceu à sua homóloga pela “fantástica recepção”, como nenhuma outra em toda a sua vida. E até esboçou uma piada que, mesmo sem arrancar gargalhadas, mostrou que não estava em Berlim para braços de ferro, ao enumerar a série de temas de política externa na agenda do encontro, incluindo esse “assunto secundário” do “Brexit”.

E prolongou-se durante a sequência de perguntas e respostas que se seguiram. Sim, o Governo britânico insiste que o backstop “claramente tem de ser retirado”, mas claro que até 31 de Outubro ainda há tempo para incluir uma alternativa a essa salvaguarda que visa deixar as duas partes da Irlanda exactamente como está, sem fronteira física entre elas.

“Há uma grande margem para chegar a um acordo”, disse o primeiro-ministro britânico, fazendo questão de sublinhar: “Quero ser absolutamente claro com os nossos amigos alemães e com o Governo alemão que nós, no Reino Unido, queremos um acordo”.

E já depois de Angela Merkel se ter mostrado disponível para discutir “soluções práticas” para o backstop num espaço de 30 dias, mas reiterando que está fora de causa reabrir o acordo para novas discussões, Johnson achou por bem enfatizar que não está nos planos do Governo britânico construir qualquer fronteira física entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda e que há alternativas possíveis que podem ser implementadas para o garantir.

Chegando mesmo a assumir esse mea culpa britânico, que na verdade se tratou de uma crítica à sua antecessora Theresa May, por Londres não se ter empenhado em propor alternativas à solução do backstop durante as negociações.

No entender de Merkel, a salvaguarda da ausência de fronteira está no acordo para resolver um problema, portanto, se outra solução for encontrada para o solucionar, ela estará receptiva. O que soou a música nos ouvidos de Boris Johnson que preferiu sempre o tom conciliador e nem se deixou embalar pela pergunta de um jornalista britânico sobre se as visitas a Angela Merkel e a Emmanuel Macron na quinta-feira não eram apenas o prelúdio para um ataque a Bruxelas pelo fracasso do acordo. “Se pudermos fazer isso”, retirar a salvaguarda do texto, “estou absolutamente convencido que podemos avançar”.

Campanha eleitoral

A pergunta do jornalista britânico reflecte a ideia defendida por muitos analistas e políticos, para quem a ameaça de saída sem acordo estabelecida pela carta que Boris Johnson enviou ao presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, na segunda-feira, é apenas um discurso para consumo interno, um discurso de campanha, uma forma de mostrar ao eleitorado britânico que Bruxelas terá a culpa dos infortúnios económicos que possam advir de uma saída não consensualizada.

Outros consideram que se trata de um bluff para fazer a Europa ceder à última da hora, aceitando retirar a salvaguarda e evitar ondas negativas para a economia deste lado do Canal da Mancha. Merkel, por exemplo, com uma economia a deteriorar-se, quer tudo menos um impacto negativo nas suas exportações que tragam mais problemas à Alemanha.

Em França, Emmanuel Macron, que esta quinta-feira recebe Johnson, acredita que já não há nada a fazer e que haverá mesmo uma saída sem acordo. “O cenário mais provável agora é o cenário sem acordo”, disse à Reuters uma fonte do Gabinete presidencial francês.

“Se o Reino Unido considera que o backstop é completamente para excluir, está no seu direito, mas nesse caso limita a possibilidade de chegar a um acordo”, referiu a mesma fonte.

A verdade é que Boris Johnson, apesar de não ter sido eleito primeiro-ministro – chegou ao poder através de voto interno dos conservadores depois da demissão de Theresa May –, tem todas as sondagens do seu lado, mostrando que o seu discurso em relação ao “Brexit” encontra eco no eleitorado britânico.

Nas eleições europeias de Maio, os conservadores britânicos ainda liderados por May, foram derrotados em toda a linha, alcançando o pior resultado da sua história, com apenas 9%. Todas as sondagens de Agosto dão agora aos tories a liderança nas intenções de voto, com três a nove pontos percentuais de diferença para os Trabalhistas. O último inquérito de opinião da Kantar vai mais longe, segundo a Reuters, dando os conservadores a subir 17% desde Maio, passando de 25% para 42%, e os trabalhistas a descer de 34% para 28%.

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