Presidente do Sudão recebeu milhões de dólares da Arábia Saudita, diz testemunha no julgamento

Omar al-Bashir é acusado de corrupção, de incitamento à violência, de lavagem de dinheiro e de financiamento de terrorismo. O julgamento do ditador sudanês é um teste às autoridades militares e à sua vontade de fazer uma transição para a democracia.

Omar al-Bashir
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Omar al-Bashir no tribunal EPA
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MOHAMED NURELDIN ABDALLAH/Reuters

O Presidente deposto do Sudão, Omar al-Bashir, recebeu milhões de dólares da Arábia Saudita, revelou um detective nesta segunda-feira no tribunal de Cartum onde o antigo chefe de Estado começou a ser julgado por corrupção.

Bashir, que vestia o traje tradicional branco e usava turbante, ouviu o testemunho sentado dentro de uma gaiola de metal. É acusado de posse ilícita de moeda estrangeira e de aceitar presentes de forma ilegal. Não fez comentários - falou apenas para dizer o seu nome e morada: “Antes perto do aeroporto, num quartel do exército, agora na prisão de Kobar”, disse a rir. Mas o seu advogado negou as acusações e, depois da sessão no tribunal, acrescentou aos jornalistas que é normal os dirigentes de países terem grandes quantias em divisas.

O departamento de comunicações do Governo saudita não respondeu ao pedido para comentar o testemunho do detective.

Bashir enfrentou múltiplas rebeliões, uma crise económica, sanções dos Estados Unidos e tentativas de golpe até ser derrubado num golpe militar em Abril, depois de uma vaga de protestos a exigir a sua saída após 30 anos de poder. 

O seu julgamento é visto como um teste às autoridades e à seriedade com que estão a apagar a herança de uma ditadura marcada pela violência generalizada, pelas guerras, pelo colapso económico e pela secessão do Sudão do Sul.

O antigo dirigente, de 75 anos, que chegou ao poder através de um golpe de Estado em 1989, chegou ao tribunal numa caravana escoltada por forças militares e paramilitares da força de reacção rápida. 

Membros da sua família gritaram “Allahu Akbar” (Deus é grande) e Bashir cumprimentou-os levantando a mão dentro da gaiola. Um pequeno grupo de pessoas foram autorizadas a entrar na gaiola e falar com o réu depois do fim da sessão - a próxima foi marcada para sábado.

Segundo o brigadeiro Ahmed Ali Mohamed, detective na equipa que investiga os crimes atribuídos a Bashir, o antigo Presidente disse-lhe que tinha recebido 25 milhões de dólares do príncipe saudita Mohammed Bin Salman, conhecido comoMbS e herdeiro do trono em Riad.

O detective disse que Bashir lhe contou que o príncipe lhe deu o dinheiro para ser gasto à margem do orçamento do país no pagamento de doações, mas que não lhe explicou porque o recebeu.

Quando Omar al-Bashir foi preso, foram encontradas grandes somas de dinheiro na sua residência: 351 mil dólares, mais de seis milhões de euros e cinco milhões de libras sudanesas.

Mohamed disse que Bashir contou aos investigadores ter recebido 65 milhões de dólares, em dois pagamentos separados, do anterior rei saudita, Abdullah.

“Não há informação ou provas sobre estas acusações relativas a ganhos ilícitos de Bashir”, disse o advogado Ahmed Ibrahim. “Qualquer pessoa na sua posição tem divisas e elas estavam numa sala ligada ao seu gabinete na residência presidencial”, acrescentou o advogado do réu.

Bashir tinha sido acusado em Maio de incitamento à violência e envolvimento na morte de manifestantes, e a acusação quer questioná-lo também por suspeitas de lavagem de dinheiro e financiamento de terrorismo.

O Presidente deposto do Sudão foi indiciado pelo Tribunal Criminal Internacional, em Haia, por ter orquestrado o genocídio no Darfur.

No sábado, a junta militar no poder no Sudão, assinou um acordo de partilha de poder com uma coligação da oposição, abrindo caminho para a criação de um governo de transição e, eventualmente, para a realização de eleições. 

O pacto criou um conselho soberano, que deve ser a principal autoridade do país, mas manteve a maior parte do poder executivo no Governo. Este conselho deveria ter entrado em funções nesta segunda-feira, mas o porta-voz do Conselho Militar de Transição, general Shams El Din Kabbashi, disse que a pedido da oposição houve um adiamento de 48 horas.

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