A revolta em Hong Kong vista por uma estudante portuguesa: “a resistência é transversal a todas as faixas etárias”

Inês Viva, estudante de medicina de 23 anos, foi testemunha acidental dos protestos em Hong Kong e acabou a dormir no aeroporto do território, onde recebeu água e comida dos manifestantes.

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Inês Viva passou a noite de 11 de Agosto no aeroporto de Hong Kong INÊS VIVA
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“Olho por olho”, era o que dizia uma das faixas afixadas no aeroporto de Hong Kong que mais chamou à atenção de Inês Viva. A portuguesa de 23 anos, estudante de medicina, chegou à cidade como turista a 7 de Agosto e pretendia sair no dia 12, mas nem tudo correu como planeado.

“Eu já sabia dos protestos antes de chegar. Contudo, a forma como a informação tem sido passada não me preparou para a violência que se tem verificado”, explica a estudante ao PÚBLICO.

Inês viu-se no centro dos protestos que duram há mais de dois meses e que nos últimos dias têm sido marcados por violentos confrontos entre manifestantes e a polícia. “Assistimos à revolta da população e tive oportunidade de falar com locais acerca do que se está a passar. Ao contrário do que eu achava, o que está a acontecer vai muito para além da lei da extradição”, explica.

A estudante de medicina na Universidade Nova de Lisboa acredita que o que distingue as actuais manifestações dos protestos anteriores é que, desta vez, a população parece estar toda do lado dos manifestantes e “veemente contra” a polícia. “Eu sabia que havia resistência por parte da população relativamente a toda a situação política”, conta Inês. “Mas nunca esperei que tal fosse em tão larga escala e transversal a todas as faixas etárias”.

Inês passou quase 24 horas no aeroporto e foi fotografando os protestos dos manifestantes INÊS VIVA
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Inês passou quase 24 horas no aeroporto e foi fotografando os protestos dos manifestantes INÊS VIVA

Inês sentiu o verdadeiro impacto dos protestos no dia 12 de Agosto, quando o aeroporto de Hong Kong cancelou a maioria dos voos por causa dos manifestantes que há quatro dias ocupavam um dos terminais. Nesse dia, por precaução, chegou ao aeroporto por 14h30 quando o seu voo era às 22h50. “Quando me dirigi para o aeroporto não estava à esperar de me deparar com aquela imagem. Milhares de pessoas, vestidas de preto a protestar dentro do aeroporto. Confesso que ao início fiquei um pouco assustada, mas rapidamente percebi que estavam a ser bastante pacíficos, ainda que as mensagens nos cartazes denotassem toda a fúria que a população de Hong Kong sente”.

O relato de Inês dessa noite é semelhante ao que foi sendo avançado pelos meios de comunicação: os protestos continuaram durante largas horas, todos os voos foram cancelados, os funcionários desapareceram, as lojas fecharam. As próprias companhias aéreas não sabiam o que se estava a passar e a estudante e um amigo acabaram por ficar a dormir ali mesmo, juntamente com mais turistas que lá ficaram retidos. “A noite já ia longa quando os próprios manifestantes foram dar comida e água aos turistas que se encontravam retidos. Por volta das cinco da manhã já tudo tinha sido removido e o aeroporto aparentava voltar à normalidade”. 

Mesmo assim, “a normalidade” demorou a instalar-se. Inês foi informada pela companhia aérea que teria voo às 9h da manhã para Paris, de onde partiria horas mais tarde para o Porto, mas só quatro horas depois conseguiu sair de Hong Kong. “Quando chego a Paris tenho imensas mensagens de amigos a perguntarem se tinha conseguido sair e fico a saber que, uma vez mais, todos os voos tinham sido cancelados e que os protestos deram lugar à violência e que a polícia já não se inibiu de demonstrar a força”, explica a estudante. 

Só na manhã desta quarta-feira é que Inês aterrou no Porto e não chegou a testemunhar o momento em que a polícia antimotim entrou no aeroporto. Segundo noticiou a Lusa na manhã desta quarta-feira, o movimento de contestação em Hong Kong não causou até ao momento grandes perturbações aos cidadãos portugueses residentes ou visitantes da zona, registando-se apenas “casos pontuais” de problemas com viagens, segundo disse o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva.

Hong Kong vive um clima de contestação social desencadeado pela apresentação de uma proposta de alteração à lei da extradição, que permitiria ao Governo e aos tribunais da região administrativa especial a extradição de suspeitos de crimes para jurisdições sem acordos prévios, como é o caso da China continental.

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