Autoridades prometem focar-se em cúmplices de Epstein depois da sua morte

Vítimas pedem que investigações não parem após a morte do magnata acusado de liderar uma rede de tráfico sexual de menores e que os cúmplices enfrentem a justiça.

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Ghislaine Maxwell foi descrita como "a madame" de Epstein Paul Zimmerman/Getty

O caso contra Jeffrey Epstein, acusado de tráfico sexual de menores, terminou com a sua morte, aparentemente um suicídio, numa cela da prisão de Manhattan. Mas várias mulheres que acusaram Epstein vieram pedir que este não seja o fim das investigações, e o mesmo fizeram políticos norte-americanos. Responsáveis dizem que as investigações vão continuar, e provavelmente vão focar-se na ex-namorada e amiga Ghislaine Maxwell, que parece ter tido um papel fundamental no recrutamento de menores para serem abusadas por Epstein e provavelmente por outros homens.

A morte de Epstein numa prisão de alta segurança de Manhattan, onde até recentemente esteve o narcotraficante conhecido como “El Chapo”, está também a ser alvo de investigação. No Twitter, a jornalista do Washington Post Carol Leonning disse mesmo que há pouco mais de duas semanas, quando tinha sido encontrado inconsciente na sua cela, Epstein disse que alguém o tinha tentado matar. Na sequência desse incidente, tinha sido posto na chamada “vigilância de suicídio”, um regime que implica ser vigiado permanentemente e que costuma durar apenas alguns dias.

Responsáveis dizem que Epstein tinha passado deste regime para um de vigilância mesmo assim apertada, mas o New York Times diz que, numa aparente violação dos procedimentos prisionais previstos, Epstein foi deixado sozinho e não foi monitorizado de perto como devia. Há três investigações a decorrer à morte do magnata, tratada como suicídio – que continua a ser apontado como a causa provável.

A morte aconteceu um dia depois da divulgação de uma série de depoimentos que davam mais pormenores sobre os métodos de angariação, a escala do abuso e os outros homens que nele teriam participado.

“O suicídio de Epstein não foi uma coincidência”, disse Sigrid McCawley, advogada de Virginia Giuffre, uma das mulheres que acusam Epstein e ainda a Ghislaine Maxwell, que ajudaria a levar jovens para a casa de Epstein e organizava os horários das massagens (que eram muitas vezes a porta de entrada para os abusos). “O processo não deveria acabar com o suicídio cobarde e vergonhoso de Jeffrey Epstein.”

Jennifer Araoz, uma das mulheres que acusou publicamente Epstein (mas que não fazia parte do processo contra ele), lamentou a morte do magnata. “Temos de viver com as cicatrizes das suas acções, e ele não terá de enfrentar as consequências dos crimes e a dor e trauma que causou a tantas pessoas”, disse Araoz. “Espero que as autoridades persigam e acusem os seus cúmplices.”

Araoz contou, em Julho, como foi levada por uma “morena de 20 anos” com quem conversou perto do liceu a conhecer Epstein, que se mostrou preocupado com ela, prometendo por exemplo doar dinheiro a organizações de luta contra a sida (o pai de Araoz, então com 14 anos, tinha morrido da doença dois anos antes). Araoz recebeu várias vezes dinheiro de Epstein, e este começou a pedir-lhe massagens, cada vez mais sexuais, e um dia violou-a. Ela tinha 15 anos. 

O procurador de Manhattan, Geoff Berman, disse que o plano é manter aberta a investigação aos que possam ter conspirado com Epstein para facilitar os abusos. “A todas as jovens corajosas que já deram a cara e a muitas outras que o venham a fazer, reitero que continuamos empenhados e que a nossa investigação na conduta que está na acusação – que inclui o crime de conspiração – continua.”

O conselheiro legal da CNN Paul Callan afirmou que como Epstein era o único acusado no processo, este iria ser encerrado. Mas que poderia haver novos processos, alguns para que os seus bens fossem usados para indemnizar possíveis vítimas.

Dado os vários aspectos excepcionais neste caso, vai haver mais pressão para que os cúmplices e facilitadores sejam investigados. Há o acordo especialmente favorável a Epstein que em 2008 lhe permitiu servir uma sentença de apenas 13 meses com seis dias por semana fora da prisão para trabalhar (o processo para este acordo, aceite pelo procurador de Miami, Alex Acosta, que entretanto era secretário do Trabalho de Trump e se demitiu após o teor ter sido divulgado pelo Miami Herald, também está a ser investigado), até ao facto de Epstein ter no seu círculo pessoas influentes da política, ciência ou entretenimento, e, claro, as circunstâncias da sua morte.

“Acho que isso é muito mais provável agora”, disse Duncan Levin, antigo procurador do Distrito Leste de Nova Iorque, à revista Rolling Stone.

Isso passará por Ghislaine Maxwell, presença assídua ao lado de Epstein e que seria fundamental na busca de adolescentes para Epstein em liceus e spas, por exemplo. Várias adolescentes chamaram-lhe “a madame”.

Maxwell não foi acusada de qualquer crime. Mas depois de ter classificado as declarações de uma acusadora de Epstein, Virgina Giuffre, em relação ao seu papel na rede de angariadora e também de abusadora como “totalmente mentira”, Giuffre moveu um processo contra Maxwell – que foi resolvido com um acordo em 2017. Foi no âmbito deste processo, com a ordem do fim de libertação de alguns documentos ao público, que surgiram as várias revelações da véspera da morte de Epstein. Há ainda documentos sob sigilo: na quinta-feira um juiz de Manhattan decidirá sobre ainda mais depoimentos relacionados com este processo.

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