A lei de Pascal

Estando, à esquerda e à direita, praticamente decidido quem ganha e quem perde, falta resolver o quem e o como. E sobre isso as hipóteses não abundam.

Quando, por portas e travessas, por metáforas e elipses, se está a apelar aos eleitores para correrem o risco de dar a maioria absoluta ao PS, a mensagem que está a ser difundida transmite o sentimento de fragilidade de quem faz dela o argumento inadiável da disputa do resultado eleitoral. Contudo, o que vai contar é a consistência entre o que se proclama e a percepção que os eleitores têm da possibilidade da sua concretização. Este tipo de apelos remete inevitavelmente para a alienação das escolhas, no limite é um instrumento de manipulação das consciências, quando o período peri-eleitoral devia ser aproveitado para incluir no debate político toda a racionalidade disponível. E na racionalidade disponível está sobretudo o histórico do que foi feito, do que ficou por fazer e do que não se quis fazer. Prometer colmatar o que ficou em aberto pode ter tanto de arbitrário como de fantasia, principalmente quando a inércia política serviu como linha invisível onde o que contava era impedido de a ultrapassar. E, nestes casos, são sempre escolhas políticas que estão em causa. E toda a escolha política é ideológica.

Em Outubro, os portugueses hão-de saber fazer todas as contas para distribuir os méritos a quem os mereceu. E será da combinação desses méritos que a solução política e governamental terá maior probabilidade de ser encontrada e concretizada. Se for com uma maioria absoluta do PS, que seja. Aprendemos nestes anos que a sua importância tem vindo a diminuir à medida que as dinâmicas populares vão impondo a sua vontade, transferindo para o combate político a lei de Pascal: “O aumento de pressão em um ponto do líquido em equilíbrio é transmitido integralmente para todos os outros pontos desse líquido e das paredes do recipiente onde ele está contido. Esta apropriação da física dos líquidos por parte de quem intervém politicamente à margem das regras partidárias e parlamentares serviu para animar o espírito dos acordos de 10 de Novembro de 2015, e indo-se um pouco além do que estava escrito, previsto e subscrito.

Por isso, seja qual for a versão que tiver vencimento em 6 de Outubro, há lições que não ficarão exclusivamente na lembrança. Ao contrário, são autênticos guias de acção. Com mais ou menos de 116 deputados, o PS passou a ter de contar com outros parceiros com razões para interferirem na corrente dos acontecimentos. É uma interferência entre iguais, em que a disputa se faz pela demonstração da robustez dos argumentos. É uma interferência que é simultaneamente um sistema propositivo porque tem em vista alterar o estado das coisas, daquelas cujo valor de uso há muito que é uma inutilidade.

Sobretudo, é necessário lembrar que governar um país é procurar resolver uma equação com tantas incógnitas que é insuficiente aspirar a uma maioria absoluta para se ter acesso ao algoritmo que lhe dá todas as respostas. Esse é o algoritmo da soberba. As maiorias absolutas só têm servido para atrapalhar, para sufocar o escrutínio e dar asas às más companhias. Por isso, o melhor mesmo seria nem falar do assunto, preencher o tempo que resta, até 5 de Outubro, com a aplicação de medidas que sinalizem outras tantas indicações do sentido e da orientação que as políticas sectoriais vão ter.

Estando, à esquerda e à direita, praticamente decidido quem ganha e quem perde, falta resolver o quem e o como. E sobre isso as hipóteses não abundam. Entre as várias combinações, há uma que representa a que nestes anos deu melhores resultados. Mas considerando ainda a sua insuficiência apresentou, apesar disso, provas de que tem condições para se desenvolver. O teste a que foi sujeita, não fazendo dela um modelo, fez dela a principal referência do que de melhor as várias esquerdas, em conjunto, conseguiram realizar. Essa foi também a confirmação da validade da lei de Pascal. Lembremo-nos dos dias que antecederam o 6 de Outubro de 2015.

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