Trump apoia reforço do controlo na venda de armas e recebe telefonema da NRA

Director da organização pró-armas terá avisado o Presidente norte-americano que os seus eleitores não gostam da ideia, segundo o jornal Washington Post. E sem o apoio da Casa Branca, os senadores do Partido Republicano também não avançam.

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Wayne LaPierre, director executivo da NRA Jonathan Ernst

Em Abril de 2013, quando os cidadãos norte-americanos ainda estavam a recuperar da morte de 20 crianças de seis e sete anos num tiroteio na Escola Primária de Sandy Hook, o Senado dos EUA rejeitou as propostas que estavam em cima da mesa para apertar o controlo sobre a venda de armas em todo o país. Desde então, nada mudou na falta de vontade política para fazer alterações, e nem os dois tiroteios da semana passada, em El Paso e Dayton, parecem ter deixado os senadores mais perto de um entendimento. Segundo o jornal Washington Post, o Presidente Donald Trump recebeu um telefonema do líder do poderoso lobby das armas, na terça-feira, assim que manifestou abertura para apoiar um reforço do sistema que avisa os vendedores se um comprador está na lista negra.

Não é na Casa Branca que se fazem as leis, mas numa questão como o acesso às armas, num país onde isso mexe com muitas paixões, o apoio público e consistente a uma proposta de lei por um Presidente como Donald Trump é essencial para encorajar os membros do Senado.

Muitos senadores, principalmente os que foram eleitos pelo Partido Republicano ou pelo Partido Democrata em estados muito conservadores, precisam de toda a ajuda possível para convencerem os seus eleitores a aceitarem alterações à lei sem que isso os prejudique em eleições futuras.

"Não há apetite político"

Desde aquelas tentativas falhadas em 2013, na sequência de um dos tiroteios mais chocantes da história dos EUA, o país já passou por mais dez ataques semelhantes que entraram para a lista dos mais mortíferos dos últimos 70 anos, incluindo os de El Paso e Dayton, que juntos fizeram 31 mortos.

Tal como já fez noutras ocasiões, como após a morte de 14 adolescentes e três adultos na Escola Secundária de Parkland, em Fevereiro de 2018, o Presidente Trump manifestou o seu apoio ao alargamento dos chamados background checks a vários tipos de transacções de armas – segundo a lei actual, esse controlo só é exigido em compras nas lojas de armas registadas para o efeito, mas não em transacções entre particulares, em feiras de armas ou através da Internet, por exemplo.

Mas assim que o fez, segundo noticia o jornal Washington Post, o Presidente norte-americano recebeu um telefonema de Wayne LaPierre, director executivo da National Rifle Association – a organização que se opõe a todas as propostas do Congresso que apertem o controlo sobre a venda de armas.

Segundo o Washington Post, LaPierre disse a Trump que o seu eventual apoio a uma reforma dos background checks “não seria popular entre os seus apoiantes”.

Na quarta-feira, antes de partir para uma visita a Dayton e El Paso, o Presidente norte-americano voltou a dizer que pode haver condições para apertar o controlo sobre os compradores, mas afastou a hipótese de uma proibição da venda das chamadas espingardas de assalto – as armas semiautomáticas, feitas à semelhança das militares, que são usadas pela maioria dos atiradores.

Para Trump, “não há apetite político” no Senado para mudanças desse tipo. E sabe-se que o líder da maioria do Partido Republicano no Senado, Mitch McConnell, só admite levar a votos qualquer proposta se tiver o apoio generalizado da sua bancada. Para fechar este ciclo, muitos senadores do Partido Republicano precisariam de um apoio declarado do Presidente Trump – muito popular entre os opositores das restrições às armas – para dizerem a Mitch McConnell que pode avançar.

Entre outros motivos, os opositores do alargamento do controlo a todas as transacções dizem que isso permitiria ao Governo federal norte-americano criar uma base de dados com os nomes de todos os compradores, para depois ser mais fácil tirar-lhes as armas.

Milagre político

Desde 2013, o Senado tem à sua disposição uma proposta de lei da autoria dos senadores Joe Manchin, do Partido Democrata, e Pat Toomey, do Partido Republicano – uma das que foram rejeitadas após a morte de 20 crianças de seis e sete anos na escola de Sandy Hook, em Dezembro de 2012.

E nem sequer é uma proposta radical, como convém a dois senadores de partidos diferentes que pretendem conquistar o máximo de apoio possível: se fosse aprovada, os vendedores nas feiras de armas e através da Internet teriam de esperar por um relatório sobre os compradores, mas as transacções entre familiares e vizinhos, por exemplo, continuariam a ser feitas sem restrições. A proposta também proíbe explicitamente o Departamento de Justiça de criar uma base de dados de compradores.

Mas a Câmara dos Representantes, agora controlada por uma maioria do Partido Democrata, aprovou em Fevereiro uma proposta que impõe background checks a toda e qualquer transacção – uma proposta que não conta nem com o apoio dos republicanos no Senado, nem da Casa Branca. E para que uma lei entre em vigor, é preciso que o Senado pegue numa proposta aprovada pela Câmara dos Representantes e que a aproxime da sua – só depois disso, neste caso com 60 votos a favor no Senado, e da promulgação pela Casa Branca, é que a lei muda de facto.

A possibilidade de isso acontecer é remota, pelo menos num futuro imediato. Seis anos depois do tiroteio na escola de Sandy Hook, o actual Partido Democrata na Câmara dos Representantes quer mais do que a proposta dos senadores Manchin e Toomey, e o actual Partido Republicano no Senado não admite ir tão longe como a proposta dos democratas na Câmara dos Representantes.

A não ser que surja uma proposta que agrade a todos – o que é difícil de acontecer –, uma alteração profunda às leis das armas nos EUA só poderá acontecer se o Partido Democrata conseguir um milagre eleitoral em Novembro de 2020: manter a maioria na Câmara dos Representantes, reconquistar a maioria no Senado e com pelo menos 60 senadores e afastar Donald Trump da Casa Branca para que o novo Presidente promulgue a lei.

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