Moro não acreditava na denúncia de Palocci, mas divulgou-a a uma semana das eleições

Novas mensagens obtidas pelo Intercept Brasil sugerem que Sérgio Moro divulgou declarações do ex-ministro do PT com intenções políticas.

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Sérgio Moro foi criticado pela campanha de Haddad por ter revelado denúncia de Palocci a uma semana das eleições presidenciais ADRIANO MACHADO / Reuters

Poucos dias antes de revelar o conteúdo da denúncia do ex-ministro António Palocci contra o ex-Presidente Lula da Silva, o então juiz federal Sérgio Moro mostrava dúvidas sobre a solidez do testemunho, de acordo com mensagens trocadas por procuradores da Operação Lava-Jato e divulgadas pela Folha de São Paulo. Apesar das dúvidas, Moro decidiu tornar pública a denúncia de Palocci nas vésperas da primeira volta das eleições presidenciais do ano passado.

A 25 de Setembro, o procurador Paulo Roberto Galvão manifestava, num grupo que juntava outros membros da Lava-Jato na rede social Telegram, as dúvidas de Moro sobre o testemunho do ex-ministro do Partido dos Trabalhadores (PT). “Russo comentou que, embora seja difícil provar, ele é o único que quebrou a omertà ‘petista’”, afirmou o procurador, fazendo referência à omertà, o código de silêncio da Máfia italiana.

As mensagens de outros procuradores vão no mesmo sentido, como a da procuradora Laura Tessler, que disse ser “impossível extrair algo da delação” de Palocci. “O melhor é que [Palocci] fala até daquilo que ele acha que pode ser que talvez seja”, afirmava então o procurador Antônio Carlos Welter.

A Folha não cita qualquer declaração directa de Sérgio Moro sobre o caso. As mensagens integram os conteúdos de conversas obtidos pelo site Intercept Brasil, que as tem partilhado com outros meios de comunicação, que mostram as discussões entre procuradores da Lava-Jato e Moro, e sugerem uma direcção política na condução das investigações com o objectivo de prejudicar o PT.

Palocci, que se tornou uma testemunha-chave na megaoperação de combate à corrupção, tentou negociar durante meses um acordo de “delação premiada” com o Ministério Público Federal e com os procuradores da Lava-Jato, sem sucesso. Conseguiu finalmente, em Março do ano passado, fechar um acordo com a Polícia Federal, algo pouco comum, e foi ao abrigo desse entendimento que descreveu um esquema no seio do PT para distribuir contratos públicos da Petrobras, a petrolífera estatal no centro do escândalo.

Palocci era um destacado dirigente do PT, muito próximo de Lula, tendo sido ministro das Finanças e da Casa Civil nos seus governos, além de ter coordenado a primeira campanha eleitoral de Dilma Rousseff. Foi preso em Setembro de 2016 e, no ano seguinte, foi condenado a 12 anos de prisão por Moro — o acordo de “delação premiada” garantiu-lhe a passagem para o regime semiaberto de prisão.

Apesar das dúvidas que Moro mostrava sobre a fiabilidade do testemunho de Palocci, o então juiz federal acabou por divulgar publicamente o conteúdo da denúncia a 1 de Outubro, a seis dias da primeira volta das eleições presidenciais. Na altura, a candidatura de Fernando Haddad, do PT, criticou a decisão de Moro, considerando tratar-se de uma interferência no processo político.

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