A perigosa tentação dos motoristas

O Estado reagiu com prudência ao pré-aviso, mas o Governo não.

Os motoristas de materiais perigosos aprenderam e ensinaram como é possível parar um país com rapidez e eficácia a uma semana da Páscoa. Os dois sindicatos que representam estes 900 profissionais ameaçam voltar a fazê-lo a meio das férias de Verão, num Agosto que até pode ser determinante para as próximas legislativas, tal como tinham anunciado no primeiro congresso que realizaram em Junho. Um vídeo desse congresso, divulgado pela SIC, é revelador da estratégia sindical: aproveitar o momento pré-eleitoral para causar o máximo possível de transtorno.

E aprenderam de tal forma que o protesto foi suficientemente convincente para chegarem a um acordo com a associação de empresas de transportes de mercadorias quanto ao aumento de 300 euros em 2020. O que move agora o novo pré-aviso de greve é um acordo que garanta aumentos graduais no salário-base até 2020: 700 euros em Janeiro de 2020, 800 euros em 2021 e 900 euros em 2022.

Presentemente, não há outra classe profissional com tamanha capacidade de exigência. A marcação da greve teve em conta o impacto que esta vai causar numa população de férias, que pode deixar de ser abastecida em zonas nevrálgicas, e na eventual inversão da tendência de subida do PS nas sondagens. Mas o mais provável que possa acontecer é exactamente o contrário: os motoristas hipotecarem qualquer simpatia pública pela sua causa, como se depreendeu da greve de Abril, porque para a maioria da população é uma bizarra abstracção discutir aumentos para os próximos três anos. A decisão é imprudente e chega a ser arrogante na forma como os sindicatos se mostram pouco disponíveis até para negociar serviços mínimos.

O Estado reagiu com prudência ao pré-aviso, mas o Governo não. Os serviços públicos de protecção civil, autoridades policiais e outras instituições responderam cautelosamente ao espectro de um país paralisado. Fizeram-no com prudência e sem alinhar no clima de alarme que estava já em ebulição. O ministro Pedro Nuno Santos, surpreendentemente, fez o contrário. O ex-secretário de Estado que esteve na origem do acordo entre as duas partes no pico do conflito anterior, por razões incompreensíveis, veio sugerir que os condutores se começassem a abastecer de combustível para “se precaverem” no caso de haver greve dos motoristas a partir de 12 de Agosto. Pardal Henriques corre o risco se transformar no grande adversário do PS.

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