“O Bonifácio da dúvida”: resposta a José Ribeiro e Castro

Lamentamos que José Ribeiro e Castro, que foi também Deputado à Assembleia da República, considere censória e compressora da liberdade de expressão a Lei de Imprensa, votada naquela Assembleia.

Publicou o jornal que dirige, no dia 16 de Julho, um texto de opinião, assinado por José Ribeiro e Castro, com o título “O Bonifácio da dúvida”, em que somos directamente visados, enquanto subscritores de uma queixa-crime enviada à Procuradora-Geral da República contra a autora do texto de opinião com o título “Podemos? Não, não podemos”, também publicado no jornal que dirige, a 6 de Julho de 2019.

Escreveu José Ribeiro e Castro:

Muitos trataram não só de fustigar o texto, mas de zurzir pessoalmente Fátima Bonifácio e exigir silenciamento, segregação, irradiação, proibição e castigo.” E, entre esses, refere explicitamente “14 notáveis (incluindo jornalistas e ex-procuradores!) que, levando o zelo persecutório à barra dos tribunais, anunciaram instaurar processos-crime contra Fátima Bonifácio”.

Para que dúvidas não restassem sobre quem eram esses “notáveis”, a frase remetia para o artigo publicado a 10 de Julho no vosso jornal, com o título “Grupo de 14 pessoas apresenta queixa-crime contra Maria de Fátima Bonifácio”, em que os nossos nomes são referidos.

Poucas linhas depois, acrescentava José Ribeiro e Castro:

Lamento observar que, no espaço público, entre os que animam a pressão censória se encontram não só militantes e activistas, mas jornalistas, esquecidos (pelo menos, por um momento) de a liberdade de expressão ser a ferramenta fundamental do jornalismo e a sua compressão não costumar ter recuo, senão com custo muito elevado.”

Lamentamos nós que José Ribeiro e Castro – que, além de “Advogado e antigo líder do CDS”, qualidades em que vem assinado o artigo em causa, foi também Deputado à Assembleia da República – considere censória e compressora da liberdade de expressão a Lei 2/99 (Lei de Imprensa), votada naquela Assembleia. Ou que tenha esquecido, pelo menos por um momento, aquilo que nela dizem os Artigos 30.º e 31.º – que, dada a confusão entre queixa-crime e Censura que no artigo é criada, nos permitimos recordar:

Artigo 30.º – ​Crimes cometidos através da imprensa

1 — A publicação de textos ou imagens através da imprensa que ofenda bens jurídicos penalmente protegidos é punida nos termos gerais, sem prejuízo do disposto na presente lei, sendo a sua apreciação da competência dos tribunais judiciais.

2 — Sempre que a lei não cominar agravação diversa, em razão do meio de comissão, os crimes cometidos através da imprensa são punidos com as penas previstas na respectiva norma incriminatória, elevadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo.

Artigo 31.º – ​Autoria e comparticipação

1 — Sem prejuízo do disposto na lei penal, a autoria dos crimes cometidos através da imprensa cabe a quem tiver criado o texto ou a imagem cuja publicação constitua ofensa dos bens jurídicos protegidos pelas disposições incriminadoras.

2 — Nos casos de publicação não consentida, é autor do crime quem a tiver promovido.

3 — O director, o director-adjunto, o subdirector ou quem concretamente os substitua, assim como o editor, no caso de publicações não periódicas, que não se oponha, através da acção adequada, à comissão de crime através da imprensa, podendo fazê-lo, é punido com as penas cominadas nos correspondentes tipos legais, reduzidas de um terço nos seus limites.

4 — Tratando-se de declarações correctamente reproduzidas, prestadas por pessoas devidamente identificadas, só estas podem ser responsabilizadas, a menos que o seu teor constitua instigação à prática de um crime.

5 — O regime previsto no número anterior aplica-se igualmente em relação aos artigos de opinião, desde que o seu autor esteja devidamente identificado. (...)”

Gostaríamos de recordar, também, que já em 1789, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, ao estipular no seu artigo 11.º que “a livre comunicação de pensamentos e opiniões é um dos direitos mais preciosos do Homem, pelo que cada Cidadão pode falar, escrever e imprimir livremente”, logo acrescentou “respondendo pelo abuso dessa liberdade nos casos determinados por Lei”.

É esta toda a diferença entre Censura Prévia e sanção penal.

Pensando não ter de invocar o Artigo 24.º da Lei de Imprensa, solicitamos, Sr. Director, a publicação desta resposta.

Os signatários,

António Borga (C.P. 675)
Diana Andringa (C.P. 22 A)
José Augusto (CNID 266)
José Mário Costa (C.P. 419 A)
Paulo A. Monteiro (C.O. 1480)

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