Sérgio Moro interferiu em acordo com delatores na Lava-Jato

“Enquanto juiz, não houve participação na negociação de qualquer acordo de colaboração”, respondeu Moro em comunicado.

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Sergio Moro ADRIANO MACHADO/Reuters

Sérgio Moro, que era o juiz responsável pelos processos judiciais da Lava-Jato, interferiu nos acordos de delação premiada (em que réus confessam crimes e ajudam nas investigações em troca da redução da pena) da investigação anti-corrupção no Brasil​, noticia na edição desta segunda-feira o jornal Folha de São Paulo.

O jornal publica mensagens trocadas entre Moro, agora ministro da Justiça, e magistrados da Lava-Jato, na plataforma de mensagens Telegram obtidas de uma fonte anónima pelo portal The Intercept Brasil. As mensagens estão a publicadas em parceria com vários meios de comunicação social brasileiros desde Junho e põem em causa a imparcialidade da maior operação contra a corrupção do país.

Citando mensagens privadas trocadas no ano de 2015, o jornal diz que Moro interferiu nos acordos firmados pelo Ministério Público Federal com dois executivos da construtora Camargo Corrêa, contrariando a legislação do país.

O antigo juiz era responsável pelo julgamento dos casos da Lava-Jato ao ano passado, quando deixou a magistratura para ser ministro da Justiça. Segundo as conversas obtidas pela Folha, disse aos magistrados da Lava-Jato que só validaria negociações com delatores da Camargo Corrêa se os acordos estabelecessem um ano de prisão.

Essa interferência contraria a lei brasileira sobre acordos de colaboração premiada, que diz que os juízes devem manter-se distantes das negociações, tendo como única função neste processo a obrigação de verificar a legalidade das condições estabelecidas entre as partes após a assinatura dos acordos de colaboração.

O jornal também publica diálogos entre o procurador-chefe da Lava-Jato, Deltan Dallagnol, com outros procuradores em que alerta sobre a necessidade de informar Moro sobre as negociações em andamento para garantir que o juiz aceita as propostas do Ministério Público aos advogados dos delatores.

A Camargo Corrêa foi a primeira construtora a delatar crimes à justiça brasileira na operação, dando informações importantes sobre o cartel organizado por empreiteiras para ganhar os contratos com a empresa estatal petrolífera Petrobras.

A Folha escreveu que consultou dois advogados que acompanharam aquelas negociações, que disseram que “dificilmente os executivos da Camargo Corrêa teriam aceitado cooperar com a Lava-Jato sem ter alguma garantia de que os acordos receberiam o aval do juiz, segurança que só foi possível obter com as conversas que os procuradores tiveram com Moro durante as negociações”.

Contacto pelo jornal, Moro afirmou que não participou das negociações de qualquer acordo de colaboração premiada quando era juiz responsável pela Lava-Jato.

“Enquanto juiz, não houve participação na negociação de qualquer acordo de colaboração”, respondeu Moro em comunicado.

Moro acrescentou que não reconhece a autenticidade do material obtido pelo The Intercept Brasil que foi partilhado com a Folha, mas não apontou indícios de adulteração nos diálogos.

Lava-Jato informou, através de comunicado, que não se manifesta sobre o assunto sem ver os diálogos, mas reiterou que não reconhece a autenticidade do material.

“A Lava-Jato em Curitiba não reconhece as mensagens que têm sido atribuídas a seus integrantes”, referem os investigadores. “O material é oriundo de crime cibernético e não pode ter seu contexto e veracidade confirmados”, acrescentaram.

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