O ciclista que não quer ganhar

O alemão Marcus Burghardt é uma espécie de director desportivo da Bora na estrada.

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O título hiperboliza um pouco a questão, mas a verdade é que há mesmo no Tour um ciclista que não vai com o objectivo de ganhar o que quer que seja em nome próprio. Argumentar-se-á que muitos ciclistas vão às provas na missão de gregários e que, por isso, não almejam vitórias. Sim, mas este está noutro nível.

Falamos de Marcus Burghardt, um dos veteranos deste Tour — tem 36 anos —, que foi contratado pela BORA, em 2016, já numa lógica de ser o director desportivo na estrada, depois de quase sete anos sem ganhar uma corrida. “Aceitei ser o braço do director desportivo. Mesmo com os rádios, o director, no carro ou na TV, não consegue ver a corrida como eu. Ou quando vê, já é demasiado tarde. É importante ter alguém na corrida que possa tomar uma decisão rápida”, explicou o alemão, à revista Peloton.

Pergunta de um milhão de euros: por que motivo um vencedor da Gent-Welvelgem e vencedor de uma etapa do Tour (2008) aceita, tão cedo, abdicar da carreira pessoal para ser apenas um “treinador” na estrada?

“Percebi que, por um lado, sei ler bem as corridas e que, por outro, não iria estar apto a grandes vitórias. Percebi isso muito cedo. Claro que ganhei a Gent-Welvelgem ainda jovem e muitos apontavam o meu nome ao Tour de Flandres, por exemplo, mas o melhor que fiz foi um sétimo lugar. Percebi que me faltava esse extra de talento que outros rapazes têm”.

O título de campeão alemão chegou já em 2017 e foi uma surpresa total, depois de sete anos sem vitórias e apenas como “capitão na estrada”. Foi, provavelmente, a última grande vitória individual de Burghardt, que até lhe valeu algo raro. 

Fruto da publicidade que advém de correr com a camisola de campeão alemão, a BORA renovou-lhe o contrato por três temporadas, algo inusual para um ciclista de 34 anos.

Resumindo: ganhou uma clássica importante, ganhou uma etapa no Tour, foi campeão nacional e ajudou jovens como Van Avermaet e Sagan a conquistarem o mundo. O que falta? Talvez aprender mais qualquer coisa com os jovens talentosos? “Nem por isso… já ando aqui há tantos anos que já não há muito que precise de aprender”. Se Burghardt diz, está dito.

A talhe de foice, fica a nota: Burghardt, como muitos outros ciclistas, vendo que lhe calhou o dorsal 13 para este Tour, todos os dias o vira ao contrário. Fruto da superstição.

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