“O meu objectivo não é descobrir, mas aplicar a ciência para criar oportunidades comerciais”

Três Perguntas a John Melo Empresa norte-americana que o português preside, a Amyris, investiu 42 milhões de euros num centro de biotecnologia em parceria com a Universidade Católica Portuguesa. O investimento de Junho de 2018 começa agora a dar frutos.

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Gonçalo Dias

John Melo é português, natural dos Açores, mas desde 1973 que vive nos Estados Unidos da América. A Amyris, empresa da qual é presidente, cria, através da biotecnologia, produtos sustentáveis que depois são integrados na indústria de sabores, fragrâncias, cosmética, entre outros. Após um ano de parceria com a Universidade Católica Portuguesa (UCP), o presidente executivo faz o balanço do que foi criado.

Como nasceu a ideia de criar um centro de biotecnologia na cidade do Porto?

A ideia foi criada com a visão de que tudo o que é usado no processo de fermentação, toda a matéria-prima, devia ter um valor. Há alguns anos, tive um jantar em minha casa, na Califórnia, com alguns representantes da UCP e nesse jantar, por pura coincidência, fiquei ao lado da professora Manuela Pintado, que me contou todo o trabalho que já tinham realizado no campo da valorização de subprodutos e pensei: “Porque não fazemos uma parceria para desenvolver os resíduos da fermentação dos nossos produtos?” Podemos trazer todos esses materiais para aqui e desenvolver novas criações com esta equipa.

Qual era a ideia inicial para este núcleo de biotecnologia e qual é o balanço do trabalho já realizado (quase) um ano depois?

O meu primeiro objectivo foi investir nesta área em Portugal. Há muitos cientistas portugueses com muito talento para se entregarem a um projecto, mas que não têm emprego aqui. Quanto ao balanço, outro dos objectivos iniciais era criar um produto no primeiro ano para ser lançado e comercializado. Acho que, afinal, teremos dois ou três que já estão nesta fase.

É bom atrair gente de fora, mas ainda mais importante é manter quem cá está. E não é só criar emprego — é criar oportunidades para que participem em projectos que podem ter mudanças positivas no país e no mundo. Um cientista pode passar uma vida inteira a tentar descobrir algo e ao fim de décadas nunca o conseguir. O meu objectivo não é descobrir, mas aplicar a ciência para criar oportunidades comerciais.

É isso que criamos aqui e esta junção de investigadores de campos de conhecimento diferentes significa que podemos fazer um projecto avançar de forma mais rápida, porque temos várias formas de olhar para um problema e outras tantas de o solucionar. Acho que isto só acontece quando há uma grande diversidade de cabeças a pensar.  E um mundo assim é boring.

Que impacto acha que um espaço como este tem numa cidade?

O meu desejo era que o Porto se tornasse uma plataforma de biotecnologia, indústria e economia circular para toda a Europa, América — onde temos as nossas fábricas — e África. Como consequência deste projecto de cinco anos esperamos que surjam empresas spin-off que se fixem no Porto. Também temos tido contacto com firmas locais que gostavam de comercializar os seus produtos a nível global. Nós, que temos um mercado espalhado por todo o mundo, podemos comercializar esses produtos de outra forma e criar novas oportunidades para essas empresas locais.

Posso dizer que já trouxemos cá quatro ou cinco empresas de nível global, e nenhuma delas tinha cá estado, e isso é muito interessante. Todas viram aqui uma oportunidade de negócio, porque quem produz algum tipo de bem tem obrigatoriamente resíduos, e todos querem desfazer-se deles e agregar-lhes valor.

O que é interessante é que isto tudo já existia antes de nós chegarmos e, apesar de os projectos do Centro de Biotecnologia e Química Fina da UCP terem sido bem sucedidos, havia sempre empresas de pé atrás que não queriam investir ou não tinham recursos para tal.

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