O controverso serviço que Kyrgios recuperou

O tenista australiano é um dos que mais vezes tem utilizado o serviço por baixo.

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Nick Kyrgios DR

Foi há 30 anos que Michael Chang surpreendeu Ivan Lendl e o mundo do ténis ao efectuar um serviço por baixo, quando disputava o quinto set dos oitavos-de-final de Roland Garros. Desde então, foram vários os jogadores que, esporadicamente, optaram por esse serviço, mas só este ano essa opção se tornou mais recorrente, por culpa de Nick Kyrgios. Ainda há dias, o australiano ganhou dois pontos desta forma a Rafael Nadal.

O jogador prepara-se para servir como sempre, mas quando a raqueta ainda está em baixo, bate na bola com um pequeno movimento. Basta que a bola seja batida pela raqueta antes de tocar no solo para estar de acordo com as regras. Numa era em que a larga maioria dos tenistas masculinos serve a 200km/h, um serviço a uma velocidade baixa e trajectória curta apanha os adversários de surpresa – um pouco como o efeito de um amortie durante uma troca de bolas do fundo do court. Até Ivo Karlovic, o rei dos ases, surpreendeu Tommy Haas no torneio de Estocolmo de 2007, deixando o alemão sem reacção.

Há 30 anos, Chang teve a desculpa de estar com cãibras e não querer realizar o habitual movimento de serviço, que exige uma flexão das pernas. As reacções foram elogiosas para com o tenista norte-americano, pela sagacidade demonstrada por um tenista de 17 anos, numa altura crítica de um encontro tão importante.

“Criou um elemento muito interessante no jogo e tornou a batalha, não apenas física, mas igualmente mental. Por mais estranho que pareça, nunca mais pensei em tentar usá-lo”, afirmou Chang, que viria a ganhar o título, sendo ainda hoje o mais jovem campeão do Grand Slam na Era Open.

Mas desde que, em Fevereiro, no torneio de Acapulco, Kyrgios tentou surpreender Rafael Nadal com um underhand serve, a discussão sobre esse tipo de serviço alastrou-se pelo mundo do ténis. Para uns, é uma opção legítima, para outros, esse serviço é considerado um desrespeito para com o adversário.

“Sem dúvida que é uma táctica, especialmente quando os tipos estão lá atrás encostados à vedação. Não é vergonha alguma tentar, mas podemos parecer idiotas se falharmos. O problema é que nunca praticamos nos treinos e quando vamos para o court é difícil conseguir ter sucesso. Mas tudo o que estiver dentro das regras está bem”, comentou Federer na altura.

Nadal é o melhor exemplo desse tipo de jogadores, que responde ao serviço bastante atrás, o que justifica a opção de Kyrgios, que venceu o espanhol em Acapulco, mas perdeu em Wimbledon. “O Nick é um grande jogador, tem uma inteligência táctica que poucos atletas têm no circuito e por isso tem uma percentagem tão alta de vitórias contra jogadores top-10. Penso que perdeu poucos pontos a servir por baixo”, frisou Frederico Marques, treinador de João Sousa.

“A meu ver, o serviço por baixo é mais uma arma que se pode treinar e executar no ténis, bastante efectiva contra jogadores que respondem ao serviço muito longe da linha de fundo ou que não gostam de posições mais próximas da rede, visto que os aproxima e os faz tirar da zona de conforto. Eu sou a favor de se usar e revela inteligência táctica e controlo emocional. Alguns são contra, mas penso que a maioria está a favor; se as regras o permitem, porque não utilizar?”, questiona Marques.

Outro tenista que também costuma responder bastante atrás é Dominic Thiem, vítima de vários serviços por baixo na última edição de Roland Garros, num duelo com Alexander Bublik, quando este se encontrava desgastado fisicamente. “Sinceramente, é uma boa escolha frente a jogadores como nós, não há nada de mal. Há alguns que o fazem bem, como Bublik ou Kyrgios, e frente a esse tipo de jogadores temos que estar preparados para fazer um sprint quando respondemos ao serviço”, explicou Thiem.

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