A quinta vida dos Tool nasce de um regresso ao passado

Os californianos regressaram a Portugal 13 anos depois para levantarem a ponta do véu do aguardado novo álbum a ser editado em Agosto, numa arena com lotação esgotada.

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Os Tool em 2017, concerto Randall's Island. Em Lisboa, fotografias só foram permitidas no fi Taylor Hill / getty images

Maynard James Keenan fura com a voz uma melodia de guitarra que segundos antes Adam Jones tinha atirado para ser amparada pelos pratos da bateria de Danny Carey e pelo baixo aveludado de Justin Chancellor. A música vai crescendo ao longo de cinco minutos numa síncope crónica de riffs em loop, num mantra pegajoso e sedutor que se entranha pela insistência. O vocalista vai aguentando a cadência e dando força ao ambiente hipnotizante até que, de repente, esta amálgama de sensações rebenta num ritmo sincopado a dar espaço à fúria, numa espécie de catarse colectiva.

Esta libertação de tensão chama-se Descending e faz parte do álbum ainda por sair de uma das maiores bandas de culto da década de 90 do século passado. Quase 13 anos depois os Tool voltaram a Lisboa, ao Altice Arena, ao mesmo sítio onde actuaram em Novembro de 2006, na altura com outra designação, mas igualmente com lotação esgotada. Antes disso já tinham passado por Portugal mais duas vezes.

Este foi um dos dois temas que os californianos avançaram do próximo trabalho, o quinto, mais do que aguardado pelos fãs — é o primeiro desta década, 13 anos depois de terem editado 10,000 Days. A outra música que adiantaram foi Invincible, mais curta e mais directa do que o épico de quase 14 minutos tocado anteriormente.

Percebe-se com esta antevisão que as duas vêm carimbadas com o selo Tool. Mas ainda é difícil antecipar como funcionarão no conjunto dos temas que farão parte do disco, ainda sem nome, com data de edição marcada para 30 de Agosto. Isolados funcionam como uma espécie de retrospectiva dos quase trinta anos de carreira da banda. Ao contrário dos trabalhos anteriores, todos eles com uma identidade bem definida, ainda não se percebe qual é a direcção desta quinta vida dos Tool.

Antes de partirem para esta nova fase, a banda já tinha vivido quatro vidas diferentes. A dois meses do novo lançamento, por opção sem mais temas para avançar, não havia outra forma senão seguir a via da regressão a outros estados temporais da existência do colectivo.

Os Tool são lentos a compor. Em quase trinta anos editaram apenas quatro álbuns. Foi ao que os catapultou para fora do anonimato que recorreram para abrir o concerto, com Ænima, que dá nome ao disco de 1996. Resolvida a tensão pelo regresso tardio da banda à estrada, seguiram numa viagem com paragem obrigatória pelos pontos icónicos da sua carreira.

Com Maynard durante toda a actuação escondido na penumbra, entre o som inconfundível da guitarra de Adam e o tempo milimetricamente preciso de Danny, que divide a secção rítmica com a criatividade de Justin, ao longo de quase duas horas, passaram por Intolerance, de Undertow (1993), Schism, Parabola, Parabol, de Lateralus (2001), Stinkfist, Forty Six & 2, de Ænima, e Vicarious, Jambi, The Pot, de 10,000 Days (2006), ao mesmo tempo que eram projectadas no palco imagens alusivas aos vários momentos da banda.

Tudo isto feito em plena comunhão com os fãs rendidos aos temas servidos em catadupa, espaçados pelas parcas palavras do frontman. A única coisa que queriam ouvir de Maynard não seria seguramente as juras de amor eterno pelos seguidores do sítio onde tocavam. Os Tool também não se prestam a esse papel. Pedido a que o público acedeu escrupulosamente foi ao que foi feito antes do concerto ter início. Pedia-se que não se filmasse ou fotografasse o concerto. Até quase acabar não havia telemóveis no ar. Esta atitude seria recompensada mais tarde.

Um dos altos da actuação foi quando, antes de entraram numa pausa para um regresso ao palco, tocaram a majestosa Forty Six & 2, a beneficiarem do melhor momento das condições sonoras, que no início da actuação ainda não estavam no ponto.

No regresso, depois do delírio instrumental de sintetizadores e bateria e de Vicarious, Maynard decidiu oferecer um brinde ao público que estava em Lisboa para assistir ao último concerto da digressão europeia. O público merecia ser recompensado pelo respeito que teve pela banda. O vocalista abre a excepção de permitir aos que o quisessem fazer de filmar ou fotografar o último tema.

Não podia tê-lo feito no melhor momento para os fãs que os seguem desde a década em que se formaram — encerraram com Stinkfist, antes de saírem de palco sem desfazerem a dúvida de quanto tempo mais terá o público português de esperar por um regresso.

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