Preciso muitas vezes de legendas para entender Rui Rio

O gesto é desconcertante. Rui Rio é desconcertante. Faz política à sua maneira o que, às vezes, gera verdadeiros erros de percepção dentro e fora do próprio partido.

As escolhas dos candidatos a deputados originam sempre momentos tão excitantes e intensos como conflituosos e beligerantes nos partidos. Dois líderes diferentes nunca fariam escolhas iguais, razão pela qual quando há uma mudança na liderança ela se reflecte necessariamente nas listas e nos deputados. Talvez por saberem isso, muitos parlamentares foram-se antecipando e anunciando que pretendem deixar os lugares ocupados nos últimos anos. Isso notou-se sobretudo no PSD.

E com as primeiras escolhas anunciadas por Rui Rio, é de lhes dar razão. Ao apresentar os cabeças de lista a Lisboa, Porto, Braga, Aveiro, Coimbra e Leiria, o líder do PSD mostrou que vai privilegiar a renovação em vez da continuidade, o potencial em vez da experiência. Não quer dizer que não venham a ser escolhidos políticos de outros tempos para regressarem ao Parlamento, mas a mensagem foi clara: primeiro a renovação.

Encontrar caras novas, às vezes da sociedade civil, que não comprometam o futuro é um desejo transversal a todos os partidos e não tem nada de inédito ou de criticável. O que já não é habitual é o líder do maior partido da oposição abdicar do lugar de cabeça de lista num círculo eleitoral e colocar um jovem quase desconhecido nesse lugar.

O gesto é desconcertante. Rui Rio é desconcertante. Faz política à sua maneira o que, às vezes, gera verdadeiros erros de percepção dentro e fora do próprio partido. E como Rio gosta pouco de dar explicações, cada um fica com a sua interpretação dos actos e dos factos. Eu não tenho vergonha de assumir que preciso muitas vezes de legendas para entender o seu estilo de liderança, incluindo o sentido da sua caminhada.

Neste caso, por exemplo, a decisão pode até significar que o líder tem desapego em relação aos cargos e que tanto lhe faz ir em número um como em número dois porque em nada muda o seu comprometimento com o partido e com os resultados. Provavelmente, é essa a mensagem que Rui Rio quer passar ao eleitorado: “Eu sou a cara do PSD e os votos que trago não dependem do lugar que ocupo na lista, prefiro fazer diferente e dar o lugar a outros”.

Mas a verdade é que, perante este aparente desapego (ou desinteresse), também é possível pensar que o PSD não está a olhar para a disputa como uma corrida ao lugar de primeiro-ministro... basta ser número dois.

Politicamente, passar para segundo plano ajuda Rui Rio a proteger-se do desgaste ou a desgastar-se ainda mais? As eleições legislativas, quando se escolhe o primeiro-ministro, são o melhor timing para dar uma oportunidade a outros? Se este não é o momento para Rui Rio brilhar e ocupar o palco, qual será? O que se segue? Quem vai estar nos cartazes do PSD no Porto? E em Lisboa? E apesar de tudo... o que importa a posição da lista em que se vai, desde que a eleição esteja garantida?

Acredito que Rui Rio se divirta com estas dúvidas e lhes responda com uma ideia que tem repetido desde que se tornou líder: “Quantas críticas não houve já de que eu era frouxo e só queria ser vice-primeiro ministro quando apelava ao diálogo entre os partidos todos? Temos é de resolver os problemas que afligem as pessoas.” 

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