Irão ultrapassou limite de urânio enriquecido previsto no acordo nuclear

Teerão anunciou incumprimento de disposição fundamental do acordo nuclear de 2015 e agência atómica internacional confirmou-o. Países europeus pressionados a encontrar solução para a retirada dos EUA.

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Presidente Hassan Rouhani viabilizou suspensão da aplicação de partes do acordo nuclear EPA/IRANIAN PRESIDENCY OFFICE HANDOU

A agência de energia atómica iraniana cumpriu com o prometido e, duas semanas depois de lançar o aviso, anunciou esta segunda-feira ter excedido o limite de urânio enriquecido acumulado, imposto pelo acordo sobre o seu programa nuclear. A infracção foi confirmada pela Agência Internacional de Energia Atómica (IAEA, na sigla em inglês) e coloca ainda mais pressão sobre os países europeus que, após a retirada dos Estados Unidos do acordo, tentam encontrar uma solução para evitar que o Irão impulsione a sua actividade nuclear, ao ponto de poder fabricar uma arma, e contribua para o aumento dos níveis de tensão na região.

“O director-geral da IAEA, Yukiya Amano, informou o Conselho de Governadores de que a agência comprovou que, no dia 1 de Julho, o total de urânio enriquecido acumulado pelo Irão excedeu os 300 quilos”, confirmou um porta-voz da IAEA à BBC, pouco depois de o ministro dos Negócios Estrangeiros iraniano, Mohammad Javad Zarif, ter anunciado a informação.

“Temos vindo a dizer, de forma bastante transparente, o que vamos fazer. Julgamos que [esta decisão] faz parte dos nossos direitos, segundo o acordo”, dissera, por sua vez, Zarif, à agência noticiosa iraniana ISNA. 

No dia 17 do mês passado, a Organização de Energia Atómica do Irão já tinha garantido que iria aumentar “drasticamente” o enriquecimento de urânio “de acordo com as necessidades do país”, já a partir do dia 7, caso os parceiros europeus não apresentassem propostas “concretas” e “exequíveis”. E esta segunda-feira, Zarif anunciou que o Irão vai começar a enriquecer urânio “acima dos 3,67%”, findo esse prazo.

A percentagem referida corresponde ao limite entendido pelos especialistas para a produção de energia nuclear para utilização civil. O enriquecimento acima dos 3,67% pode, em teoria, abrir caminho para a elaboração de armamento nuclear – possibilidade que o Irão garante não constar nos seus planos.

Assinado em 2015 pelo grupo 5+1 (EUA, Reino Unido, França, China e Rússia, mais Alemanha) e a União Europeia, o acordo nuclear estabelecia um compromisso, segundo o qual Teerão limitava a sua produção nuclear, em troca do levantamento das sanções económicas internacionais.

Em 2018, porém, a Administração Trump decidiu rasgar unilateralmente o acordo, por entender que a República Islâmica não tinha prescindido totalmente dos planos de desenvolvimento de armas de destruição maciça. Washington anunciou a reposição de sanções económicas ao Irão, que estão a afectar particularmente os sectores petrolífero e da banca e a prejudicar a actividade das empresas estrangeiras no país.

A estratégia de Teerão tem sido, desde essa altura, forçar a UE a encontrar uma solução para salvar o acordo e proteger as suas empresas no Irão, apostando para isso na desvinculação gradual de algumas das suas disposições – a superação do limite de urânio enriquecido é, até ao momento, a violação mais drástica e mediática.

A reunião de sexta-feira, em Viena (Áustria), entre diplomatas de Irão, Reino Unido, China, França, Alemanha e Rússia, foi rotulada pelos iranianos como “a última oportunidade” para se resgatar o acordo nuclear. As propostas apresentadas não foram, ainda assim, do agrado de Teerão, que continua, no entanto, disponível para chegar a um compromisso.

Tudo isto se desenrola em plena guerra retórica entre Irão e EUA. A região do Golfo Pérsico transformou-se, nas últimas semanas, num autêntico barril de pólvora, depois de os norte-americanos terem imposto sanções ao líder supremo, o ayatollah Ali Khamenei, em resposta ao abatimento de um drone norte-americano pelo Irão, e já depois de Donald Trump ter mandado abortar, à última hora, um ataque em território iraniano

Antes disso, houve dois ataques a petroleiros no perto do Estreito de Ormuz, cujos autores não foram identificados. E o preço do barril do petróleo não pára de aumentar.

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