Investigado “buraco” de 2,6 milhões de euros nas contas do Autódromo do Estoril

Nas contas do Autódromo do Estoril de 2010 e 2011 contabilizavam-se subsídios da câmara e do Instituto do Desporto, mas verba nunca foi paga. MP suspeita de contas falseadas para possibilitar realização do Moto GP.

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NUNO FERREIRA SANTOS

A investigação do Ministério Público ao negócio que envolveu a realização da Moto GP 2012 no Autódromo do Estoril, e que pode ter lesado o Estado em cerca de seis milhões de euros, revelou que das contas de 2010 e 2011 desapareceram mais de 2,6 milhões de euros referentes a subsídios.

O PÚBLICO já tinha noticiado em Abril que o prejuízo para o Estado, que detém a 100% a empresa Circuito do Estoril através da Parpública, estava a ser investigado. Agora essa investigação, que decorre no Departamento de Investigação e Acção Penal de Sintra e começou em 2016, descobriu esse desfasamento de milhões nas contas.

Os investigadores querem agora saber porque é os 2,6 milhões foram inicialmente contabilizados, quem é que os contabilizou e se houve intenção de falsear as contas para possibilitar a realização do Moto GP de 2012.

Foi uma das testemunhas no processo ligadas à gestão financeira do CE que levantou a suspeita. Acrescentou ainda que o Moto GP 2012 nunca devia ter sido realizado porque a empresa já vinha com um buraco de três milhões de euros o que resultará de até 2012 as contas não reflectirem a realidade das movimentações financeiras.

Os subsídios da Câmara de Cascais e do Instituto de Desporto de Portugal (IDP), integrado desde Setembro de 2011 no Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ), foram contabilizados oficialmente e influenciaram as contas de 2010 e 2011.

Contas corrigidas

Mas a testemunha disse que nenhuma das entidades, apesar de existirem referências aos subsídios, pagou os montantes referidos. Ou pelo menos, essa entrada de dinheiro nunca ficou registada como efectiva. Uma vez descoberto o buraco em 2013, quando o Moto GP já tinha sido realizado, a CE corrigiu o relatório de contas do ano anterior.

No relatório de Contas de 2012, está escrito que foi feita a anulação de “subsídios a receber da Câmara Municipal de Cascais e do IDP contabilizados em 2010 pelo montante total de 1,204.500 euros integrado em capitais próprios na rubrica de resultados transitados”. E no que se refere a 2011, também no mesmo relatório está escrito que foi feita “a anulação da estimativa de subsídios a receber da Câmara Municipal de Cascais e do IDP pelo montante total de 1,397.437 euros.” Este ultimo valor seria para financiar o Moto GP de 2011. O que perfaz um total de 2,601.937 euros que afinal não entraram nos cofres da empresa.

Ao PÚBLICO fontes da autarquia e do IPDJ confirmaram que os subsídios ou patrocínios não foram concedidos.

Já fonte da CE referiu que “a Dorna é a empresa responsável pela organização das provas de Moto GP e pela obtenção dos respectivos patrocínios e que a organização do Moto GP em Portugal no Circuito do Estoril em 2011 contou com o apoio do Turismo de Portugal”.

Este caso está a ser investigado pelo Ministério Público desde 2016, depois da queixa de um particular, e em causa estarão os crimes de fraude e de evasão fiscal.

Neste ponto, está sob suspeita, como o PÚBLICO já noticiou, um “contrato de patrocínio” do Moto GP 2012, celebrado com a empresa Trajectória, da qual foi gerente Guido Piedade, um dos filhos de Domingos Piedade. Este último presidiu à CE até Outubro de 2012 e foi condenado, em Julho de 2017, tal como Isabel Brazão, ex-administradora da mesma empresa, a um ano de prisão, com pena suspensa, por abuso de poder.

Nesse processo estiveram em causa alegadas irregularidades na gestão da CE, entre Junho de 2007 e Janeiro de 2013, como a utilização de cartões de crédito da empresa ao longo de vários anos para pagamento de despesas pessoais.

No caso da organização do Moto GP 2012 - e que é o que está a ser investigado actualmente - a 14 de Março de 2012 a CE, presidida então por Domingos Piedade, celebrou um acordo com a Trajectória.

Mundial de Motociclismo

Esta empresa foi contratada para organizar a realização do Grande Prémio de Portugal de Moto GP, prova que integrava o campeonato Mundial de Motociclismo que decorreu entre os dias 3 e seis de Maio de 2012.

No âmbito do processo, os investigadores tentam perceber o que a empresa receberia em troca pela prestação deste serviço já que esse ponto não é claro no contrato e uma que vez a empresa tinha como objecto social a formação profissional.

Ficou acordado que a Trajectória deveria disponibilizar até 1,7 milhões de euros para pagamento de bens e serviços para a organização do evento.

Mas a partir daqui começou um enredo de situações que lança muitas duvidas sobre o negócio. A prova realizou-se e terá cumprido os padrões, mas a Trajectória nunca disponibilizou a verba.

A CE teve de assegurar todas as despesas inerentes à organização da prova, mais de 1,5 milhões de euros, tendo avançado com um processo em tribunal contra a empresa para reaver esta verba. Mas apesar do tribunal lhe dar razão a Trajectória entrou em insolvência e nada pagou.

A investigação segue o rasto do dinheiro porque além dos mais de 1,5 milhões de euros de despesas que a Trajectória nunca pagou, há suspeitas que esta empresa terá ficado também com a receita de bilheteira dos três dias do Moto GP 2012 que ultrapassou os 1,8 milhões de euros.

E acabou por ser a também a CE a pagar, em prestações, mais de 2,2 milhões de euros à Dorna que é a empresa que detém, a nível mundial, os direitos comercias dos Grandes Prémios de Motociclismo.

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