“Ainda há muito a pagar” aos privados pelo SIRESP, defende presidente do grupo de trabalho

Carlos Salema diz que Estado deve optar por usar infra-estruturas públicas: “Não digo que resolve todos os problemas, mas resolve muitos”. Técnicos aconselham Governo a abandonar rede satélite, a solução encontrada em 2018.

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Carlos Salema, à esquerda, foi o coordenador do grupo de trabalho Miguel Manso

Os técnicos do grupo de trabalho que analisou a rede de emergência nacional (o Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal) foram ao Parlamento defender junto dos deputados a opção por uma mudança completa da rede actual, passando esta a basear-se nas estruturas públicas da IP Telecom para se tornar menos dependente de privados e poder ser ajustável a novas tecnologias que apareçam.

“As recomendações [do grupo] aumentam os custos, mas também aumentam a segurança. Aumentam a capacidade da rede de transmissão e permite ir à fase seguinte sem ter de mexer na rede de transmissão”, disse o presidente do Instituto de Telecomunicações e da Academia das Ciências, que coordenou o estudo, no Parlamento numa audição a pedido do deputado do PCP, Jorge Machado.

Carlos Salema explicou a opção do grupo em propor um investimento na rede SIRESP que pode atingir os 25 milhões de euros, tal como o PÚBLICO noticiou esta quinta-feira. Os técnicos sugerem uma alteração da rede para fibra óptica enterrada e/ou feixes hertzianos, mas utilizando uma estrutura que já existe, da empresa pública IP Telecom, reduzindo a dependência de privados depois do fim do contrato de concessão, em Junho de 2021: “Ainda há muito a pagar” até ao fim, disse Salema. Só pela renda da transmissão, a factura é de 2,6 milhões de euros por ano.

“Nunca na minha vida ia propor enterrar cabos. Eu sei o suficiente de telecomunicações para saber que um cabo enterrado custa mais de dez vezes o valor do cabo. E portanto, a IP Telecom mostrou-nos qual era a rede deles. Resolve muitos problemas, mas não vou dizer que resolve todos”, explicou Carlos Salema.

Esta frase na audição, serve de resposta às críticas do presidente da Altice Portugal, Alexandre Fonseca, que esta quinta-feira criticou o relatório dizendo que este demonstra alguma “ignorância” e “profundo desconhecimento” sobre o custo de enterrar cabos. Disse Alexandre Fonseca que enterrar um quilómetro de cabo custa 25 mil euros.

Ora o grupo de trabalho responde dizendo que não propõe o enterramento da totalidade da rede, mas sim a utilização da infra-estrutura já existente da IP Telecom: “A IP Telecom tem 470 pontos de acesso devidamente posicionados em sítios interessantes. É altura de fazer o trabalho de casa e ver as estações-base [da rede SIRESP] e ver qual o ponto de acesso e mudar uma ou outra”, explicou Carlos Salema. “Foi a solução que nos apareceu”, disse.

Também Francisco Gomes, secretário-geral adjunto da Administração Interna, que tem como pasta a gestão do SIRESP, defendeu esta opção pela estrutura pública. “Enterrar quilómetros de fibra pode ser bastante caro”, começou por dizer, por isso há uma “vantagem” em usar as calhas da IP Telecom que já têm uma “infra-estrutura criada”. “A fibra pode ser conduzida nessas condutas rodoviárias e ferroviárias. Não será tudo aéreo. Em muito traçado ser protegido dessa forma”, disse.

Os técnicos propõem ainda ao Governo que abandone a solução que foi encontrada em 2018 para a rede de redundância, a rede satélite, por esta ter três problemas: “Só há um fornecedor com o satélite no sítio certo. Não há qualquer controlo sobre aquele fornecedor único”, disse Salema referindo-se à Altice. Depois, durante duas horas por ano, “não funciona por razões astronómicas” e uma terceira razão, que pesou bastante para a sugestão: o custo. Aquele sistema por satélite só permite até um total de 60 estações-base ao mesmo tempo; o SIRESP tem 471. Se fosse para todas “é assim um número...”. 

Esta recomendação, de abandonar a opção por satélite foi também noticiada pelo PÚBLICO. Esta quinta-feira, num comunicado citado pela Lusa, o Ministério da Administração Interna (MAI) explicou esta opção em 2018. “Era a única intervenção que podia ser feita em 2018 para ter uma solução no verão. Qualquer outra solução levaria mais de dois anos a instalar”.

Perante as sugestões dos técnicos, o MAI admite fazer o investimento que considerou “baixo”. “O trabalho visa preparar o período posterior a 2021 e representa um investimento baixo relativamente ao que foi realizado desde a criação do sistema”, lê-se. Uma decisão que é compreendida pelos deputados da esquerda à direita, que querem mais explicações sobre o negócio de compra da SIRESP, SA. Na audição, o deputado comunista disse mesmo que “é um crime de lesa pátria” que a rede não esteja no controlo efectivo do Estado e que “depois de tudo ainda injecte mais sete milhões de euros para uma rede que precisa de investimentos”.

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