Ford fecha seis fábricas e despede 12 mil trabalhadores na Europa

Indústria anunciou 38 mil despedimentos nos últimos seis meses. Europa corta nas projecções: vendas devem cair 1%, para 15 milhões de veículos em 2019.

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REUTERS/Kamil Krzaczynski

A Ford teve lucros de quase 3300 milhões de euros em 2018, mas accionistas e administração querem mais. Nem as poupanças de 750 milhões de dólares em impostos, graças à reforma fiscal promovida em 2017 pela Administração Trump, afastam as intenções de fechar fábricas e cortar postos de trabalho que o construtor norte-americano tem vindo a anunciar e a concretizar desde o início do ano. E a próxima vítima é o braço europeu da Ford, que verá seis fábricas encerradas e perderá 12 mil trabalhadores. São mais de 20% da força laboral de 51 mil trabalhadores do fabricante na Europa.

“Despedir empregados e fechar fábricas são as decisões mais difíceis que tomámos”, garante James Hackett, 63 anos, líder da Ford desde Maio de 2017, num comunicado publicado nesta quinta-feira pelo grupo, cujas acções subiram na bolsa norte-americana, depois do anúncio. “Reconhecendo o efeito dessas medidas nas famílias e nas comunidades, estamos a dar apoio para aliviar o impacto”, prossegue Hackett, sem revelar o que estão a fazer em concreto, mas especificando que vai vender uma fábrica de motores na Eslováquia, mandará encerrar três na Rússia, uma unidade de produção de transmissões em França e outra de motores no País de Gales.

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James Hackett assumiu o poder na Ford em Maio de 2017 Rebecca Cook/Reuters

Além disso, serão dispensados 2000 trabalhadores no sector administrativo (os “colarinhos brancos") na Europa, aos quais se somarão mais 5000 nos EUA. Outros 10.000 do chão de fábrica na Europa serão mandados para casa, incluindo despedimentos numa unidade na Alemanha (Saarlouis) e outra em Espanha (Valência).

Com esta redução de custos, o grupo quer melhorar a margem operacional, isto é, o retorno das vendas, que ficou em 2% no final de 2018. É uma das mais baixas da indústria e fica muito longe dos 9,59% de margem operacional que a Ford teve no final de 2015.

O objectivo do plano de Hackett, aceite pelos accionistas que apoiam a dolorosa “reestruturação” da Ford, é melhorar esta margem para os 6% com estas poupanças. Só com as vendas, será praticamente impossível à Ford chegar a essa meta até porque o mercado europeu está definitivamente na mó de baixo. A própria ACEA, associação dos construtores na Europa, alterou nesta quinta-feira as previsões para o mercado em 2019. Em vez de um crescimento de 1%, antevê uma quebra de 1%, para vendas de 15 milhões de carros.

Não são notícias positivas para a indústria. Mas na bolsa norte-americana, as acções da Ford seguem esta tarde a subir 2,42%, depois do anúncio dos cortes. O grupo norte-americano fala num “redesenho” do modelo de negócio com apoio dos accionistas, entre os quais pontificam o fundo BlackRock e o Vanguard Group. Esse “redesenho” estender-se-á à China e à América Latina. 

Apesar do resultado positivo em 2018, os lucros do grupo caíram 50% nesse ano em que Hackett recebeu 17,7 milhões de euros em salário – o salário mediano entre trabalhadores da Ford foi de 64 mil dólares.

Foram quatro as razões que conduziram à quebra no resultado líquido: subida de preços na matéria-prima (aumento de 1800 milhões de dólares, com as taxas aduaneiras de Trump sobre o alumínio a custarem 750 milhões de dólares à Ford); taxas de câmbio desfavoráveis (mais 750 milhões de dólares); recolha de veículos por defeitos em airbags (mais 775 milhões); e quebra nas vendas na China na ordem dos 54%.

A Ford Europa manterá 18 das actuais 24 fábricas e, em termos de organização, será separada em três divisões – veículos comerciais, produção europeia e importados.

Os EUA representam 60% das vendas do grupo, que já dispensou 2300 trabalhadores, a maioria por saídas negociadas, em solo norte-americano. Os despedimentos na Europa começam a 1 de Julho. A empresa quer saídas por mútuo acordo e o processo terminado no final de 2020. Ao todo, a Ford estima poupar 600 milhões de dólares por ano. A factura desta reestruturação, suportada num plano plurianual, pode ascender aos 11 mil milhões de dólares. Um quarto destes custos será registado nas contas de 2019, razão pela qual os resultados do primeiro trimestre foram de 1150 milhões de dólares, uma quebra de 34% nos lucros, em termos homólogos.

Outro construtor norte-americano, a General Motors, alienou activos na Europa, com a venda da Opel e da Vauxhall à francesa Peugeot. Nos últimos seis meses, o sector automóvel tinha anunciado o despedimento de 38 mil pessoas em todo o mundo. Em 2018, os 15 maiores fabricantes tiveram lucros de 75 mil milhões de euros.

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