O Governo do Engano (também) na Educação

Na Educação, ao fim de quatro anos de legislatura, o que é factual é que o investimento é insignificante, que as condições nas escolas estão degradadas e que existem profundas contradições entre o discurso e a realidade.

Sabemo-lo e olhamos para a situação com a resignação de quem reconhece tratar-se de uma inevitabilidade... “está-lhe no sangue”. Habituámo-nos a ver o primeiro-ministro defender os resultados nas finanças públicas “graças ao fim da austeridade”, ao mesmo tempo que o seu ministro das Finanças tranquiliza o Financial Times dizendo que não houve uma dramática viragem da austeridade. Sabemos hoje que as narrativas de propaganda política do Governo coexistem num Portugal, em 2018, com a maior queda da Europa nos rankings de competitividade; com a maior carga fiscal dos últimos 24 anos; com um dos piores crescimentos económicos da União Europeia e com níveis de investimento público inferiores a 2015. Poderíamos voltar a falar do “caso dos professores”, em que a realidade foi, como a UTAO pode confirmar, distorcida até à última consequência da grande ameaça de demissão, de forma a condicionar a liberdade de ação do Parlamento. Essa é uma história que só um Governo sério poderá vir a provar: a de como uma justa recuperação do tempo de serviço, sendo possível, pode ser uma peça relevante nas necessárias reformas da Educação.

Sabemo-lo, o Governo continua a enganar (quase) todos na Educação. Há poucos dias, o chefe de Governo foi inaugurar uma escola requalificada em Arcos de Valdevez: 4,1M€ de investimento; promessas para o futuro e, cereja no topo do bolo, um “tributo aos professores”. Podemos gostar de o ouvir, mas não esqueçamos que estamos a ser enganados: 2,7M€ foram-nos dados pela Europa (a Europa das eleições nas quais muitos não votamos) e 1,2M€ foi investimento do município. O Governo contribuiu para a requalificação com uns quase insultuosos 0,2M€. Estes momentos de campanha não podem fazer-nos esquecer do fundamental: os números do investimento na Educação estão ao nível zero (0,3%), tendo em conta o orçamento do ministério (6000M€). No total, são pouco mais de 20M€, que mal dariam para cobrir o custo médio de uma única intervenção da Parque Escolar. Menos 80% do que o investimento realizado em 2015!

Na Educação, ao fim de quatro anos de legislatura, o que é factual é que o investimento é insignificante, que as condições nas escolas estão degradadas e que existem profundas contradições entre o discurso e a realidade, como a contradição chocante entre o discurso de tributo e a prática de desprezo pelos agentes da educação (alunos, famílias, assistentes técnicos, técnicos educativos, professores, inspetores, etc.).

O sistema está enfraquecido num contexto de enormes desafios, não só societais, mas também demográficos. Na última década o sistema perdeu 175.000 alunos, um número que se espera superior nos próximos dez anos. Os dados referentes aos alunos matriculados no ano letivo 2017/18 confirmam esta tendência. Igualmente preocupante é a contradição entre o discurso (repetido até à exaustão) do Governo na suposta defesa da escola pública e a real escolha das famílias. É um facto indesmentível: pela primeira vez nos últimos anos a escola privada ganhou alunos à escola pública, curiosamente à entrada e à saída da escolaridade obrigatória, ou seja, no 1.º ciclo do ensino básico e no secundário. E isto acontece apesar do encerramento de várias escolas de referência, em particular em territórios de baixa densidade, que, tendo visto os seus contratos (válidos até 2019) desrespeitados pelo Governo no início da legislatura e apesar de todos os esforços, não conseguiram evitar o encerramento. Foi disso mais um terrível exemplo, na passada semana, o CAIC, em Cernache, um marco com 65 anos de exemplo na formação humana integral na região. Se é claro o impacto da natalidade na diminuição global de alunos, os dados mais recentes indicam um novo elemento preocupante: o abandono da escola pública está a ser acompanhado pelo aumento dos alunos nas escolas privadas. A Educação Pública na realidade está em falência.

Do lado dos professores, o cenário não é melhor. Na escola pública, os professores são uma classe profissional envelhecida. Os que conseguem entrar para os quadros têm, em média, 50 anos de idade, alguns quase na idade da reforma. Por sua vez, o número de candidatos para dar aulas tem vindo a diminuir – menos 4000 do que em 2018. A situação é preocupante, uma vez que precisamos dos melhores professores para, em diferenciação pedagógica, estimular cada uma das nossas crianças e jovens a serem cidadãos preparados para o futuro!

Ninguém terá dúvidas do papel da Educação Pública como alicerce de um futuro socialmente justo em Portugal. Sabemos que os recursos públicos são limitados e exige-se uma melhor aplicação dos recursos com que os Portugueses contribuem. Há urgência nas escolhas certas! Naturalmente que estas não passam por cortar o investimento nas escolas, numa legislatura de crescimento económico, ou por fugir dos problemas e das negociações. Também não passam por obras de última hora, ou por falsos tributos de circunstância. As escolhas certas pressupõem governos que falem verdade, que respeitem os órgãos de soberania eleitos, que respeitem o esforço dos contribuintes e que saibam, em concertação social, construir compromissos. A urgência das escolhas certas requer uma visão para o país do futuro que valorize a Educação e a Escola pública, requer o respeito pelo país do presente, assente na transparência e no compromisso e requer coragem para governar de facto, com equilíbrio e sustentabilidade. Infelizmente nenhuma destas três condições parece estar presente na ação deste Governo do Engano (também) na Educação.

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico 

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