Arrogância napoleónica, totalitarismos e amuos

1. É um verão quente este que hoje começa. Não na temperatura propriamente dita (a máxima é apenas de 21 graus no Porto), mas no combate político. E curiosamente a troca mais azeda de palavras não é entre campos diametralmente opostos mas entre parceiros ou mesmo família.

Vejamos primeiro a família. O PSD está em revolta por causa dos critérios para a escolha de candidatos a deputados. Rio pediu “lealdade” e os mais críticos da direcção não gostaram. Paula Teixeira da Cruz veio falar de “partidos totalitários”, Teresa Morais acusou Rio de apenas querer rodear-se de “acólitos subservientes”.

Entre parceiros, o clima também aqueceu. O BE, furioso com o PS, acusa mesmo António Costa de ser arrogante. Sem meias medidas, o ex-líder do partido e um dos seus fundadores, Francisco Louçã, ao analisar o comportamento do primeiro-ministro ao longo do folhetim da lei de bases da Saúde, conclui que Costa não tem querido verdadeiramente negociar. “Há neste modo napoleónico uma arrogância que é um preocupante sinal para o futuro imediato”, escreveu esta semana no Expresso. (Não foi só no debate quinzenal que transpareceu o aparente mal-estar dos bloquistas).

2. Enquanto isso, quando se olha para PSD e PS o que salta à vista? Elogios ao Governo por causa da nacionalização do SIRESP? Claro. Apoio ao Governo na redução de taxas moderadoras? Sem dúvida. Abertura para negociar lei de bases da Saúde com o PS? Seja. Viabilização do cadastro florestal do Governo? Tudo no bom caminho. Foi assim a última semana de Rui Rio. Valeu-lhe críticas por parte do seu próprio partido (Marco António Costa contestou em entrevista ao PÚBLICO/Renascença o facto de o PSD estar a ajudar Costa a libertar-se do BE e do PCP sem perceber que isso é o que o PS pretende para tentar alcançar a maioria absoluta), mas o presidente do PSD não se desvia do caminho traçado e mesmo com curiosos argumentos para o defender.

“Se eu agora amuasse porque o PS falou primeiro com PCP e BE, eu não estava a servir os portugueses em rigorosamente nada”, explicou num encontro com jornalistas especificamente para comentar o bom clima de conversações com o PS a propósito da lei de bases da Saúde. “É uma postura de colaboração e não uma postura de fazer combate político em torno de seja do que for. Da nossa parte, tudo vamos fazer seguramente pelo interesse público e não para olhar para a eleição de amanhã. A eleição de amanhã não resolve nada às pessoas”, disse em Castanheira de Pêra. Perdão, as eleições não ajudam a resolver a vida das pessoas?

3. O que se está a passar com as urgências de obstetrícia em Lisboa é assustador. Como é possível que se tenha chegado ao ponto de ruptura que é o de encerrar urgências por falta de profissionais?
De que vale então discutir-se com entusiasmo na Assembleia da República as PPP quando as utentes do SNS vão ter que ir consultar quais as urgências que estão abertas como se tratasse de apenas mais uma farmácia? De que vale então os governos virem brandir a promessa de aumento de funcionários públicos como o actual primeiro-ministro fez em Fevereiro e de novo este mês quando admitiu que “talvez para o ano possamos retomar a normalidade” nos aumentos na função pública? 

Seria mais urgente o ministro da Saúde, perdão, Mário Centeno passar uns dias no gabinete da avenida João Crisóstomo, sede do ministério da Saúde, ou não?


 

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