Quem olha para os trabalhadores do sector privado?

O Estado deve dar o exemplo protegendo os seus trabalhadores. Mas deve fazê-lo com uma preocupação de equilíbrio orçamental e de equidade

Depois de uma legislatura concentrada em repor as perdas salariais e recuperar as progressões nas carreiras da função pública, há sinais de que o muro que separa os funcionários do Estado dos que trabalham nas empresas privadas começa a ser demolido. O Presidente da República deu um importante contributo para esse esforço que visa “evitar uma divisão no sector do trabalho em Portugal” ao pedir ao Governo que estude a possibilidade dos pais com empregos nas empresas privadas poderem acompanhar os filhos no seu primeiro dia de aulas, tal como foi prometido aos funcionários públicos. E o CDS continuou-o ao defender que as despesas com seguros de saúde dos privados beneficiem do mesmo regime fiscal aplicado aos descontos dos funcionários públicos para a ADSE.

A discussão entre a diferença de condições ou regalias entre trabalhadores públicos e privados é em geral contaminada por preconceitos de classe que conduzem muitas vezes ao maniqueísmo. Gerir as condições de equidade entre uns e outros é uma obrigação para a esvaziar e permitir que todos os trabalhadores se sintam parte de um mesmo país. Durante os anos de chumbo da troika, trabalhadores do sector público foram obrigados a cortes de salários e à perda de direitos. O actual Governo empenhou-se, e bem, em restaurar os salários e a repor direitos dos funcionários públicos, mas fê-lo, e mal, não gerando políticas que abrangessem com o mesmo ânimo os outros trabalhadores. Está, pois, na hora de olhar para todos como cidadãos em plena igualdade de direitos e de oportunidades.

Seguir esta via não implica que algumas das vantagens comparativas das carreiras da função pública sejam niveladas por baixo. O Estado deve dar o exemplo protegendo os seus trabalhadores. Mas deve fazê-lo com uma preocupação de equilíbrio orçamental e de equidade. Se a primeira condição tem sido garantida pela determinação de Mário Centeno, a segunda nem tanto. Só isso explica a iniciativa do Governo em conferir um direito aos pais que trabalham para o Estado sem o alargar a todos. Só isso justifica que uns e outros continuem a ter tratamento diferenciado em matérias fiscais associadas a serviços privados de Saúde.

A melhor forma de evitar a demagogia e o facilitismo com que tantas vezes se discute o suposto conflito de interesses e de oposição entre sector público e privado é governando para todos. O apelos do Presidente e a iniciativa do CDS não bastam, mas vão felizmente nesse sentido.

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