Jerónimo só fala de soluções de governação depois das eleições e promete não ser uma “força pela negativa”

Comunistas definem “eixos essenciais” para a campanha eleitoral, na qual mantêm a reversão de privatizações, mas não constam as questões europeias. Jerónimo não tem a “visão de impedir por impedir a maioria absoluta do PS” e avisa que a submissão do PS aos objectivos do défice torna difícil um novo acordo escrito.

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Jerónimo de Sousa LUSA/TIAGO PETINGA

“Ao pé do pano é que se talha a obra.” Jerónimo de Sousa não podia arranjar melhor ditado para contornar perguntas incómodas, feitas durante a apresentação das linhas essenciais do programa com que o PCP se apresentará às legislativas, sobre o dia seguinte às eleições de 6 de Outubro deste ano. Está o PCP disponível para voltar a viabilizar um Governo socialista se os resultados eleitorais forem como em 2015? O secretário-geral responde com o dito popular, mas avisa ser preciso, “primeiro, ver a arrumação de forças que se verificará” e também o que os socialistas se propõem fazer.

“Veremos o que acontecerá a 6 de Outubro”, promete Jerónimo de Sousa. “Não vamos agir nesta batalha eleitoral a pensar em soluções governativas”, garante o líder comunista, que recusa também “leituras mecânicas” entre os resultados das eleições autárquicas, europeias e legislativas. “Muitos falharam ao falar no declínio irreversível do PCP e até pior, uma voz cangalheira a falar do fim do PCP. Isso não vai acontecer; aqui está o PCP confiante por aquilo que realizou, propôs, conseguiu de avanços.”

O líder do PCP insiste na ideia de que nestes três anos e meio “se deram passos importantes adiante, particularmente na reposição de rendimentos e direitos” e que o que é preciso é “aprofundar este processo de justiça social”. “Como diz o povo, é ao pé do pano que se talha a obra. Nós apresentamo-nos aos eleitores com o nosso programa; os outros farão o mesmo. E é neste quadro que deixamos a garantia: se é para andar para trás, não contem com o PCP; se é para avançar e conseguir melhores condições de vida, contarão com o PCP.”

Na lista dos eixos centrais do programa eleitoral da CDU para as legislativas de Outubro que Jerónimo de Sousa apresentou está, por exemplo, a valorização salarial – considerada uma “emergência nacional” -, uma política fiscal mais justa; a prioridade ao investimento público; o financiamento dos serviços públicos e das funções sociais do Estado como a saúde, educação e a protecção social; a recuperação pública de sectores estratégicos; a regionalização; a reforma da justiça e o combate à corrupção. São linhas essenciais para uma “política alternativa” cuja base é “fundamentalmente o Estado”.

Ao apresentar estas linhas essenciais do programa – que será divulgado detalhadamente daqui a um mês -, Jerónimo de Sousa fez questão de vincar que se está a “dirigir aos portugueses e não a uma futura solução de Governo”. E também de acrescentar que o programa “patriótico e de esquerda” do PCP é “insubstituível” por qualquer outra política – ou seja, Jerónimo deixa no ar que, para dar apoio aos socialistas, boa parte das propostas do PCP terão de constar em algum lado de um futuro acordo ou programa.

Dificuldade objectiva

Porém, no caso de repetição da chamada “geringonça”, Jerónimo de Sousa já não parece ver espaço para uma reedição de um acordo escrito. “Eu vejo uma dificuldade objectiva”, responde quando inquirido pelo PÚBLICO, citando os “seguidismos” das políticas europeias que ditam os “amarramentos e constrangimentos que o PS tem vindo a aceitar”, como a “redução do défice a mata-cavalos”. Em 2015, os partidos verteram nas posições políticas conjuntas aquilo em que se conseguiam entender e deixaram de fora tudo o resto. Tanto as posições inconciliáveis sobre a Europa, como questões que depois acabaram por acordar, como os aumentos extraordinários das reformas.

Mas as dúvidas são mesmo para deixar no ar. Se quando é questionado sobre um futuro apoio ou participação num Governo do PS Jerónimo costuma responder “um governo para fazer o quê? Para aplicar que políticas?”, agora é a vez de o líder comunista se esquivar em matérias fundamentais. Questionado sobre se os partidos devem revelar, no seu programa eleitoral, se estão disponíveis para eventuais alianças, Jerónimo de Sousa comentou que “alguns pensam no poder pelo poder”, mas que o PCP será poder “quando o povo assim o entender”. “A nossa resposta está contida nos eixos centrais do nosso programa e determinam o nosso posicionamento. (…) É preciso que cada um assuma uma política alternativa em que os portugueses possam decidir o seu voto.”

E na campanha eleitoral vai ter como principal objectivo impedir uma maioria absoluta do PS? Jerónimo de Sousa andou às voltas até chegar a duas frases: “Não somos uma força pela negativa. Não temos a visão de impedir por impedir a maioria do PS. O que pretendemos é o nosso reforço, com a consciência que, se o PS tivesse as mãos livres, (…) não teria sido possível colocar na lei alguns direitos.” Mas antes, haveria de vincar que o objectivo do PCP é “reforçar a CDU” e pensar na eleição de deputados para concretizar “um programa ambicioso”.

Cabeças de lista

A propósito de deputados, a CDU apresentou mais cinco candidatos que serão cabeças de lista nos distritos de Évora (João Oliveira), Beja (João Dias), Coimbra (Manuel Pires da Rocha) e Castelo Branco (Ana Leitão) e na região autónoma da Madeira (Herlanda Amado).

Há uma semana, a coligação havia divulgado mais cinco candidatos: Jerónimo de Sousa (Lisboa), Francisco Lopes (Setúbal), Carla Cruz (Braga), Miguel Viegas (Aveiro) e Rita Rato (círculo da Europa).

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