Algarve, uma região tropical, ameaçada por falta de água e fogos florestais

Cientistas alertam: sobe o nível médio do mar, a água escasseia e novas doenças vão aparecer. “O vetor da Malária e da Febre do Nilo Ocidental já foi identificado em vários municípios algarvios.”

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Mario Lopes Pereira

O aumento médio das temperaturas, conjugadas com a diminuição da precipitação atira o Algarve para um clima cada vez mais tropical. A estes dois factores, dizem os cientistas, juntam-se os fogos florestais, e na subida do nível médio do mar que será de um metro no final do século, podendo atingir os 2,5 metros. No final do século – prevê o Plano Intermunicipal de Adaptação às Alterações Climáticas (PIAAC), apresentado ontem na Universidade do Algarve (Ualg) — haverá uma época de incêndios mais intensa e duradoura. O número de meses de alto risco sobe de três para seis meses.

O estudo, desenvolvido por três instituições universitárias, tem por objectivo fornecer instrumentos de trabalho aos municípios para que adoptem medidas cautelares e promovam a sensibilização das pessoas para as alterações climáticas que já se fazem sentir. O coordenador do PIAAC, Luís Dias, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, destacou: “O que mais nos surpreendeu foi, de facto, os recursos hídricos. Não estávamos à espera que houvesse uma descida tão acentuada”.

A este propósito, enfatizou, a redução da recarga dos aquíferos, associada à diminuição da precipitação, “possibilita a intrusão de água salobra marinha, que pode implicar a contaminação dos aquíferos costeiros”. Uma das situações críticas localiza-se na zona de S. João da Venda - Quelfes e Campina de Faro, “devido à combinação entre a elevada ocupação por culturas irrigadas e a disponibilidade hídrica”. Por isso, Luís Dias defendeu a necessidade de serem tomadas acções, no curto e médio prazo, para a reutilização das águas residuais.

Por outro lado, não deixou ainda de chamar a atenção para a necessidade de construção de uma nova barragem e equacionou a possibilidade de vir a ser implementada uma central de dessalinização, no médio prazo. “A partir de 2080 vai ser inevitável”, adiantou. Os recursos hídricos, sublinhou, “têm tendência para diminuir até final do século”.

Ao nível da biodiversidade, o estudo desenvolvido por uma equipa multidisciplinar da Universidade de Lisboa, Ualg e Instituto de Ciências Sociais (ICS) analisou 19 diferentes habitats, representativos da região, tendo concluído que 53 por cento “tem tendência a diminuir a sua área óptima para estarem presentes no Algarve”.

A zona do nordeste algarvio (concelhos de Castro Marim, Alcoutim) surge como a mais vulnerável, devido à aridez do solo e as altas temperaturas a que está sujeita. Enquanto na serra de Monchique se registam valores de precipitação que rondam 1500 mmm/ ano, no nordeste a percentagem reduz-se a um terço, 500 mm/ano. De resto, Alcoutim é, também, o concelho mais fustigado pela mortalidade no segmento da população idosa.

A média dos idosos algarvios que acabam por falecer devido às ondas de calor é de 2%, mas “poderá ter um acréscimo de mais 7% do que se verifica actualmente, em Alcoutim”. Outro dos sinais da tropicalização do clima, — destacado neste plano encomendado pelo Comunidade Intermunicipal do Algarve (Amal) — diz respeito às doenças. O vector da malária e da Febre do Nilo Ocidental, sublinha o documento, “já foi identificado em vários municípios algarvios, mas os casos da infecção humana têm sido pouco frequentes”. Embora o vírus Zika ou a Febre do Nilo Ocidental “não constituam risco de vida, causam graves problemas de saúde”.

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