Morreu o filósofo francês Michel Serres

Professor, escritor, historiador das ciências e da arte desaparece aos 88 anos. Era um ecologista optimista.

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Michel Serres DR

O filósofo francês Michel Serres, uma das figuras mais conhecidas e respeitadas do meio intelectual do seu país, morreu no passado sábado, aos 88 anos. “Morreu pacificamente, às sete horas da tarde, rodeado pela família”, disse à AFP fonte da sua casa editora em França, Le Pommier.

Michel Serres publicou oito dezenas de livros e ensaios ao longo de uma carreira também longa, em que ajudou a enquadrar filosoficamente temas que hoje, mais do que nunca, estão na ordem do dia, como a ecologia e a educação. “Michel Serres é um desses filósofos que nos ofereceram um pensamento ecologista”, disse ao jornal Libération o ex-deputado europeu pelo partido ecologista francês Alain Lipietz, referindo-se à importância que o pensamento e a obra do autor de Le Contrat Naturel teve no caucionamento das questões que a partir dos anos 70 foram sendo levantadas neste domínio pelas ciências.

Optimismo, marca de vida

Professor, escritor, historiador das ciências e membro da Academia Francesa desde 1990, Michel Serres “era a figura do intelectual apreciado pelo grande público, com as suas reflexões marcadas pelo optimismo sobre temas como a educação e a ecologia”, escreve o jornal Le Figaro. No seu livro mais recente, publicado em França no passado mês de Fevereiro, Morales Espiègles (traduzível por Morais Travessas), avança esta definição de cultura: “É aquilo que permite ao homem culto não esmagar ninguém sob o peso da sua cultura”.

O optimismo era, de resto, uma das marcas da vida e do pensamento de alguém que sempre se interessou pelas mais diversas formas do saber, da ciência – a sua formação começou pela matemática – à literatura, da educação à política, da ecologia à banda desenhada. Tanto escreveu sobre epistemologia das ciências como sobre os contos de Hans Christian Andersen (A Polegarzinha, por exemplo, que utiliza no seu livro Petite Poucette, publicado em 2012, para escrever sobre as novas tecnologias digitais), os romances de Júlio Verne ou o Tintin de Hergé. “Viajante incansável do pensamento, Michel Serres previu, antes dos outros, as grandes revoluções do nosso tempo”, assim o define a editora Le Pommier, onde o filósofo publicou nas duas últimas décadas.

Da dezena de livros e textos traduzidos em Portugal, contam-se, por exemplo, As Origens da Geometria (Terramar, 1997), Hominescência (Instituto Piaget, 2004), Ramos (Instituto Piaget, 2005), ou Antes É que Era Bom (Guerra e Paz, 2018).

Diálogo com Foucault

Michel Serres nasceu em Agen, cidade do sul de França, a 1 de Setembro de 1930, filho de um marinheiro. Aos 19 anos, entra para a Academia Naval, onde se licencia em Matemática, mas paralelamente estuda Filosofia, tendo feito a agregação em 1955, na Escola Normal Superior, em Paris.

No final da década de 60 publica o primeiro livro sobre o sistema filosófico e os modelos matemáticos em Leibniz, o filósofo alemão de quem se torna um especialista, e um devedor, como também acontece com Auguste Comte e Henri Bergson.

Nos anos 70, lecciona na Universidade de Vincennes, onde encontra Michel Foucault, com quem desenvolverá um diálogo fecundo, o mesmo acontecendo depois com uma figura eminente da sua geração, Claude Levi-Strauss. Foi também professor na Sorbonne e na universidade californiana de Stanford, Estados Unidos.

Apesar do seu universalismo e optimismo, Michel Serres via com preocupação a perda de influência da língua francesa no contexto mundial. “Há mais palavras inglesas nas paredes de Paris do que havia alemãs no tempo da Ocupação [nazi]”, disse uma vez, citado pelo jornal Le Figaro, numa altura em que lançou mesmo um apelo a uma “greve ao Inglês”.

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