Motivação educacional – há limites?

A motivação educacional depende de todos os intervenientes no processo educativo e ninguém se deve demitir desse papel – desistir jamais é solução. Famílias e escola devem e podem conjuntamente equacionar soluções para que as crianças e jovens atinjam um futuro o mais próximo possível do que desejam.

O processo educativo é um continuum diário que ocorre na maioria dos momentos pelo exemplo que se transmite ao educando. No meio deste trajeto educacional que dura a vida inteira, existe uma fase onde a escola desempenha um papel fundamental e marcante na vida do indivíduo. O tempo escolar é alargado no período diário e no tempo de vida, pelo que em fases de elevada influência no desenvolvimento da personalidade e educação a escola tem um papel de extrema importância. A educação que vem do berço (entenda-se aquela que a família atribui, da melhor forma que pode e sabe – não há manuais para a educação) deve iniciar-se e continuar na família e núcleo mais próximo da criança e jovem. São esses os valores que irá reter de forma mais marcante e usar pela vida fora cada vez que for confrontado com momentos bons e menos bons.

Ensinar e aprender é um processo dinâmico no qual o aluno recebe a informação transmitida pela escola no geral e pelo professor em particular. Mas atenção, o aluno também ensina o professor e a escola. O facto de ser mais novo não é impeditivo para ser um excelente mestre. A influência que cada um de nós tem na vida do outro é inimaginável. Pelo que o respeito pelos conhecimentos do professor é essencial (pela hierarquia de experiência) mas também o conhecimento que o aluno traz consigo envolvido pelas suas experiências, gostos, metas, programas, será uma fonte de conhecimento inesgotável para o professor. Muitas vezes na educação escutamos, interiorizamos, transformamos e devolvemos. Toda esta dinâmica em múltiplos momentos pode ser afetada pelas circunstâncias de vida quer do professor, quer do aluno. Somos humanos e há que respeitar este estado que nos é natural e inerente. Ultrapassar estes limites de humanidade considerando que o outro jamais merece o nosso investimento é trespassar a existência humana da forma mais opressiva. Como tantas vezes existiu ao longo da história e que condenamos veementemente. Mas que realizamos no nosso dia-a-dia com falta de paciência, compreensão, profissionalismo para com o próximo. Com isto desrespeitamos o próximo e sobretudo os nossos princípios – aqueles incutidos desde o momento da conceção.

A motivação para o desempenho das tarefas escolares dependerá de múltiplos fatores, desde o meio ambiente estrutural ou relacional, mas também do próprio individuo, quer seja o professor, quer seja o aluno. Os acontecimentos de vida, por que cada um passa, poderão ser compreendidos dentro daquilo que é a nossa melhor visão do mundo. Jamais podemos exigir ao outro que entenda e se coloque no nosso lugar quando os valores de que dispomos não se enquadram de todo na vivência do outro.

A inexistência de “motivação para a motivação” poderá contribuir para um desinteresse do ponto de vista do aluno relativamente à matéria em si e forma como é lecionada. Há matérias mais interessantes e outras menos interessantes. É o que é e todos passámos por isso. Atenção que isto também acontece no local de trabalho e para o qual achamos que devemos estar motivados, porque simplesmente é assim. Jamais! As crianças e jovens devem apreender a motivação desde o momento que pisam o solo escolar. Entender que ali vão buscar conhecimento, mas também que quem leciona pode e deve entender quem tem à frente para que possa cativá-lo no âmago. O aluno jamais pode ser considerado um conjunto de 60 olhos a fixarem o professor. E quando oito se dispersam a aula já não tem nexo. Podemos e devemos atingir os alunos que têm oito olhos a fixar-nos da forma mais acutilante e com isso agarrarmos todos sem que hajam exceções.

Quando o prémio que o aluno recebe (entenda-se a atenção disponibilizada pelos colegas) é superior àquele que provém da melhoria do seu comportamento em ambiente escolar, é desafiante quer para o professor, quer para o aluno. No entanto, não é impossível. O professor depara-se com um aluno que lhe faz frente. Um tipo de personalidade, quiçá, teimosa, para transformar. Mas será que têm que a transformar? Ou pode simplesmente aceitá-la e ajustar os conteúdos ao que é aquele aluno? O temperamento já nasce connosco, mas atenção que a personalidade constrói-se. E os professores têm um papel crucial, revelante, máximo neste aspeto. Professor é aquele que ensina, por definição, e por consequência aquele que molda mentalidades e contribui para a definição da personalidade, aceitando, obviamente, o que vem no temperamento. Somos todos diferentes e é essa diferença que traz a beleza ao mundo porque cria o desafio. E lecionar é um desafio duma autenticidade dantesca. Parece exagerado? Pois...

Coloquem este desafio nos vossos filhos que vão ser moldados, ensinados, transformados por outros professores, que não vocês. É verdade, vamos querer que essas pessoas tenham os mesmos valores que nós para que a educação siga os mesmos moldes. Mas a verdade é que essas pessoas são pessoas com uma vivência completamente diferente da nossa. E vamos entregar os nossos filhos a esses educadores? Sim, vamos, com a humildade de que aceitamos como são, mas jamais evitem falar connosco enquanto educadores e pais para que possamos ajudar-vos nesta árdua tarefa que é educar. Jamais nos virem as costas e aceitem que também somos seres humanos com todas as questões da humanidade dentro de nós e das nossas relações sociais. Precisamos da vossa ajuda, professores, para que a sociedade avance. Os nossos filhos fazem parte do que vocês estão a moldar, criar, transformar e nós acreditamos no vosso potencial. Mas também acreditamos que os nossos filhos vêm para vos e nos ajudar. Desempenhar esta tarefa conjunta é essencial. Alterar comportamentos é possível e contextualizar o como e o porquê de determinado comportamento é essencial. Jamais os recursos para apoiar, ensinar e educar devem ser considerados como esgotados. Como refiro que jamais existem dois caminhos, investir ou desistir. A educação é construída por múltiplos caminhos e não existe um sistema binário de investimento ou desistência.

A desmotivação e cansaço do professor perante um comportamento persistentemente desadequado deve ser apoiado quer pelos pares, família e psicologia educacional. O envolvimento de todos, com discussão aberta e franca de todas as possibilidades para ajudar um aluno, devem ser colocados na mesa e ponderadas. Considerar a possibilidade de que não há mais recursos jamais poderá ser tido em conta. Muitas vezes, o comportamento inadequado do aluno poderá estar a mascarar um extremo sofrimento por múltiplos fatores. Assim como a reação do professor poderá ter a ver com fatores inerentes ao próprio. No entanto, pelo próximo estamos cá. Somos seres sociais e como tal a vivência é conjunta, pelo que poderemos aceitar o outro sem rótulos e entendê-lo para que a ajuda surja no momento certo. Esses fatores devem ser explorados e consequentemente a solução surgirá. A motivação educacional depende de todos os intervenientes no processo educativo e ninguém se deve demitir desse papel – desistir jamais é solução. Famílias e escola devem e podem conjuntamente equacionar soluções para que as crianças e jovens atinjam um futuro o mais próximo possível do que desejam. Tudo é uma cadeia de acontecimentos e os alunos que hoje moldam podem ser os que no futuro vos irão ajudar.

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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