Europa em mudança

A Europa que saiu das últimas eleições europeias corporiza a entrada de rompante das alterações climáticas na agenda política, bem como reacende o debate entre o modelo federalista e a preservação dos Estados-Nação.

Os europeus votaram e a Europa acordou diferente. As eleições parlamentares europeias, que terminaram dia 26 de maio, mostraram uma vontade popular em desfragmentar o histórico centrão europeu, liderado pelo Partido Popular Europeu (PPE) e pelo bloco socialista europeu do S&D. À semelhança do que se passa em muitos Estados, a governação na União Europeia (UE) irá tomar a forma de coligações de poder entre diferentes famílias políticas

O centro-esquerda e centro-direita do establishment comunitário terão de partilhar poder com forças políticas que prometem mais ambiente e mais liberalismo, não esquecendo uma crescente vontade popular por mais soberania nacional. 

Os ambientalistas, alimentados pela cada vez mais palpável emergência climática, entraram definitivamente nos jogos de poder de Bruxelas pela mão de um eleitorado mais jovem e mais urbano que, em muitos casos, começa a votar pela primeira vez.

Na Alemanha os verdes do Grüne tornaram-se no segundo partido mais votado, em França foram a terceira força política e em Portugal, onde nem sempre os ventos de mudança se fazem sentir, o surpreendente PAN obteve 5% dos votos. Dada a importância crescente do tema ambiental, com a Europa a querer liderar o mundo na descarbonização e circularidade da economia, antevê-se mais ecologia na UE. 

Os nacionalistas e soberanistas europeus mantiveram a sua tendência de subida, no seguimento da relação íntima com o poder que já têm nos respetivos parlamentos nacionais. Salvini em Itália, Le Pen em França, Farage no Reino Unido e, os casos menos mediáticos da Polónia e Hungria, são um claro sinal de stop ao errático processo de integração europeu que distanciou os cidadãos de cada nação de um centro de poder sem rosto da UE. 

Contudo, até à data, os grupos parlamentares que representam estas forças políticas (nomeadamente, o EFDD e o ENF) ainda não atingiram a maturidade política que lhes permita unirem-se para uma maior capacidade negocial nos corredores de Bruxelas. Matteo Salvini já expressou intenções de alterar a situação. À semelhança do que se passa no seu país, o astuto político italiano pretende formar uma grande coligação que inclua nacionalistas, populistas e eurocéticos para formar um bloco político capaz de fazer frente às grandes famílias políticas. 

Os liberais, agregados no grupo parlamentar ALDE, registaram também uma subida significativa. A terceira força política da EU, liderada por Verhofstadt e suportada por Macron, ultrapassou a fasquia dos 100 eurodeputados e representa um inequívoco voto de confiança a um modelo de integração europeu de inspiração federalista. Contudo, importa lembrar que no caso de se concretizar o Brexit, o ALDE perderá fulgor com saída dos liberais democratas britânicos. 

Agora segue-se a guerra dos tronos europeia, onde as várias casas políticas vão negociar e influenciar posições para a eleição do próximo presidente da Comissão Europeia. Apesar de ser o grupo parlamentar mais numeroso, o PPE de Manfred Weber e Angela Merkel deverá findar o seu longo reinado a favor de uma eurogerigonça, que inclua liberais e verdes, com o trabalhista holandês Frans Timmermans a presidir a Comissão Europeia.  

Considerando este cenário, será necessária grande capacidade negocial do novo executivo europeu para compatibilizar interesses ambientais e de liberalização do comércio, que frequentemente são antagónicos. Os nacionalistas e soberanistas ficaram fora da equação, não tendo para já qualquer potencial grande parceiro de coligação; mas não deixando, por isso, de exercer cada vez mais poder e influência nas tomadas de decisão. 

A Europa que saiu das últimas eleições europeias corporiza a entrada de rompante das alterações climáticas na agenda política, bem como reacende o debate entre o modelo federalista e a preservação dos Estados-Nação. Entretanto o mundo avança rapidamente, não esperando por uma Europa cada vez mais polarizada.

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