Obras públicas e garantias bancárias

A atual lei que regula a emissão das garantias bancárias é altamente penalizante para as empresas portuguesas de obras públicas.

Num futuro próximo, corre-se um risco de as obras públicas portuguesas a executar em Portugal serem maioritariamente adjudicadas a empresas estrangeiras.

Nos contratos públicos nacionais, um empreiteiro de obras públicas, quando ganha um contrato, é obrigado a dar ao seu cliente Estado ou empresa pública 5% do valor do contrato como caução inicial de que vai executar a obra adequadamente. Ao longo da obra e até ao seu final, o empreiteiro tem que caucionar o cliente em mais 5% do valor faturado. No total, o empreiteiro tem de dar ao seu cliente 10% do valor da obra, sendo reembolsado mais de cinco anos após a receção provisória.

Como dificilmente as empresas de obras públicas têm meios em tesouraria disponíveis para dar esses montantes, foi norma durante muitos anos solicitar aos bancos com quem trabalham as garantias bancárias em substituição das cauções em dinheiro que deveriam entregar ao cliente.

Estas garantias bancárias têm uma minuta aprovada, que obriga a que as mesmas sejam emitidas sem prazo. Os bancos emissores dessas garantias devem pagar as mesmas ao primeiro pedido por escrito por parte do cliente e sem mais qualquer explicação.

Com a crise que o país atravessou, o Estado e as empresas públicas acionaram milhares de milhões de euros em garantias bancárias, junto a todos os bancos a operar no mercado nacional. Era suposto os bancos pagarem e solicitarem posteriormente aos seus clientes o pagamento das mesmas. Na verdade, a maioria desses clientes entrou em insolvência ou falência e não pôde liquidar o valor acionado. Por isso mesmo, este produto bancário passou a ser encarado com a maior reserva por parte dos bancos emissores destas mesmas garantias.

Hoje em dia, os bancos não querem dar novas garantias bancárias sem prazo a empresas nacionais, pois este tipo de crédito tem uma classificação de risco elevada por parte dos reguladores bancários nacional e europeu. Por isso mesmo, não havendo bancos nacionais à exceção da CGD, corre-se o risco de ver as empresas nacionais sem condições de concorrer aos concursos públicos.

Este risco tornou-se já uma realidade, pois ainda em 8 de Abril o Jornal de Negócios noticiava que as obras lançadas pela Infraestruturas de Portugal para o futuro corredor internacional Sul foram ganhos maioritariamente por empresa espanholas.

Assim, e enquanto os bancos não passarem garantias bancárias a empresas nacionais, veremos estas empresas falirem como aconteceu recentemente com a MSF, e as grandes obras que poderiam e deveriam criar emprego e trabalho a empresas portuguesas serem entregues a empresas estrangeiras.

Acresce o facto de os bancos privados já não serem portugueses e há o risco de pretender favorecer as empresas provenientes dos seus países de origem, emitindo as garantias bancárias a essas empresas estrangeiras em detrimento das empresas nacionais.

Esta situação contrasta fortemente com os regimes aplicados na Madeira e nos Açores, onde a caução determinada para as obras públicas pode ir até 4%, enquanto no Continente é de 10%. Acresce, e de acordo com informação de 9 de Janeiro de 2018 da AECOPS, que a liberação integral da caução ocorre no final de um ano após a receção provisória da obra, enquanto no Continente podem ser dez anos para libertar uma garantia bancária, conforme consta da circular informativa n.º 4 do INCI de 3/7/2013.

De registar que as empresas madeirenses de obras públicas não entraram na sua maioria em falência ou insolvência, ao contrário das suas congéneres nacionais. Há mesmo uma que está a fazer, com recurso a crédito próprio, um Hotel Savoy de 1500 quartos no centro do Funchal, como noticiava o PÚBLICO em 14 de Julho de 2017.

A atual lei que regula a emissão das garantias bancárias é altamente penalizante para as empresas portuguesas de obras públicas. Urge alterá-la e basta colocar em Portugal Continental as condições que vigoram nas Regiões Autónomas.

Não o fazer é acabar com um setor da economia portuguesa que emprega 8% da mão de obra nacional e que cria milhares de milhões de euros de valor acrescentado. Para proveito de empresas estrangeiras que se irão embora mal acabarem as obras de remodelação dos aeroportos, a construção das novas barragens e as suas redes de rega e de reestruturação das ferrovias.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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