Código de conduta do PSD: pontualidade, prendas, calúnias e acordos parlamentares

Polémicas em torno do tempo de serviço dos professores, das faltas dos deputados, das nomeações familiares na política ou do Galpgate não terão sido esquecidas.

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Código pretende reforçar transparência da conduta dos deputados Daniel Rocha

Não usufruir de vantagens indevidas. Declarar interesses. Ser assíduo e pontual. Abster-se de utilizar a calúnia como arma política. E ter especial cuidado com quaisquer acordos de incidência parlamentar. São muitas as recomendações que o grupo parlamentar do PSD incluiu no Código de Conduta para os Deputados à Assembleia da República apresentado na comissão dedicada ao tema.

Quando se passa os olhos pelo documento, há vários artigos que parecem feitos à medida para diferentes casos que marcaram esta legislatura. Olhando para o artigo 11.º, dedicado a acordos parlamentares, é difícil não relacionar as regras propostas com a polémica aprovação inicial da contagem integral de tempo de serviço dos professores, que levou a direita a uma reviravolta na votação final e que motivou uma crise política, com ameaças de demissão por parte do Governo.

“Os deputados, no âmbito das relações interparlamentares, devem actuar com um elevado sentido ético, apenas se devendo comprometer com quaisquer acordos de incidência parlamentar, depois de terem ponderado adequadamente as suas consequências políticas, sociais, económicas ou outras, e após terem obtido mandato nesse sentido por parte da direcção do seu grupo parlamentar”, lê-se, acrescentando-se que “a concessão do mandato previsto no número anterior, assim como a celebração de quaisquer acordos de incidência parlamentar, não carece do cumprimento de qualquer formalidade”.

Mais: “Os deputados ficam pessoal e politicamente vinculados ao cumprimento de todos os acordos de incidência parlamentar celebrados.” Os sociais-democratas recomendam: “Na eventualidade de haver imperiosa necessidade superveniente de revogar ou alterar qualquer acordo de incidência parlamentar, o primeiro a ser informado deve ser o outro grupo parlamentar contraente, a quem deve ser dada explicação por escrito dos seus fundamentos, com uma antecedência mínima de 24 horas antes de ser dada qualquer tipo de publicidade à alteração da posição política prévia.”

Não é só, porém, a polémica com o tempo de serviço dos professores que pode ser lida nas entrelinhas da proposta de criação deste código, apresentada na Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas. Casos como os das faltas dos deputados também não parecem ter sido esquecidos, recomendando-se aos parlamentares que sejam “assíduos e pontuais”.

Ou polémicas como as das nomeações familiares na política: “As nomeações para membros de gabinetes pessoais ou (...) de apoio ao grupo parlamentar de que façam parte, cujo vencimento seja suportado pelo orçamento da Assembleia, não podem incidir sobre parentes em linha recta ou até ao quarto grau da linha colateral, cônjuges ou equiparados do deputado, nem dos deputados que integrem o grupo parlamentar, salvo quando se trate de (...) renovação de nomeação”, lê-se, ressalvando-se que aquelas nomeações que “recaiam sobre parente na linha recta, cônjuge ou pessoa em união de facto de titular de membro do Governo, de presidente de câmara, director-geral, presidente de instituto público ou membro dos órgãos nacionais dos partidos políticos com assento parlamentar, deve ser precedida” de um parecer” da comissão parlamentar que analisa “a adequação do currículo” ao cargo, “devendo as conclusões ser lidas no plenário”.

"Manifestação de censura"

O grupo parlamentar defende ainda o cumprimento, no prazo da lei, das “obrigações declarativas” sobre rendimentos, património, interesses, incompatibilidades e impedimentos e a rejeição de “vantagem ou ganho como contrapartida" de “uma acção, pronúncia, omissão, voto ou influência sobre a tomada de qualquer decisão”.

Recomenda-se também que as instalações ou os meios da Assembleia da República não sejam usados para promover interesses privados nem pelos próprios nem por terceiros. Os deputados devem “guardar sigilo” sobre “informações com carácter reservado”, sejam relativas ao funcionamento do Parlamento, do grupo parlamentar, do contacto com cidadãos ou com pessoas colectivas, lê-se no documento que recomenda ainda que os deputados se abstenham de usar “a calúnia, a insídia, a injúria, o sensacionalismo ou a demagogia consciente como armas de combate político”. O código estabelece também que os parlamentares não participem em “processos de favorecimento ou trocas de favor com o objectivo de granjear notoriedade ou destaque indevidos”.

Este é um tema, aliás, abordado em várias partes do documento: “Os deputados não podem, em momento algum, usufruir no exercício do seu mandato ou por causa dele, de quaisquer vantagens indevidas ou ocultas, pessoais, financeiras ou patrimoniais, directa ou indirectamente percebidas, para si ou para terceiros.” Em matéria de transparência, recomenda-se ainda a declaração de todos os interesses de carácter particular que possam condicionar decisões ou colidir com o interesse público.

Estabelece-se ainda que os deputados devem recusar “ofertas e hospitalidades de pessoas jurídicas, singulares ou colectivas, públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, que possam condicionar a independência no exercício do seu mandato”. E, à semelhança do código de conduta do Governo e também do proposto pelo PS, sujeito ainda a votação, a proposta do PSD estabelece igualmente os 150 euros como tecto para prendas: “O deputado deve assumir existir um condicionamento da independência do exercício do seu mandato quando exista uma oferta, por pessoa singular ou colectiva de direito privado, de bens, serviços e hospitalidades de valor estimado igual ou superior a 150 euros.” Entre muitas outras recomendações sobre este tema, determina-se que devem ser apresentadas à secretaria-geral da Assembleia da República todas as ofertas em relação às quais haja “dúvidas razoáveis” sobre o valor.

E nem as viagens pagas, incluindo para assistir a eventos desportivos, escapam à lupa dos sociais-democratas. Para que não se voltem a repetir polémicas como o Galpgate, determina-se: “Para assistência a eventos sociais, institucionais, desportivos ou culturais de acesso oneroso ou com custos de deslocação ou estadia associados, ou outros benefícios similares, os deputados (…) apenas podem aceitar convites de organismos internacionais, entidades públicas ou de interesse público reconhecido, nacionais ou estrangeiras” em situações detalhadas no documento, tais como, entre outras, em eventos em representação da Assembleia da República; em cerimónias oficiais de entidades públicas nacionais, de Estados estrangeiros ou de organizações internacionais; ou a convite de partidos. “As ofertas de hospitalidade aceites” devem ser inscritas no registo de interesses do deputado.

Se um deputado infringir este código, a comissão parlamentar encarregue de examinar o caso pode “formular uma recomendação ao Presidente da Assembleia da República no sentido de ser emitida uma manifestação de censura” que deve ser publicada no Diário da Assembleia da República.

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