Os Margaret Thatcher de calças
Quando a vida e a realidade dos factos já mostrou à evidência os resultados desastrosos das PPP na saúde em diversos países, vêm os arautos do neoliberalismo falar em testar a ideologia perante a realidade?
Um designado “jornalista de economia” assinou recentemente um artigo de opinião num conhecido jornal, na sua edição online, com o título “O Arménio Carlos de saias”, a pretexto de uma entrevista da ministra da Saúde.
Apesar de o artigo ser curto, constitui um deplorável exemplo de um baixo nível de ética política ao recorrer a uma abordagem de mero insulto pessoal na cegueira de defender as PPP na saúde.
Verificam-se, entretanto, no seu conteúdo algumas afirmações curiosas como:
– “eu aceito que um político sucumba à ideologia... mas antes de levar a ideologia à prática deve testá-la perante a realidade”;
– “...O que interessa na Saúde? Que os hospitais sejam geridos pelo Estado? Ou que os cuidados de saúde devem ter qualidade independentemente de quem os presta?”;
– “...a ministra mostra qual é o problema do Governo: põe a ideologia acima dos interesses dos cidadãos...”.
O jornalista de economia em causa é conhecido há largo tempo como um sectário adepto de um neoliberalismo fundamentalista muito ao estilo da M. Thatcher, enquanto primeira-ministra da Grã-Bretanha.
É possível um político agir sem ideologia?
A história está cheia de exemplos de indivíduos que negaram e negam a ideologia para não permitir aos outros a livre expressão de ideias.
A ideologia, como o conjunto estruturado de ideias, precede toda a acção política.
Exorcizar a ideologia é a forma mais ignóbil de fazer política.
Quando a vida e a realidade dos factos já mostrou à evidência os resultados desastrosos das PPP na saúde em diversos países, vêm os arautos do neoliberalismo falar em testar a ideologia perante a realidade?
E no nosso país, a gestão em modelo tipo PPP durante vários anos do Hospital Amadora-Sintra mostrou fazer mais e melhor do que os hospitais públicos?
Não! A tal realidade mostrou o oposto.
E as actuais quatro PPP têm feito mais e melhor que os hospitais de gestão pública?
A frase panfletária de que não interessa se é o Estado ou os privados a gerir os serviços de saúde porque o que interessa é a qualidade dos cuidados é retomada por esse jornalista e mostra a sua dependência ideológico-partidária ao PSD ao repetir um argumento central do seu denominado “conselho estratégico”.
Naturalmente que cada um pode ser dependente do que a sua livre consciência ditar, mas ao menos que assuma isso sem se “esconder" em artigos pretensamente tecnocráticos.
Se houve alguém que colocou “a ideologia acima dos interesses dos cidadãos” foi o governo que elaborou a Lei de Bases da Saúde que está ainda em vigor, ao colocar o dinheiro dos impostos dos contribuintes ao serviço da criação de negócios privados e em exclusivo benefício dos accionistas desses grupos.
Na ausência de argumentos bem fundamentados é habitual algumas pessoas deslizarem para a ofensa pessoal.
Mas deviam, antes, olharem-se a um espelho.
É que andam por aí vários “Margaret Thatcher de calças” a quererem destruir o nosso SNS, tal como aconteceu na Grã-Bretanha.