Um pouco mais de poucochinho

Se o PS contrariar a tendência será um feito, pois parecia grande a erosão política e social dos últimos tempos, apesar das contas públicas em ordem e de algum crescimento económico.

Se as eleições de domingo foram transformadas na primeira volta das legislativas de Outubro, os resultados desta sondagem demonstram que é nula a vontade de mudança. Um PSD a dez pontos do PS mostra que se inverteu e alargou a desvantagem de 2015. Os socialistas reclamam uma moção de confiança do eleitorado, a direita pede um voto de censura. Mesmo sendo eleições diferentes, com níveis de participação díspares, as tendências parecem nítidas. Talvez não seja boa ideia que o PSD e o CDS tenham embarcado na retórica de que é a governação que está em causa. Talvez seja boa ideia que António Costa se atravesse na campanha com o seu Executivo.

Quem está no poder costuma sofrer nas eleições para o Parlamento Europeu. A tentação pelo cartão amarelo é comum. Se o PS contrariar a tendência será um feito, pois parecia grande a erosão política e social dos últimos tempos, apesar das contas públicas em ordem e de algum crescimento económico. O caso da contabilização do tempo de serviço dos professores, em que a direita se quis aliar aos partidos mais à esquerda, reforçou decerto a imagem de centralidade do PS e do seu Governo.

O PSD apresentou-se coligado com o CDS nas últimas europeias e nas últimas legislativas. Não temos medida certa para comparações rigorosas e as sondagens são fotografias contingentes de um momento. Mas identificamos sentidos. Um deles é que não vislumbramos uma recuperação do PSD, que vinha a desenhar-se. Considerando a margem de erro, os intervalos de variação ainda permitem várias leituras. Mas os sinais não são bons para Rui Rio, que continuará a pensar que as eleições não se ganham, perdem-se. E ainda não será desta…

O BE e o PCP estabilizam a base de apoio obtida nas legislativas, mas os bloquistas crescem significativamente quando olhamos para as europeias anteriores. Talvez na mesma medida das perdas do PCP. Estes resultados mostram também, no essencial, a resistência do nosso sistema partidário, apesar da dispersão de votos por muitas candidaturas sem expressão. Marinho e Pinto surpreendeu há cinco anos com a sua eleição e a de um segundo deputado do Partido da Terra. Agora, segundo a sondagem da Católica, apenas o PAN e a Aliança poderão ganhar galões europeus. Excepções que confirmarão a regra da estabilidade. A grande incógnita é a abstenção, sempre muito difícil de medir, e que nas europeias pode voltar a ser muito elevada.

Perante os resultados das europeias de 2014, António Costa disse em Valongo: “Sei que muitas vezes se diz que por um se ganha e por um se perde”. É verdade, no futebol é assim. Na política não é assim. É que a diferença faz muita diferença, na política. É que quem ganha por poucochinho é capaz de poucochinho. E o que nós temos de fazer não é poucochinho. O que nós temos de fazer é uma grande mudança”. A grande mudança foi no PS com o desafio ganho a António José Seguro. Nas legislativas, não houve sequer “poucochinho”. Perdeu. Ou melhor, acabou por ganhar o governo com apoios à esquerda nunca vistos. Quando muitos lhe vaticinaram o fracasso, consegue chegar ao final da legislatura com um governo minoritário. A vitória nas eleições europeias será um bom augúrio para as legislativas. Mas não há indícios de maioria absoluta. Por enquanto, apenas um pouco mais de poucochinho. O que não é pouco. Mas não será uma grande mudança.

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