João Ferreira foi ao centro comercial ao domingo para dizer que devia estar fechado

Candidato da CDU percorreu corredores e lojas do Fórum Sintra, sem bandeiras nem palavras de ordem, para defender o direito dos trabalhadores ao descanso, horários regulados e contratação colectiva. As câmaras de TV também tiveram que ficar desligadas por falta de autorização da gestão do centro.

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LUSA/RODRIGO ANTUNES

Pode parecer uma contradição, mas não é: João Ferreira fez questão de escolher a manhã de domingo para ir a um centro comercial dizer aos trabalhadores das lojas que a CDU defende que as grandes superfícies estejam fechadas neste dia do fim-de-semana. O escolhido foi o Fórum Sintra, no final do IC19, no sopé da serra de Sintra, que tem um supermercado Pingo Doce, da Jerónimo Martins, com cerca de 150 lojas e serviços. O candidato teve de dizer que a escolha não teve qualquer critério especial - serve apenas para mostrar a realidade de tantos outros centros comerciais pelo país.

As bandeiras ficaram do lado de fora e não houve palavras de ordem, mas João Ferreira, acompanhado por outros candidatos como João Pimenta Lopes, entraram em duas dezenas de lojas, desde vestuário de homem, mulher ou criança, e lingerie, a jóias ou cosméticos e até no café. Mas não levaram jornalistas atrás, para proteger os lojistas. É que muitas lojas têm contadores à porta que servem também para aferir da produtividade dos trabalhadores e impor-lhes objectivos de vendas. Ou seja, os contadores servem para perceber quantos clientes entram na loja e quantos, de facto, fazem compras (medindo assim o poder de persuasão dos vendedores), e os funcionários podem ser penalizados por não cumprirem objectivos de vendas.

Duas jovens empregadas numa loja de roupa de marca portuguesa questionadas pelo PÚBLICO lamentam que o horário diário se estenda até às 23h, porque, a partir das 20h, os clientes se concentram na zona da restauração e do supermercado, ficando as lojas quase vazias. “Se fechássemos mais cedo nos dias úteis e estivéssemos encerrados ao domingo, os sábados seriam até muito mais rentáveis”, aponta uma delas. Um horário mais curto seria também mais fácil para o transporte dos trabalhadores - que são cerca de mil em todo o centro comercial -, já que a zona é pouco servida por transportes públicos, acrescentam. Na loja “felizmente” não existe o sistema de contagem das entradas de clientes, o que é um alívio em relação às condições de trabalho de outras empregadas.

À porta do centro comercial, João Ferreira explicou que a acção de campanha envolvia algumas dificuldades - como a proibição das câmaras de televisão de filmarem dentro do centro ou o pedido para que não entrassem muitas pessoas em cada loja -, mas que ela eram reveladoras da realidade que se pretendia mostrar.

“Os trabalhadores do sector do comércio enfrentam a realidade da precariedade, da desregulação de horários e enorme dificuldade de compatibilização entre a vida profissional e a vida familiar, com trabalho por turnos e aos domingos, uma enorme precariedade e baixos salários”, aponta João Ferreira, aproveitando para defender a subida do salário mínimo para os 850 euros.

Também aqui a culpa é, em grande parte, da União Europeia, que tem vindo a “recomendar sucessivamente no sentido da desregulação e flexibilização do mercado laboral, da desarticulação da contratação colectiva que considera demasiado rígida”, descreve João Ferreira.

A regra da caducidade dos contratos colectivos, instituída ainda no Governo de José Sócrates, com o mesmo Vieira da Silva como ministro do Trabalho, tem “levado as associações patronais a fazer chantagem sobre os trabalhadores, deixando caducar os contratos, e deixando-os extremamente fragilizados na nova negociação, acabando por se submeter a condições de trabalho de uma enorme precariedade, desregulação dos horários de trabalho e salários baixos”, resume o candidato.

Por isso, é que “se impõe a fixação do salário mínimo nos 850 euros a curto prazo, o fim da caducidade da contratação colectiva e a fixação a nível europeu do princípio da não-regressão”, defende João Ferreira. Este princípio é uma proposta da CDU que pressupõe que não se possa legislar no sentido de regredir em direitos que já se tinham consagrado.

Com o cabeça de lista estiveram os candidatos João Pimenta Lopes (que já é eurodeputado) e Mariana Silva. Pimenta Lopes, que integrou a comissão de emprego, lembrou que entre os trabalhadores portugueses há pelo menos 40% que trabalham ao sábado e 20% ao domingo. 

O recandidato defendeu a necessidade que inscrever na legislação a proibição da precariedade, acabando, por exemplo, com os contratos temporários, e regulamentando e reduzindo o horário de trabalho. E também na área da protecção da maternidade e paternidade - “como é que há tanta preocupação com o défice demográfico e a lei laboral desprotege a família?”) - alargando a licença da mãe paga a 100% do salário base até aos seis meses, as licenças obrigatória e facultativa do pai até aos 30 dias cada, e aumentando a oferta das medidas de apoio às crianças.

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