“O Sistema vai-me matar”. Carta partilhada por Bolsonaro confunde analistas

Carta partilhada pelo presidente brasileiro no WhatsApp está a ser vista como um aceno à radicalização.

Foto
Especialistas analisaram mensagem de Bolsonaro partilhada na rede WhatsApp Reuters/ADRIANO MACHADO

O presidente do Brasil partilhou sexta-feira uma carta no WhatsApp que fala da ingovernabilidade do país e que está a ser interpretada como aceno à radicalização, ameaça de renúncia ou distracção relativamente às denúncias sobre o filho.

O texto partilhado por Jair Bolsonaro, citado pelo jornal Estadão, indica que “bastaram cinco meses de um governo atípico, ‘sem jeito’ com o Congresso e de comunicação amadora para mostrar que o Brasil nunca foi, e talvez nunca será, governado de acordo com o interesse dos eleitores”.

O artigo, disseminado pelas redes sociais depois de Bolsonaro partilhar a mensagem com diversos grupos através do WhatsApp na sexta-feira, dia 17, refere também que o presidente “não aprovou nada, só tentou e fracassou” porque “a agenda de Bolsonaro não é do interesse de praticamente nenhuma corporação”.

Nesse sentido, o texto prossegue que “a continuar tudo como está, as corporações vão comandar o governo Bolsonaro na marra” – e, “na hipótese mais provável, o governo será desidratado até morrer de inanição, com vitória para as corporações”. O artigo refere ainda que é “claramente possível” que o País fique “ingovernável”, como a Venezuela.

Ao compartilhar o texto entre aliados no WhatsApp, o seu principal vector de mobilização durante a campanha presidencial, Bolsonaro escreveu a seguinte mensagem, citada pelo Estadão: “Um texto no mínimo interessante. (…) O Sistema vai-me matar. Com o texto abaixo cada um de vocês pode tirar suas próprias conclusões”.

De acordo com o Folha de S. Paulo, o texto partilhado por Jair Bolsonaro com aliados “foi lido por dirigentes partidários como um sinal de que o presidente acenou à radicalização para voltar a comandar a cena política”.

Segundo o jornal, “a mensagem foi interpretada como uma tentativa de incendiar a convocatória que circula nas redes bolsonaristas para ato em defesa dele”, contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, no dia 26. Mas o texto partilhado no WhatsApp está também a ser comparado à renúncia do presidente Jânio Quadros, o vigésimo segundo presidente do Brasil, que renunciou em 1961, sete meses depois de tomar posse.

“É um recado janista, como se dissesse ‘eu quero governar, mas a elite não me deixa, querem-me derrubar, então vamos às ruas nos defender’”, afirmou o cientista político Sérgio Praça, professor da FGV-Rio e colunista da revista Veja. Analistas políticos citados pelo Globo consideram, por seu turno, que se trata de uma estratégia populista que cria uma “cortina de fumaça para tirar do foco denúncias contra o filho”, alimentando ainda “as críticas da sociedade ao Congresso e a diferentes instituições”.

O cientista político Oswaldo Amaral considera, citado no Globo, que Bolsonaro “está testando elevar uma popularização para ver como a população reage”. “Vai culpar o Congresso e as instituições por tudo o que não consegue fazer”, acrescentou.

Já Reinaldo Azevedo, colunista na Folha de S. Paulo e em outras publicações, assinou ontem um artigo em que escreve que, depois de carta, restam a Bolsonaro “duas alternativas: renúncia ou suicídio”, acrescentando que, “caso permaneça, talvez possa pensar também em cadeia”.

De acordo com o Estadão, o autor do texto compartilhado por Bolsonaro é Paulo Portinho, analista da Comissão de Valores Mobiliários. O analista afirmou que o texto, que publicou no seu perfil no Facebook na manhã de dia 11 deste mês, “não foi crítica ao governo nem ao Congresso”, mas sim a pessoas com “influência no orçamento público”.

Sugerir correcção
Ler 27 comentários