Em clima de tensão com Irão, EUA retiram pessoal diplomático do Iraque

Washington diz que há aumento de alerta em relação a potenciais ataques iranianos na região; Londres diz que não há qualquer indicação de maior perigo.

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Os EUA deslocaram um porta-aviões para o Golfo Pérsico Dan Snow/U.S. Navy/REUTERS

O Departamento de Estado dos EUA ordenou a retirada de pessoal não-essencial do Iraque, numa altura em que a tensão com o Irão está a aumentar. Alemanha e Holanda anunciaram a suspensão de treino de militares no Iraque por informação de potenciais ataques iranianos, disse Berlim, sublinhando que a informação não era própria e que a suspensão era temporária.

O nível de alerta no Médio Oriente por potenciais ataques do Irão a alvos norte-americanos ou sauditas aumentou devido a indicações de espionagem sobre potenciais ataques iranianos na região. No entanto, o Departamento de Estado não deu justificação para a retirada dos diplomatas da embaixada em Bagdad e do consulado em Erbil.

No domingo, um acto de sabotagem causou danos em dois petroleiros sauditas. Investigadores americanos disseram acreditar que Teerão está por trás da acção, mas não têm provas. O Irão disse que se tratava de uma “conspiração para provocar um conflito na região”. Antes, os EUA deslocaram um porta-aviões para o Golfo Pérsico.

Em contraste com a avaliação norte-americana sobre as ameaças no Iraque, os serviços secretos britânicos não encontram qualquer indicação de um aumento de ameaça. Chris Ghika, o vice-comandante da coligação global contra o Daesh, que perdeu entretanto o território que dominava no Iraque e Síria mas permanece uma ameaça, disse aos jornalistas na terça-feira que as medidas em vigor para proteger os EUA e seus aliados de milícias iranianas ou apoiadas pelo Irão no Iraque e Síria eram “completamente satisfatórias”, cita a emissora britânica BBC.

O comando central militar americano desmentiu publicamente o britânico, citando “ameaças credíveis e identificadas disponibilizadas aos serviços secretos dos EUA e seus aliados”, segundo o porta-voz Bill Urban.

Da Alemanha, um porta-voz disse ter recebido indicações gerais de potenciais ataques apoiados pelo Irão e por isso suspendeu temporariamente a formação que os seus militares dão aos militares iraquianos, sublinhando que a formação deverá recomeçar “dentro de dias”.

A Holanda justificou a suspensão com uma “ameaça não especificada”.

A Reuters citou fontes de segurança iraquianas dizendo que numa visita ao Iraque este mês, o secretário de Estado, Mike Pompeo, disse a comandantes iraquianos que havia informação de que paramilitares apoiados pelo Irão posicionaram mísseis perto de bases onde estão militares norte-americanos.

Numa entrevista com a estação de televisão privada Al Sharqiya, do Iraque, o antigo vice-presidente iraquiano Iyad Allawi disse que ter sabido por um responsável norte-americano que a informação sobre mísseis veio dos serviços secretos israelitas, e que foi isto que levou Pompeo a cancelar a visita à Alemanha e dirigir-se para o Iraque.

O primeiro-ministro iraquiano, Adel Abdul Mahdi, disse, no entanto, que as suas forças militares não observaram qualquer “movimentação que constitua uma ameaça a qualquer lado”.

Desejo de guerra?

No seu blogue no Washington Post, o colunista Greg Sargent cita uma conversa com o democrata Adam Schiff, responsável pelo Comissão de Serviços Secretos na Câmara dos Representantes, em que este vê as mais recentes acções como tendo como fim justificar uma guerra. “O Irão é e tem sido, há décadas, um actor malévolo e um Estado que apoia terrorismo”, disse Schiff. “Mas também estou preocupado com acções levadas a cabo pela administração que parecem calculadas para nos pôr numa rota de colisão”, num “caminho com mais, e não menos, hipóteses de nos levar a um conflito armado”. E isto “seria um desastre”.

O responsável do centro de estudos sobre a política americana no Médio Oriente Washington Institute Michael Singh acha que é importante “distinguir entre um alegado desejo de guerra, por um lado, e um risco de escalada, por outro – o primeiro penso que é um exagero, o segundo é bem real”. Na dinâmica actual, em que o Irão está a tentar impor custos para os EUA pela decisão de sair do acordo nuclear e repor as sanções, e os EUA estão a tentar dissuadir estas acções, “há um risco bastante real de conflito inadvertido”.

Esta crise é diferente de anteriores, continua Singh. “Cada lado tem uma compreensão limitada das intenções e linhas vermelhas do outro, e há uma má comunicação, não só entre o Irão e os EUA, mas ainda entre os próprios aliados dos EUA”.

Enquanto isso, um artigo de opinião inédito abriu esperanças de que haja um caminho para o fim da rivalidade que define a região: dois peritos de política externa, um saudita e um iraniano, escreveram um artigo de opinião conjunto no New York Times dizendo que chegou a altura de o Irão e a Arábia Saudita falarem, porque é possível encontrar uma base de entendimento.

O artigo foi escrito por Abdulaziz Sager, fundador do Gulf Research Center, com sede na Arábia Saudita, e por Hossein Mousavian, que é um especialista em segurança do Médio Oriente e politica nuclear na Universidade de Princeton, nos EUA (e ainda antigo porta-voz da equipa negocial do nuclear iraniano). O artigo é ainda mais significativo, apontou Ali Vaez, do International Crisis Group, porque ambos têm ligação e comunicação regular com as respectivas lideranças.

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