Ministério da Cultura garante que Estado tem opção de compra das obras de Berardo, mas este só vende se quiser

Adenda ao protocolo torna clara esta opção, mas também diz que colecção terá de voltar a ser avaliada para se chegar a um novo preço. Cabe a Berardo decidir, depois, se aceita vender ao Estado por esse valor.

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Joe Berardo tem a sua colecção instalada no Centro Cultural de Belém desde 2006 NUNO FERREIRA SANTOS

O Ministério da Cultura garantiu nesta quarta-feira que o Estado tem o direito de exercer a opção de compra das obras de arte da colecção que está à guarda do Museu Berardo, no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa.

Contactada pela agência Lusa, fonte do gabinete de ministra Graça Fonseca explicou que “o Estado poderá exercer essa opção de compra até 30 dias antes do termo de vigência do contrato”, que termina em 2022.

O empresário e coleccionador de arte Joe Berardo, que foi à comissão parlamentar de inquérito à Caixa Geral de Depósitos (CGD) na sexta-feira, disse que era “claro” que não tinha dívidas e que as obras de arte que estão no CCB, uma parte delas em exposição, são da Associação Colecção Berardo. Aos deputados, o empresário garantiu ainda que o Estado não tinha direito de opção de compra das obras de arte.

Contactado pela agência Lusa, o Ministério da Cultura detalhou, na linha do que dissera já o primeiro-ministro, António Costa, na segunda-feira, que “existe uma cláusula inscrita na adenda assinada em 2016 [para prolongar o acordo de comodato de 2006 que possibilita a manutenção da colecção Berardo no CCB] que assegura que o Estado tem o direito de exercer a opção de compra até 30 dias antes do fim do contrato”.

Essa cláusula existe, de facto, assim como outra que garante que Berardo só vende se assim o entender: “A Associação [Colecção Berardo, que é como quem diz o empresário madeirense] poderá não aceitar o preço encontrado pela avaliação para a colecção, caso em que a opção fica sem efeito (...).”

O “preço encontrado”, lê-se na cláusula sexta da referida adenda, será determinado por uma “prestigiada firma internacional” escolhida por comum acordo entre as partes. “A avaliação será feita de acordo com o valor de mercado unitário das peças que a constituem e do valor como conjunto”, continua o documento. Ao número encontrado pelo avaliador serão acrescidos os “impostos e os encargos legais vigentes na data” em que o Estado manifestar a Berardo a intenção de exercer o seu direito de compra do acervo.

Esta situação é bem diferente da que estipulava o acordo de comodato (empréstimo) de 2006. Na versão original estava também garantida a opção de compra pelo Estado, mas estava já estipulado o valor da colecção — 316 milhões de euros, conforme a avaliação da Christie’s, uma das mais importantes leiloeiras do mundo —, que o empresário não podia contestar.

Em 2011, Francisco José Viegas, o escritor e editor que foi um dos secretários de Estado da Cultura do Governo de Pedro Passos Coelho, tentou que a Sotheby’s, o outro gigante das leiloeiras mundiais, apreciasse a colecção para se poder aferir da razoabilidade do valor que lhe fora atribuído originalmente, numa altura em que, sendo já públicas as dificuldades financeiras de Berardo, o Governo considerou ser pertinente ponderar um cenário em que o Estado exerceria o direito de opção de compra que o acordo de comodato lhe conferia.

A leiloeira, no entanto, recusou-se a cumprir a tarefa enquanto o Governo e o empresário não chegassem a um acordo. Berardo não aceitou e conseguiu mesmo impedir a avaliação com uma providência cautelar, alegando que o acordo de 2006, assinado durante o Governo de José Sócrates, estipulava que o valor de 316 milhões de euros não teria de ser “sujeito a qualquer tipo de revisão” no caso de o Estado decidir comprar a colecção.

O Museu Colecção Berardo abriu em Junho de 2007 com um acervo inicial de 862 obras da colecção de arte do empresário, cedidas ao Estado por um período de dez anos, tendo como objectivo a sua fruição pública. Em Novembro de 2016, pouco antes do fim do acordo original entre as partes, foi negociada e assinada uma adenda que determinou a sua prorrogação por mais seis anos, com a possibilidade de o acordo ser renovado automaticamente a partir de 2022, “se não for denunciado por nenhuma das partes”.

Na altura, o Ministério da Cultura, então liderado por Luís Filipe Castro Mendes, anunciou que o Governo não abdicava da opção de compra da Colecção Berardo. Ainda com o acordo de 2006 vigente, o ministro dissera no Parlamento que tinha sido decidido renegociá-lo porque tanto o Governo como Berardo estavam interessados em manter a colecção em Portugal.

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