ANC vence eleições sul-africanas com o pior resultado de sempre

Estagnação económica, desemprego elevado e escândalos de corrupção motivam ainda uma subida da abstenção.

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O Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, durante o anúncio da vitória do ANC em Pretória Reuters/MIKE HUTCHINGS

O Congresso Nacional Africano venceu novamente as eleições legislativas na África do Sul este sábado. Porém, tal como se previa, o partido registou o pior resultado de sempre, com 57,5% dos votos.

O valor é o mais baixo da história eleitoral do partido, que desde a primeira ida a votos, em 1994, nunca esteve abaixo dos 60%. Sucessivos escândalos de corrupção, a elevada taxa de desemprego e a persistência das desigualdades raciais no acesso a terras e habitação 25 anos após o fim do apartheid são algumas das principais razões para a erosão do eleitorado.

Cyril Ramaphosa, Presidente sul-africano de 66 anos que ascendeu ao poder no ano passado, pediu o apoio dos eleitores para acabar com a corrupção e implementar medidas para impulsionar a economia do país, e acabou por ser efectivamente (e apesar dos resultados) legitimado como chefe de Estado, um ano após ter sucedido a Jacob Zuma, forçado a demitir-se por suspeitas de corrupção.

No entanto, o ANC de Ramaphosa fica aquém das percentagens outrora conseguidas em 2004 (69%), quando era liderado pelo então Presidente sul-africano Thabo Mbeki, ou em 2014 (62%), com Zuma.​

“Vamos trabalhar juntos, negros e brancos, homens e mulheres, jovens e idosos para construirmos uma África do Sul que pertença verdadeiramente a todos os que cá vivem”, disse Ramaphosa, citado pela Reuters, no discurso de vitória.

Um “desempenho razoável” e uma luta interna

Se para alguns analistas, citados pelo diário britânico Guardian, este foi um “desempenho razoável” que poderá ajudar Ramaphosa a implementar reformas no país, há quem também acredite que, apesar de ter garantido a maioria dos lugares na Assembleia Nacional, o Presidente terá dificuldades em enfrentar as facções do próprio partido que se opõem à sua liderança e agenda reformista.

O desafio mais duro do partido poderá estar, na verdade, apenas a começar, com o ANC a enfrentar uma divisão no seio do próprio partido e o desprestígio junto da população. Uma crise que está intimamente relacionada com a governação do anterior Presidente, Jacob Zuma, marcada por anos de corrupção e declínio económico.

Quanto à oposição, a Aliança Democrática, partido liderado por Mmusi Maimane, conseguiu por sua vez 20,77% dos votos, quase dois pontos percentuais menos que em 2014. Já o partido de extrema-esquerda Combatentes pela Liberdade Económica (fundado há seis anos pelo antigo líder das juventudes do ANC Julius Malema) somou 10,79% das contagens – um crescimento de quatro pontos percentuais face às anteriores eleições.

Ainda assim, o ANC controla oito das nove províncias do país, com a Aliança Democrática a controlar apenas uma, a do Cabo Ocidental, desde as eleições de 2009.

“Estão a dar uma hipótese ao ANC”, sublinhou, citado pelo Guardian, o analista político Lumkile Mondi, acrescentando que “esta é uma oportunidade para eles [partido] se reencarnarem”.

A perda de votos do ANC foi também acompanhada de uma diminuição geral da participação eleitoral. Dos cerca de 26,8 milhões de pessoas registadas, 65,99% compareceram às urnas na passada quarta-feira, a pior taxa de participação em eleições parlamentares desde o fim do ‘apartheid’.

Em pano de fundo, e talvez a explicar a subida da abstenção, o fraco desempenho da economia. Em 2018, segundo o Guardian, a África do Sul cresceu apenas 0,8%. A elevada taxa de desemprego (27%), especialmente entre os jovens, é também um dos principais motivos de descontentamento, a par da falta de serviços públicos e dos elevados índices de criminalidade no país, bem como a disparidade racial na posse de terras: segundo a Reuters, os sul-africanos brancos (9% dos 56 milhões de habitantes do país) ainda detêm mais de 70% das terras agrícolas.

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