E Marcelo finalmente falou... mas sobre digitalização

Ao fim de cinco dias, Marcelo falou. Mas fora do país e sem tocar no tema político quente: a ameaça de crise política. Em Nápoles, no encontro Cotec Europa, o Presidente rejeitou a existência de uma “administração pública a várias velocidades”

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Marcelo em Nápoles com o Presidente italiano, o Rei de Espanha e o seu pai EPA/Francisco Gomez

E ao fim de cinco dias – um recorde absoluto no seu mandato presidencial – Marcelo Rebelo de Sousa falou. Mas não sobre a ameaça de crise política do primeiro-ministro. Em Nápoles, Itália, na sessão de encerramento do XIII Encontro Cotec Europa, o Presidente da República rejeitou a existência de uma “administração pública a várias velocidades”, defendendo a aposta digital no Estado, ao mesmo tempo que pediu o fim das desigualdades tecnológicas para os cidadãos.

“Não pode haver uma administração pública a várias velocidades, umas avançadas e outras mais atrasadas. A digitalização não pode ser uma revolução perdida para a reforma da administração pública”, vincou o chefe de Estado.

No XIII Encontro Cotec Europa, que juntou em Nápoles associações nacionais para a inovação e desenvolvimento dos países mediterrânicos (Itália, Espanha e Portugal), Marcelo Rebelo de Sousa assinalou que o sector público, em Portugal, “avançou nos últimos anos na digitalização, mas avançou por vezes com assimetrias”.

“Conhecemos avanços muito significativos”, realçou o responsável, aludindo a medidas como o Simplex ou ao acolhimento da cimeira mundial de tecnologia Web Summit. Porém, “temos de ir mais longe”, salientou Marcelo Rebelo de Sousa.

“Não basta digitalizar para simplificar, não basta digitalizar para tornar mais próximo. Temos de aproveitar a digitalização para reformar as administrações públicas, para mudar a mentalidade, a consciência cívica, a substância e a aproximação às pessoas”, acrescentou.

De acordo com o chefe de Estado, a tecnologia acarreta como principal desafio a inclusão social, já que a inovação deve “servir pessoas”. “A digitalização está a criar novas desigualdades na educação, na questão da idade – entre as pessoas mais novas e mais velhas –​ , a nível regional e entre os incluídos e os infoexcluídos”, enumerou. Por isso, frisou: “Há que combater essas desigualdades.”

Outro desafio apontado por Marcelo Rebelo de Sousa diz respeito ao futuro do emprego público, tendo em conta a “automação e a inteligência artificial”. “Temos de preparar as nossas sociedades para esse desafio que está a chegar, mais cinco ou 10 anos”, adiantou.

120 horas sem fazer declarações

Cinco dias completos, um recorde absoluto. Desde que está na Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa ainda não tinha conseguido passar mais de três dias sem agenda pública, nem mesmo quando foi operado a uma hérnia umbilical, a 28 de Dezembro, e esteve três dias sem fazer declarações aos jornalistas.

Esta terça-feira quebrou o silêncio, mas não o voto de reserva sobre a ameaça de crise política. Recorrendo o lema de não falar de política nacional no estrangeiro, conseguiu resistir à insistência dos jornalistas que o acompanharam a Nápoles.

Marcelo Rebelo de Sousa chegou de Macau ao início da tarde de quinta-feira e desde então manteve-se recatado, sem qualquer agenda pública ou semipública fora do Palácio de Belém. Na sexta-feira à tarde, reuniu-se com o primeiro-ministro depois da reunião de emergência do núcleo duro do Governo e antes da comunicação de António Costa ao país em que preanunciou o pedido de demissão.

A reunião estava marcada antecipadamente para aquele dia e hora, em alternativa à habitual reunião semanal de quinta-feira, precisamente por causa do regresso da China. E demorou apenas meia hora, muito menos do que é habitual e até do que seria expectável caso Presidente e primeiro-ministro estivessem a falar pela primeira vez sobre a crise política que António Costa estava disposto a abrir.

Desde então, o Presidente limitou-se a receber embaixadores, o filósofo francês Bernard-Henri Lévy e a analisar diplomas legislativos, aprovando oito do Governo e vetando um da Assembleia da República (manutenção de farmácias de dispensa de medicamentos ao público nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo PS).

Ao que o PÚBLICO apurou, o silêncio do Presidente sobre a situação política nacional deverá manter-se pelo menos até sexta-feira, dia em que o Parlamento deverá “chumbar” a proposta de reposição integral do tempo de serviço dos professores, aprovada na especialidade por uma coligação negativa contra a vontade do partido do governo. Até lá, não deverá ter agenda pública em território nacional.

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