Seremos capazes de mudar de vida?

Exceptuando o negacionismo de líderes irresponsáveis como Donald Trump, as alterações climáticas e a sobre-exploração de recursos obrigam-nos a olhar de frente para a tragédia que pode já acontecer na geração dos nossos filhos.

Não foi o primeiro e, eventualmente, não foi o mais drástico aviso sobre a corrida acelerada da humanidade para o abismo, mas o relatório ontem revelado pela ONU é particularmente chocante porque nos dá conta da ameaça de extinção que paira sobre um milhão de espécies. E é ainda mais chocante porque as exigências que a ciência põe em cima da mesa para travar a autodestruição deixou de se sustentar em medidas paliativas ou de acções pontuais: só uma rápida e transformação do sistema económico e financeiro pode salvar o planeta.

A tese não é nova, mas, ao deixar de ser usada apenas pelos que há alguns anos se designavam por ambientalistas radicais e passar para o cardápio de soluções defendidas pelos cientistas tornou-se foco de uma discussão tão difícil como causadora de ansiedade. Será a humanidade capaz de enfrentar os “interesses instalados”, na definição de Robert Watson, o cientista que preside à plataforma que produziu o relatório? Ou, por outras palavras, será de alguma forma possível mudar os fundamentos do capitalismo que, se promoveu um extraordinário desenvolvimento económico e social, obrigou também à sobre-exploração dos recursos naturais?

Os optimistas históricos considerarão que estas perguntas são impertinentes porque, um dia, em breve, a inteligência e a criatividade humanas encontrarão uma resposta para a ameaça ambiental. Os cépticos tenderão a sublinhar que a acumulação capitalista e o espírito de concorrência são insubstituíveis para garantir a liberdade. E os críticos continuarão a sublinhar que, entre um modelo que implica o recuo no uso de recursos e um modelo alternativo que exige o empobrecimento para salvar o planeta, não há margem para escolhas.

Entre as naturais divergências sobre os desafios que nos esperam, há apenas uma certeza absoluta: os sinais de que o planeta está a morrer depressa obrigam já esta geração a incluir o debate da sustentabilidade nas suas opções políticas. Os jovens já o perceberam e exigem-no. Em sociedades avançadas como a da Holanda ou Dinamarca a política verde está na ordem do dia. Nos Estados Unidos fala-se na urgência de um “New Deal” verde.

Exceptuando o negacionismo de líderes irresponsáveis como Donald Trump, as alterações climáticas e a sobre-exploração de recursos obrigam-nos a olhar de frente para a tragédia que pode já acontecer na geração dos nossos filhos. Algo vai ter de mudar, muito e depressa. Manter tudo como está não é cegueira: é suicídio. Saber se a humanidade é capaz de inventar um modelo que conjugue o ambiente e a liberdade das sociedades capitalistas tornou-se a maior questão do nosso tempo.

Sugerir correcção
Ler 36 comentários