Tomar decisões sem dar conhecimento ao outro é alienação parental

Para o bem-estar dos filhos, nomeadamente para a estabilidade e coerência das decisões relativas aquelas dimensões básicas da sua vida, é necessário que exista a partilha das responsabilidades entre pais e mães, para que ambos exerçam as suas responsabilidades como educadores.

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Steven Van Loy/Unsplash

A lei portuguesa prevê que o exercício das “(...) responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível” (Diário da Republica, Decreto-Lei n.º 47344, Artigo 1906.º).

As “questões de particular importância para a vida do filho” são as que dizem respeito à saúde; à educação, nomeadamente à escolha do estabelecimento de ensino, a quaisquer atividades extracurriculares, à orientação e educação religiosa; às deslocações e estadias ao estrangeiro; e à mudança geográfica da residência; entre outros.

Para o bem-estar dos filhos, nomeadamente para a estabilidade e coerência das decisões relativas aquelas dimensões básicas da sua vida, é necessário que exista a partilha das responsabilidades entre pais e mães, para que ambos exerçam as suas responsabilidades como educadores.

Quando um dos pais toma decisões importantes sobre a vida dos filhos sem prévia consulta do outro (ex.: não dá ou tenta obstar a que sejam dadas informações sobre o percurso escolar e académico dos filhos, omite o agendamento de consultas médicas, ou a escolha de atividades extracurriculares; ou impede que o outro participe nestas atividades, ou mesmo, que apenas às mesmas possa assistir), não a salvaguardar o exercício pleno e responsável da parentalidade.

Na minha experiência de consulta em psicologia, tenho acompanhado inúmeras situações em que a mãe ou pai alienados não obtêm uma informação partilhada sobre as decisões subjacentes às responsabilidades parentais dos seus filhos, por parte do outro pai ou mãe, alienadores. Algumas vezes, esta circunstância parece ser aceite pelas diferentes organizações sociais, mesmo que contrariando a lei, o que cria verdadeiras situações de desespero e de reforço do sentimento de incapacidade de acompanhamento do desenvolvimento dos filhos por parte dos pais alienados (ver caixa).

Caso verídico de um pai

“A minha filha foi a várias consultas médicas das quais nunca tive conhecimento dado pela mãe. Além daquelas com o Dr. A., que fui sabendo quando o interpelava com qualquer pergunta sobre a sua saúde, há outras no centro de saúde que eu nunca tive conhecimento. Solicitei por escrito à médica de família. Mais tarde, o centro de saúde recusou-se a prestar qualquer esclarecimento sobre as diversas consultas a que a minha filha foi – tive que recorrer ao Tribunal Administrativo.”

Nesta transcrição pode verificar-se que o pai relata uma situação de desconhecimento das decisões de responsabilidade parental de saúde não partilhada pela mãe. Como neste caso, a omissão de informação ao pai ou mãe alienado por parte dos serviços de saúde e educacionais, é um fator de agravamento.

Caso verídico de uma mãe

“Dra. não sei em que escola o meu filho anda, que posso fazer?, estou desesperada.”

Nesta transcrição, a mãe transparece uma situação de angústia e desespero que reforça o seu sentimento de incapacidade no acompanhamento da escolaridade do filho.

Com efeito, ambos os pais têm, por lei, direito a participar nas decisões mais relevantes da vida dos filhos e se um dos pais não o fizer e tomar decisões unilaterais está a excluir o outro da vida dos filhos e a promover a anulação de uma parte das suas referências parentais, o que favorece o desenvolvimento de uma insegurança emocional nos filhos, atual e futura. Os filhos precisam de ter oportunidade de construir uma imagem própria sobre cada um dos pais, a partir dos seus próprios referenciais e não a partir da interpretação que lhe chega, muitas vezes enviesada, por parte do pai ou mãe alienante.

A Convenção sobre os Direitos da Criança consagrou o princípio de que ambos os pais têm uma responsabilidade comum na educação e no desenvolvimento da criança e de que constitui sua responsabilidade prioritária a educação e o bem-estar global da criança (artigos 18.º, n.º 1 e 27.º, n.º 2). No mesmo sentido, a Convenção Europeia sobre os Exercício dos Direitos da Criança, celebrada no âmbito do Conselho da Europa em 25/1/1996, utiliza a expressão “responsabilidades parentais” a propósito da titularidade e do exercício dos poderes-deveres que integram as funções parentais (artigos 1.º, 2.º, 4.º e 6.º).

É essencial que, além da compreensão das orientações de organizações internacionais determinantes na salvaguarda do bem-estar das crianças, todos os pais e mães cumpram a lei, evitando situações de alienação parental e dando aos seus filhos o melhor do seu carinho e cuidado para que cresçam cidadãos saudáveis e felizes.

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