O que aconteceu na Venezuela no dia 30 de Abril?

Fontes do Wall Street Journal dizem que a entrada precipitada em cena de Leopoldo López fez ruir um acordo com figuras chave do regime para afastar Maduro e criar um novo governo. Outra tese diz que o general Padrino enganou os opositores.

Guaidó e López na terça-feira em Caracas
Fotogaleria
Guaidó e López na terça-feira em Caracas MIGUEL GUTIERREZ/EPA
Padrino com Maduro
Fotogaleria
Padrino com Maduro EPA

A oposição venezuelana pode ter estado perto de tirar Nicolás Maduro do poder e dar início a uma transição política, mas a entrada de Leopoldo López na equação, na terça-feira, pode ter levado os elementos do regime chavista envolvidos na negociação a recuar, disseram fontes ligadas ao processo ao jornal Wall Street Journal.

Este jornal cita “mais de uma dúzia” de intervenientes nas conversações que explicaram que nos dois últimos meses importantes figuras da oposição, entre elas Juan Guaidó, se reuniram na Colômbia, no Panamá e na República Dominicana com “figuras bem posicionadas” do Governo do Presidente Nicolás Maduro, entre elas altas patentes militares.

Foi acertado um acordo: a mudança não seria feita através de um golpe, mas através de uma decisão judicial, o que legitimaria que o aparelho militar se afastasse de Maduro.

Logo na terça-feira, o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, John Bolton, confirmou que havia três altos responsáveis do chavismo envolvidos em conversações para a transição, depois de terem acordado com a oposição que Maduro tinha “que sair” ­– o ministro da Defesa Vladimir Padrino, o presidente do Supremo Tribunal Maikel Moreno e o comandante da guarda de honra do Presidente e chefe dos serviços de contra-espionagem da Força Armada Bolivariana, Iván Hernández Dala.

Na madrugada desse dia, 30 de Abril, Juan Guaidó e um grupo de militares, entre eles o director dos serviços secretos militares (Sebin), Cristopher Figuera, libertaram Leopoldo López, um dos principais opositores do chavismo condenado a quase 14 anos de prisão em 2014 e que estava em regime de prisão domiciliária. López surgiu nas ruas ao lado de Guaidó, que lidera desde Janeiro uma insurreição civil para derrubar Maduro, a mobilizar a população e a anunciarem “chegou a altura”.

Foi posta a circular uma carta de Figueras a justificar este passo: “Quero deixar claro que sempre reconheci o Presidente Nicolás Maduro Moros como tal e como comandante-em-chefe. Porém, não é segredo para ninguém o estado de deterioração em que está imersa a pátria e seria irresponsável da minha parte culpar apenas o império americano”.

Ao fim do dia, os três altos responsáveis chavistas tinham desligado os telefones, como disse Elliot Abrams, um antigo diplomata que o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, nomeou enviado especial para a Venezuela. Figueras desapareceu de cena, terá saído do país. E Leopoldo López, em risco de voltar a ser preso e levado de novo para a prisão militar de Ramo Verde, onde as organizações de defesa dos direitos humanos dizem que os opositores são torturados, refugiou-se na embaixada do Chile primeiro, e depois na de Espanha.

Não se sabe exactamente o que correu mal – uma teoria citada pelo Financial Times diz que a elite chavista tomou conhecimento das conversações e infiltrou Padrino no grupo de negociadores para, no momento certo, torpedear o que classificou de “golpe”.

Ao Wall Steet Journal as mais de 12 fontes disseram que a participação precoce de López no processo não fazia parte do acordo e levou o outro lado a perder a confiança nos interlocutores.

“Leopoldo disparou demasiado cedo e perdemos uma oportunidade de ouro para convencer os militares venezuelanos a afastar Maduro”, disse ao jornal um membro da oposição que está em Washington em contacto com os que organizam o processo na Venezuela.

“O que estava previsto era que Padrino dissesse ‘aqui está uma decisão judicial, temos que obedecer. As forças armadas comprometem-se a seguir esta abordagem institucional’”, disse uma pessoa ligada à negociação.

Segundo o plano que o WSJ cita, o Supremo Tribunal reconhecia a Assembleia Nacional, a que Guaidó preside e onde a oposição tem maioria (e que foi declarada em incumprimento também pelo Supremo e substituída por uma Assembleia Constituinte de maioria chavista), a Força Armada Bolivariana deixaria de apoiar Maduro e Padrino e outros negociadores chavistas integrariam um novo governo.

Há, porém, outras versões do que aconteceu a 30 de Janeiro, com membros da oposição a defenderem que Guaidó e López só avançaram com um guião diferente depois de os interlocutores no chavismo terem começado a mostrar hesitações e recuos – ou porque Padrino estava a fazer jogo duplo, ou porque outra figura chave do regime, Diosdado Cabello (chavista radical assumido e cujo historial o punha de fora de uma solução partilhada de poder), recusou capitular.

Ou ainda por sabotagem da Rússia e de Cuba, como disse Pompeo, que como diz a revista Atlantic estava convencido de que os EUA tinham finalmente posiocionadas as peças que levariam ao derrube de Maduro. Foi divulgado que Maduro estivera num avião com destino a Cuba mas que a intervenção de Moscovo o fez mudar de ideias.   

“Foi ingenuidade deles confiar naqueles operacionais comprometidos com as mafias de Maduro e Diosdado”, disse outro opositor.

O dia 30 de Abril terminou com violentos confrontos nas ruas – uma pessoa morreu, cem ficaram feridas e 119 foram presas, segundo o Observatório de Conflitos Sociais venezuelano. As manifestações de 1 de Maio da oposição não foram, como Guaidó antevira, de celebração do fim de Maduro. E no dia seguinte Maduro convocou as forças armadas, a quem disse – com o general Padrino ao lado - que “chegou a hora de combater, de dar um exemplo à História e ao mundo e dizer que na Venezuela há uma força armada consequente, leal, unida como nunca e derrotando intentonas golpistas”.

Sugerir correcção
Ler 12 comentários