PAN relança discussão para se poder votar aos 16 anos

Partido representado por André Silva no Parlamento vai levar o assunto a debate a 14 de Maio.

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André Silva entende que o projecto para baixar idade de voto para 16 anos tem condições para ser aprovado Daniel Rocha

O tema não é novo, já foi defendido outras vezes, mas nunca chegou à lei. Há muito, por exemplo, que o Bloco de Esquerda insiste na ideia, a JSD também já agitou a bandeira, até o então líder da JS, António José Seguro, a abordou em 1991. Agora, o Pessoas-Animais-Natureza (PAN), pela mão do deputado André Silva, pega novamente no assunto e apresenta um projecto de resolução no qual defende o direito ao voto aos 16 anos, o que implica uma revisão constitucional extraordinária. O partido quer abrir, de novo, “um amplo debate” sobre a matéria.

Ao PÚBLICO, André Silva não esconde ter “algumas expectativas” de que o projecto “possa ser aprovado”: “Todos os partidos dizem estar preocupados com a juventude, com a abstenção e com a melhoria e consolidação do sistema democrático. Penso que tem condições para ser aprovado. Pode ser decidido até ao fim desta legislatura, ainda há tempo, ou então abrir-se o debate e continuar-se depois das eleições de Outubro. Veremos o que dizem os outros partidos.”

No documento a que o PÚBLICO teve acesso, são vários os motivos invocados pelo PAN para que tal mudança aconteça. Então, se aos 16 anos um jovem português já pode trabalhar, pagar impostos e descontar; já pode receber um salário e administrar o que daí advier; já pode casar, mesmo que, em princípio, com autorização parental; já pode perfilhar; ser responsabilizado criminalmente; já pode pedir a mudança da menção de sexo no registo civil e alterar o nome; já pode interromper a gravidez, sem precisar de autorização parental; se já teve de fazer escolhas na escola sobre o futuro, então, por que razão não pode votar?

Em tudo isto, o PAN vê uma “manifesta incoerência”: “O Estado reconhece às pessoas no âmbito destes assuntos sensíveis a maturidade e a capacidade de tomarem decisões quanto à conformação das suas vidas, porém, não podem escolher as políticas que decidem o que nos afecta no quotidiano”, defende o partido representado por André Silva, no Parlamento, e que vai levar o assunto a debate a 14 de Maio.

O PAN considera que, aos 16 anos, os jovens estão preparados para tomarem decisões sobre “os destinos da sociedade”. O documento socorre-se da opinião de diferentes especialistas, que foi sendo conhecida ao longo dos anos. Em 2013, por exemplo, o pediatra Mário Cordeiro escrevia um artigo no PÚBLICO no qual, entre outras propostas, colocava a hipótese de se “baixar a idade de voto para, por exemplo, os 15 anos, idade em que quase todos os adolescentes serão já capazes de tomar decisões informadas sobre o seu futuro”.

O projecto do PAN refere também opiniões de politólogos como Marina Costa Lobo, Pedro Magalhães ou António Costa Pinto que não excluem o cenário de se baixar a idade de voto ou a necessidade de um debate em torno da ideia. “São várias as personalidades que defendem o alargamento da capacidade eleitoral activa aos 16, representando um claro incentivo de aproximação dos jovens à vida política, combatendo desta forma as elevadas taxas de abstenção e consolidando os alicerces dos processos democráticos”, defende o PAN.

Mas o tema não é consensual, há muito que divide opiniões. Quando, em 2010, Duarte Marques foi eleito líder da JSD, tendo aquela alteração como uma das bandeiras, o investigador Manuel Villaverde Cabral, autor de um estudo sobre a matéria, dizia ao PÚBLICO que tal antecipação só iria aumentar a abstenção. No livro Jovens Portugueses de Hoje até defendia que, mesmo aos 21 ou 22 anos, os jovens ainda demonstravam “pouco interesse pela política em geral e pelas eleições em particular”.

"Beneficiaria” todos 

André Silva não partilha desta visão: “Votar e participar é uma questão de hábito. Quanto mais cedo, mais cedo são estimulados a reflectir. Isso fará com que as taxas de participação aumentem”, diz ao PÚBLICO. O PAN entende que fomentaria a participação cívica, incutindo nos jovens “um maior sentido de comprometimento relativamente às escolhas que fazem”, contribuiria para “o interesse e a participação no processo eleitoral e democrático” e envolveria os mais novos nos “processos decisórios”.

Na proposta do PAN, o deputado André Silva dá, entre outros, dois exemplos que considera emblemáticos da maturidade e interesse político dos jovens: Malala Yousafzai, a mais jovem pessoa a quem foi atribuído o Nobel da Paz, com 17 anos, pela luta que travou “pelo direito de todos à educação"; e Greta Thunberg que, com 15 anos, “foi notícia em todo o mundo por fazer greve às aulas” em nome da causa ambiental. “Esta cidadã sueca, agora com 16 anos, recentemente liderou uma manifestação pelo clima com a presença de milhares jovens”, lê-se no documento, no qual o parlamentar sublinha que, “também em Portugal, esta iniciativa foi acolhida em várias cidades”.

A manifestação pelo clima ocorrida no presente ano demonstra o quanto os jovens portugueses estão politizados e preparados para serem incluídos no processo democrático”, defende o deputado no projecto, sublinhando que “os jovens estão cansados de serem ignorados e de não serem ouvidos”.

Ao PÚBLICO, acrescenta: “Aquilo que sentimos é que são pessoas muito mais velhas que tomam decisões pelos jovens. No ensino, no ambiente, no mercado de trabalho, sem que eles possam tomar parte. Havia uma vantagem enorme, iria fazer com que os partidos e responsáveis políticos tivessem estratégias de aproximação aos jovens.”

O que o deputado vê é que há diversos temas, como os do ambiente, que interessam aos jovens: “São aqueles que demonstram mais preocupações e se têm manifestado na rua. Nestas questões que têm a ver com o sistema ensino, o mercado de trabalho e a herança de um planeta, eventualmente, esgotado e falido que irão receber, é absolutamente incoerente que não possam participar.”

O documento proposto pelo PAN chama ainda a atenção para alguns países como, por exemplo, Áustria ou Malta que já baixaram a idade de voto para os 16. Ou a Grécia que o estipulou a partir dos 17. Entre outros exemplos de países e de sugestões de instituições europeias, o partido recorda ainda que, em 2015, também o Parlamento Europeu aprovou uma recomendação, no âmbito da reforma da lei eleitoral da União Europeia, defendendo os 16 anos como a idade mínima para votar nas eleições europeias.

O projecto da autoria do PAN refere também dados dos últimos Censos, em 2011, que pretendem mostrar que a “inclusão dos jovens de 16 e 17 anos” no processo eleitoral poderia resultar num aumento “de cerca de 223 mil eleitores”. Os dados pesquisados pelo PÚBLICO mostram, porém, um número um pouco inferior: em 2017, e de acordo com as estimativas anuais da população residente, do Instituto Nacional de Estatística, que têm por base os nascimentos, óbitos, emigração e imigração, havia 214.507 jovens com 14 e 15 anos – que agora teriam 16 e 17 anos.

André Silva não sabe se o PAN seria um dos partidos a beneficiar com esta alteração. Nem é isso que o move: “Beneficiaria todos os partidos. Beneficiaria a consolidação e desenvolvimento da democracia. Acreditamos que vai acontecer, pode não ser já, mas vai acontecer.”

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