Sê jovem e cala-te

No início desta semana, enquanto discursava na festa de aniversário do PS, António Costa foi interrompido por vários indivíduos que se manifestaram contra a construção de um novo aeroporto no Montijo, lançaram aviões de papel na sala e exibiram um cartaz a dizer “Mais aviões? Só a brincar”. Um deles até tentou retirar o microfone ao primeiro-ministro para falar à plateia. A notícia deste acontecimento, em todos os jornais, tomou a categoria etária — que é hoje muito mais do que isso — para nomear os manifestantes. Ficámos assim a saber que se tratava de “jovens”, ou então de “jovens activistas”, e que um deles, retirado do palco pelos seguranças, era “um jovem de barbas” (uma descrição que poderia levar o leitor a pensar que era um indivíduo com o aspecto de um mujahidin, mas dessa hipótese eram as imagens que a televisão mostraram um categórico desmentido). Porquê a insistência na condição jovem destes cidadãos, como se isso assinalasse uma identidade e uma prática política? Ainda que de modo implícito e provavelmente nem sequer racionalizado, estas notícias, tal como foram redigidas, apontam para uma identificação das questões ecológicas e ambientais com a geração dos jovens. Nesse aspecto, mais do que uma diferença, há uma fractura geracional. E essa fractura é sugerida no comunicado deixado pelos “activistas” (uma nomeação que, como sabemos, serve para dizer que falta às suas acções a legitimidade de fundo que se reconhece nas acções políticas convencionais): “Lamentamos estragar a vossa festa, mas o rio Tejo, aqui ao lado, a nossa cidade e as futuras gerações nada têm para celebrar”. Os termos deste comunicado sintetizam bem um discurso político de tipo geracional que começou a emergir: enquanto os mais velhos, a geração instalada desde os anos 1980 (parte dela socializada politicamente ainda nos anos 1960/70), fazem a festa, os jovens a quem até lhes foi retirada a possibilidade de viver a ideia de “geração” pagam as contas da festança e levam com os detritos. Os jovens começam a ter uma consciência da finitude do mundo a que foi poupada a geração festiva dos Fat Pigs, como já são nomeados pelos jovens desclassificados que não podem nem sonhar que alguma vez beneficiarão de condições semelhantes.

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