Costa diz que Teodoro Obiang tem de respeitar valores democráticos da CPLP

Para continuar na CPLP, Guiné Equatorial tem de respeitar valores democráticos, disse primeiro-ministro, António Costa, na conferência de imprensa que fechou a V Cimeira Luso-Cabo-Verdiana, em Lisboa.

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Andres Esono Ondo

O primeiro-ministro de Cabo Verde, Ulisses Correia e Silva, vai falar com o ditador Teodoro Obiang Nguema, há 40 anos Presidente da Guiné Equatorial, sobre a prisão arbitrária do líder da oposição Andrés Esono Ondo, detido há três dias no Chade sem acusação.

Obiang Nguema vai visitar a cidade da Praia esta segunda-feira a convite de Cabo Verde, que tem a presidência rotativa da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). A Guiné Equatorial entrou na CPLP em 2014, comprometendo-se a eliminar a pena de morte, o que ainda não aconteceu.

Questionado sobre se vai falar sobre Andrés Esono Ondo com o ditador guinéu-equatoriano, o primeiro-ministro de Cabo Verde disse que sim e acrescentou: “Pertencer à CPLP é partilhar valores que são fundamentais, não só para Cabo Verde, mas que são a aspiração da comunidade: a democracia e a liberdade, um Estado de Direito democrático e a cidadania livre. Não há nenhum problema em falar dessas questões. Vão ser faladas, já foram faladas e vão continuar a ser faladas, para que os países que pertencem à CPLP se conformem a esses valores”, disse Ulisses Correia e Silva na conferência de imprensa que fechou a 5.ª Cimeira Luso-Cabo-verdiana, que terminou este sábado, em Lisboa.

Ao seu lado, António Costa reforçou a mensagem: “Com toda a franqueza, temos de insistir junto da Guiné Equatorial que, se quer permanecer na CPLP, tem de se rever neste quadro comum, porque, felizmente, hoje este é o quadro dos países de língua oficial portuguesa.”

Antes, o primeiro-ministro português definiu o “quadro comum” da CPLP: “Há 45 anos, nenhum dos países de língua portuguesa vivia em liberdade. Vivíamos em ditadura e sob o jugo do regime colonial. O Brasil vivia também sob o jugo da ditadura. O que permitiu termos hoje a CPLP foi o gesto de libertação, iniciado com o 25 de Abril, que abriu as portas à descolonização e à independência e a hoje sermos uma comunidade que assenta nos valores da liberdade, democracia, respeito pelos direitos humanos e dignidade da pessoa humana, absolutamente incompatível com a existência da pena de morte em qualquer dos países membros da CPLP.”

O ponto nove da longa declaração conjunta (40 pontos) da 5.ª cimeira bilateral, define a CPLP como “um espaço democrático, respeitador do Estado de Direito e sem pena de morte”.

Andrés Esono Ondo, antigo professor universitário de Sociologia e actual secretário-geral da Convergência para a Democracia Social, foi preso esta quinta-feira em Mongo, onde ia participar no congresso da União Nacional para a Democracia e a Renovação (UNDR), e levado para Djamena, capital do Chade, sem acusação formal. Bonaventure Mbaya, antigo ministro do Congo-Brazzaville e hoje presidente da Convergência dos Cidadãos, na oposição, e responsável da Internacional Socialista e da Aliança Progressista na África Central, estava com ele no momento da detenção e disse ao PÚBLICO que a polícia “se dirigiu a Andrés Esono sem apresentar qualquer razão ou acusação”. “Tememos que seja um sequestro ou prisão arbitrária em conivência com o Governo da Guiné Equatorial”, disse Mbaya, cujo telefone também foi apreendido até sábado. “Andrés Esono entrou no Chade legalmente, com um visto emitido pela embaixada do Chade em Malabo. Não compreendemos a razão da detenção.”

A professora Ana Lúcia Sá, professora no ISCTE, especialista em regimes autoritários africanos e atenta observadora da Guiné Equatorial, disse ao PÚBLICO que após o golpe militar que esta semana depôs Omar al-Bashir, Presidente do Sudão durante 30 anos, esperava repressão. “É uma constante na Guiné Equatorial: quando um líder é deposto, por eleições ou por golpe, aumenta a repressão. E há alturas de bloqueio da internet, o que não aconteceu desta vez.”

Em Março, Andrés Esono Ondo denunciou publicamente a prisão de Joaquín Eló Ayeto, um informático de 39 anos militante do seu partido e activista dos direitos humanos, preso e torturado numa prisão de Malabo e sobre quem não há notícias há mais de um mês. Mais do que isso, Esono Ondo acusou um braço direito do Presidente Teodoro Obiang de ter sido o homem quem torturou o seu colega. “Joaquín está incomunicável desde 1 de Março, quando foi transferido para a prisão ‘Black Beach’. Sabemos que foi Braulio Bacale Ondo quem o torturou”, disse na altura Andrés Esono Ondo ao PÚBLICO. Bacale Ondo é o director-geral adjunto da segurança presidencial do Presidente Obiang Nguema.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros enviou entretanto uma nota às redacções dando conta de que recebeu a notícia sobre a detenção de Andrés Esono Ondo “com apreensão” e demonstrando “preocupação” com episódios recentes “indiciadores de limitação das liberdades políticas envolvendo figuras da oposição equato-guineense”.

“O Governo português apela a um esclarecimento cabal da presente situação e reitera a importância de serem observados a legalidade e o princípio do Estado de Direito”, lê-se no comunicado.​

A cimeira bilateral de Lisboa terminou com a assinatura de dez instrumentos diplomáticos que fazem parte do pacote de 120 milhões de euros do Programa Estratégico de Cooperação para Cabo Verde para os anos 2017-21.

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