Presidente da Câmara de Torres Vedras acusado de plágio na tese de doutoramento

Carlos Bernardes, presidente da Câmara de Torres Vedras desde 2015, usou “textos publicados ou divulgados em data anterior e de outros autores” e, “substituindo algumas palavras por sinónimos, defendeu-a como se fosse sua”, acusa o Ministério Público.

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O presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, Carlos Bernardes (PS), foi constituído arguido e deverá ser julgado por ter plagiado partes da sua tese de doutoramento. A decisão foi publicada nesta sexta-feira no site da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa que, no entanto, não revela o nome do arguido.

Carlos Bernardes foi constituído arguido num processo de contrafacção, definido, no Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, como um crime cometido por quem utilizar “obra, prestação de artista, fonograma, videograma ou emissão de radiodifusão que seja mera reprodução total ou parcial de obra ou prestação alheia, divulgada ou não divulgada”.

Entre 1 de Setembro de 2014 (com o início da nova organização judiciária) e 31 de Dezembro de 2018, “o Ministério Público deduziu 201 acusações” pelo crime de contrafacção, indica a Procuradoria-Geral da República em resposta ao PÚBLICO. Estas acusações não se limitam ao plágio académico: abarcam também outras situações de plágio.

No caso do autarca, ficou “suficientemente indiciado que o arguido, em Setembro de 2015, com vista à obtenção do Grau Académico de Doutor, apresentou, numa Universidade em Lisboa, uma tese de Doutoramento, tendo realizado publicamente a defesa perante o respectivo Júri, onde ficou aprovado”, lê-se na nota da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa.

No entanto, a justiça encontrou indícios de que a tese foi criada com base em “textos publicados ou divulgados em data anterior e de outros autores”, tendo o autarca introduzido apenas “ligeiras modificações” no que foi escrito por outros: alterações para o novo acordo ortográfico, introdução de sinónimos, “substituições de verbos, alteração da ordem das palavras e supressões de partes dos textos originais”. Tudo isto foi defendido perante o júri do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT) da Universidade de Lisboa como “como se fossem próprios [do arguido] e da sua exclusiva lavra”.

Contactado pelo PÚBLICO, o advogado de Carlos Bernardes informou que o autarca e a sua equipa legal reagiram apenas à decisão administrativa da reitoria da universidade: “Há um processo a decorrer em tribunal administrativo que visa anular a decisão da universidade.”

“Nada deste processo deve implicar o mandato autárquico”, acrescenta o advogado, que equaciona pedir a abertura de instrução do processo, fase de pré-julgamento no fim da qual é decidido se o caso é ou não julgado. O mesmo advogado, Fernando Pratas, suspeita que foram adversários políticos do presidente da câmara a desencadear o processo.

Também contactado pelo PÚBLICO, Carlos Bernardes remete todas as respostas para o seu advogado e não tece mais comentários.

Desde 2017 que esta tese de doutoramento está a ser investigada pelo Ministério Público. O alerta foi lançado num artigo de opinião publicado no jornal local Badaladas, a 20 de Janeiro desse ano, assinado pelo antigo vereador Jorge Ralha (também socialista).

Na altura, em declarações ao PÚBLICO, Carlos Bernardes admitiu falhas na citação de alguns autores mas negou que se tratasse de plágio. “O trabalho académico desenvolvido por mim resultou num conjunto de investigações sobre a temática em estudo e foi corrigido ao longo da sua realização”, afirmou, em 2017.

Pouco depois de ter sido anunciada a abertura da investigação, a directora do IGOT, Lucinda Fonseca, confirmou à agência Lusa que foram detectados “erros grosseiros na forma de citação de algumas fontes”. “Apesar de considerarmos que os trechos da dissertação identificados, que aparentemente reproduzem textos não citados ou indevidamente citados, não representam parte materialmente significativa na tese, nem fundamental, somos do parecer de que há indícios que podem justificar a abertura de inquérito”, esclareceu a directora do IGOT.

Carlos Bernardes é, desde 2015, doutor em Turismo, depois de defender a tese intitulada As linhas de Torres Vedras: um destino turístico estratégico para Portugal. Desde 2003 que assume funções na Câmara Municipal de Torres Vedras: primeiro como vereador, e depois como vice-presidente, entre 2005 e 2015. Desde Dezembro de 2015 que é presidente da câmara de Torres Vedras.

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